O possível retorno do procurador de Justiça Demóstenes Torres às atividades no Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), de onde ele está afastado recebendo salário desde outubro de 2012, tem gerado mal-estar entre seus pares – promotores e procuradores – tanto entre os que são ligados à atual gestão quanto os contrários. O pedido de retorno do ex-senador foi protocolado no MP na última segunda-feira, endereçado ao procurador-geral de Justiça, Benedito Torres Neto, irmão de Demóstenes. No documento, ele alega que, embora ainda não tenha sido publicado o acórdão, “é cediço que a Corte Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás arquivou as ações” criminais contra ele e fez perder a eficácia da medida cautelar que determinou seu afastamento das funções. A previsão da defesa é de que a situação seja resolvida até a próxima semana.O mais provável, conforme o próprio Demóstenes admitiu em entrevista exclusiva ao POPULAR no mesmo dia em que pediu o retorno ao cargo de procurador de Justiça, é que ele nem chegue a assumir as funções na 27ª Procuradoria de Justiça, porque ele tem direito a férias – “em torno de 15 a 20 férias para gozar”, conforme informou na entrevista –, mas seu iminente retorno é o assunto mais comentado internamente. “O clima é muito ruim, essa situação toda abala a imagem da instituição. O melhor é mesmo que ele se aposente”, disse um promotor de Justiça. A aposentadoria, no entanto, só ocorrerá, como o próprio Demóstenes adiantou, quando terminarem os processos administrativos contra ele, inclusive no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), o que a defesa acredita que também ocorrerá em breve.Outro promotor de Justiça disse ao POPULAR que a situação “não deixa de ser incômoda”. “A anulação (dos processos criminais) tem efeito judicial, criminal, mas não apaga o fato, não significa que ele não tenha acontecido”, afirmou. “Isso fica mais delicado porque ocorre dentro do órgão cuja missão é defender a lei e combater a corrupção e o crime organizado. É uma situação muito ruim”. Outro servidor do órgão observou que os desdobramentos do caso resultaram em uma situação constrangedora para todos. “Não haverá clima para ele trabalhar aqui, causaria um constrangimento enorme”, afirmou, lembrando que quando ocorreu o escândalo contra o então senador Demóstenes Torres, acusado de favorecer o empresário Carlos Augusto Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, Benedito Torres era o procurador-geral de Justiça. “Ele teve sua vida toda investigada e não se comprovou nada contra ele. Agora, quando ele se elegeu novamente, volta essa situação”, lamentou.ObrigaçãoAdvogado de Demóstenes, Pedro Paulo de Medeiros justifica que Demóstenes “não apenas tem o direito como a obrigação de reassumir o cargo”. Ele explica que não há nenhum impedimento para que o cliente volte às funções. “Esse retorno é automático, uma vez que as ações que havia contra ele foram arquivadas pela Corte Especial do Tribunal de Justiça”, argumenta. O motivo foi que as provas reunidas contra o procurador – interceptações telefônicas entre Demóstenes e Cachoeira – foram consideras nulas porque, como senador, ele tinha foro privilegiado e só poderiam ter sido autorizadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Foi o STF quem decidiu pela nulidade das provas. Depois, a Corte Especial seguiu a mesma direção, inclusive acompanhando parecer do MP estadual, pelo arquivamento. Medeiros adianta que já acionou o CNMP para o arquivamento do processo disciplinar contra Demóstenes. “Isso deverá acontecer em breve”, assegura.Procurado, o Ministério Público do Estado de Goiás informou que quem vai avaliar o pedido e tratar do caso é o decano (procurador mais antigo) da instituição, Pedro Tavares. Isso porque no dia de sua posse, 10 de março, durante entrevista coletiva à imprensa, o procurador-geral Benedito Torres se declarou impedido em qualquer assunto relacionado a Demóstenes devido ao parentesco. Assim, o caso nem chegou até ele, sendo distribuído ao decano. Tavares, no entanto, vai aguardar a publicação do acórdão pelo Tribunal de Justiça.Longe do MP desde 1999Demóstenes Torres está afastado de suas funções por decisão administrativa e depois judicial desde outubro de 2012. Seu afastamento de fato, no entanto, aconteceu antes, em 1999, quando se licenciou para ser secretário de Segurança Pública, depois de ter sido procurador-geral de Justiça, o cargo máximo do MP estadual. Eleito senador em 2002 e reeleito em 2010, ele foi cassado pelo Senado Federal no dia 11 de julho de 2012 por quebra de decoro parlamentar por seu envolvimento com Cachoeira, revelado em gravações telefônicas feitas com autorização judicial durante a Operação Monte Carlo, da Polícia Federal e do MPF, que acabou com a prisão e condenação de Cachoeira e vários outras pessoas, entre elas, agentes públicos. Ele reassumiu o cargo no MP no dia 12 de julho de 2012, um dia depois da sessão do Senado Federal, e causou revolta e mal-estar.Na época, um grupo de 82 promotores de Justiça do MP-GO, procuradores do Trabalho (MPT) e procuradores da República (MPF) assinou conjuntamente uma reclamação ao CNMP, juntamente com um pedido de investigação, alegando que o órgão federal teria condições de fazer uma investigação isenta. Posteriormente, o CNMP avocou (tomou para si) o processo administrativo disciplinar contra Demóstenes, confirmou a vitaliciedade do cargo (só se perde com a morte) e prorrogou os prazos de afastamento.