-Imagem (1.1224682)Com os rins quase totalmente parados, um jovem de 22 anos quer provar no Judiciário que tem a capacidade de decidir por si próprio para recusar o tratamento de hemodiálise. “Como tenho doença renal crônica, quero morrer”, diz José Humberto Pires de Campos Filho, morador de Trindade, região metropolitana de Goiânia. Na última semana, ele recebeu alta de um hospital na capital, para onde foi levado após uma decisão judicial liminar atender ao clamor da família e ordenar a interdição dele de forma parcial e provisória.Fã de jogos online e considerado muito inteligente, Campos Filho vive com a mãe, a microempresária Edina Maria Alves Borges. Filho caçula, ele foi diagnosticado com a doença em julho de 2015, nos Estados Unidos, onde morou com o pai por cinco anos, e, logo depois, também rompeu o namoro. Tinha uma vida bastante ativa fora do País e chegou a ser campeão regional de um campeonato de natação norte-americano.Em maio do ano passado, Campos Filho voltou para o Brasil, já bastante pálido e com excesso de líquido no organismo, não filtrado pelos rins. Três meses depois, submeteu-se à hemodiálise. Mas só aceitou o tratamento por cinco meses e, depois, rompeu o ciclo das sessões semanais na máquina que limpa e filtra o sangue em uma clínica. Ele tem postura diferente dos 108 mil pacientes com doença renal crônica que se submetiam à diálise no País, em 2015, segundo o mais recente Censo da Sociedade Brasileira de Nefrologia.Desesperada, a família do jovem recorreu à Justiça para interditá-lo e obrigá-lo a se submeter ao tratamento, mesmo contra a vontade dele. Alegou risco iminente de morte. “Meu filho não tem maturidade para decidir sobre isso ainda”, diz Edina. Inicialmente, o juiz Éder Jorge, da 2ª Vara Cível da comarca de Trindade, negou o pedido, mas determinou a realização de um laudo psicológico. Com o documento em mãos, ordenou a interdição parcial e provisória do rapaz.Pelo menos por enquanto, a nova decisão, proferida no último dia 2, aumentou a expectativa e diminuiu a aflição da família. Permitiu que a mãe o levasse ao hospital, “sem qualquer tipo de coerção física”. Ele concordou. Com a doença avançando cada vez mais, ficou dois dias na unidade de terapia intensiva (UTI) e, depois, foi para a enfermaria. Saiu do hospital na quinta-feira passada, até o organismo se normalizar. No período de internação, fez quatro sessões de hemodiálise. “Não vou mais”, afirma.Em casa, Campos Filho fica a maior parte do tempo fechado dentro do quarto. O jovem, que queria passar a vida viajando pelo mundo, diz que não tem mais expectativas. Não aposta nem em transplante. Vive em um profundo ceticismo e, também, recusa acompanhamento psicológico ou psiquiátrico.Advogada da mãe, Dorvacir Fernandes reconhece a complexidade do caso. “Entramos com a ação como uma forma de a mãe acalmar o coração, sabendo que fez o possível. Como o juiz vai obrigar o jovem a fazer o que não quer se ele está consciente?”, acentua ela, que pediu a realização de audiência urgente para o juiz ouvir o jovem nesta semana e proferir a sentença. O magistrado diz que, em 19 anos de carreira, nunca julgou caso semelhante. “É um conflito entre a vontade, a autodeterminação da pessoa humana e a vida. Nunca tive de decidir um conflito assim”, assevera Éder Jorge.-Imagem (Image_1.1224308)