O retorno do videomonitoramento do trânsito de Goiânia tem reativado discussões e dúvidas em motoristas da capital, que questionam o que podem ou não fazer enquanto dirigem seus veículos sem cometer alguma infração, e ser autuado por isso. A cidade já possui treze pontos de monitoramento por câmeras de 360º, mas apenas duas estão devidamente sinalizadas para poder autuar as infrações, ambas na região do Parque Vaca Brava. Na primeira semana de funcionamento, no começo deste mês, os dois equipamentos já foram responsáveis por verificar 673 infrações de uso ao celular, 223 por estacionamento nas calçadas e 578 por estacionar em local proibido.
🔔 Siga o canal de O POPULAR no WhatsApp
A diferença entre a quantidade de câmeras instaladas e as aptas por autuar já ocorre devido às regras do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), em resolução de 2022, que estabeleceu que apenas os equipamentos devidamente instalados com a sinalização indicando o videomonitoramento e o próprio documento de regulamentação é que podem autuar os motoristas infratores. Além disso, as infrações devem ser verificadas por um agente de trânsito e com as imagens em tempo real. Ou seja, não podem ser observadas gravações anteriores.
Segundo o documento, que passou a ser válido em 1º de abril de 2022, "a autoridade ou o agente da autoridade de trânsito, exercendo a fiscalização remota por meio de sistemas de videomonitoramento, poderão autuar condutores e veículos, cujas infrações por descumprimento das normas gerais de circulação e conduta tenham sido detectadas 'online' por esses sistemas". O parágrafo único do segundo artigo da resolução estabelece que o agente de trânsito, responsável pela lavratura do auto de infração, deverá informar no campo "observação" a forma com que foi constatado o cometimento da infração, ou seja, que se deu a partir de câmera e visualização em tempo real. O artigo terceiro determina que a fiscalização de trânsito "mediante sistema de videomonitoramento somente poderá ser realizada nas vias que estejam devidamente sinalizadas para esse fim".
Outra dúvida recorrente, embora já exauridas as discussões judiciais acerca do tema, é sobre a legalidade do uso dos equipamentos para a análise de infrações cometidas dentro dos automóveis e se isso não configuraria uma invasão de privacidade. Ainda em 2022, uma decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) confirmou a legalidade, que se estendeu aos demais tribunais brasileiros. O advogado civilista e integrante do Mova-se Fórum de Mobilidade, Tomaz Lobo, reforça que se trata de uma discussão mantida há anos, mas que o entendimento é que, em via pública, o direito da coletividade se sobressai ao direito individual.
"Se disser que está na intimidade, é o mesmo que permitir o uso do celular. O entendimento de que há legalidade é majoritário", afirma Lobo ao estabelecer que o agente de trânsito ao verificar o uso do celular por motoristas em condução de veículos estando na rua também observa infrações dentro dos veículos e não há questionamentos sobre estas autuações. Segundo a Secretaria de Engenharia de Trânsito de Goiânia (SET), atualmente, 12 câmeras de modelo PTZ (com giro de 360° e zoom de longo alcance) são usadas no monitoramento do trânsito da capital.
A pasta explica que os equipamentos ajudam a monitorar locais que acontecem acidentes, pontos com mais congestionamentos, semáforos intermitentes e pontos que necessitem de intervenção dos agentes. "Duas câmeras localizadas nas imediações do Parque Vaca Brava, estão aptas a realizar autuações pois estão sinalizadas, as demais estão sendo usadas apenas para monitoramento e aguardando a sinalização avisando a população da fiscalização por videomonitoramento", informa. A exigência pela sinalização é a mesma que ocorre com radares e lombadas eletrônicas.
Essa é a segunda vez em que Goiânia inicia um projeto de videomonitoramento de trânsito. A primeira foi iniciada em 2017, na gestão Iris Rezende, no entorno do Parque Vaca Brava, em que a sinalização existente da época é utilizada atualmente para este novo projeto. Havia, em 2017, a intenção de monitorar 110 cruzamentos da capital e, após a instalação dos equipamentos na região do Parque Vaca Brava, as câmeras seriam colocadas nas vias do entorno do Aeroporto Santa Genoveva e depois haveria a expansão pela cidade, como no Corredor Universitário, Rua 44 e Setor Campinas. Segundo a então Secretaria Municipal de Trânsito (SMT), na época, os aparelhos chegaram a ser instalados, mas havia um problema de ligação com a central de controle do Paço Municipal e, logo, o videomonitoramento não foi efetivado no Setor Santa Genoveva e nem em outros espaços de Goiânia.
O POPULAR mostrou que o videomonitoramento no Parque Vaca Brava foi descontinuado já em 2020, com as câmeras desligadas por falta de manutenção, o que teria permanecido até 2022, quando a estão gestão de Rogério Cruz prometeu a ligação do serviço de fiscalização no local. Apesar da promessa, no entanto, o serviço não chegou a ser retomado, mas a sinalização sobre a existência de câmeras no espaço continuou instalada. Na época, eram 10 aparelhos no entorno do parque. Agora, com a volta do serviço, são duas câmeras instaladas.
Secretaria tranquiliza profissionais
Uma das dúvidas mais recorrentes quanto à infração verificada por câmeras é sobre o uso do celular, sobretudo com o advento de tecnologias utilizadas pelo aparelho em aplicativos de mensagens, vídeos, fotos e mesmo para o trabalho, como no caso dos motoristas de caronas pagas e entregadores. Isso porque, de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), o manuseio do celular durante a condução de veículos é configurada como infração, seja em ligações, mensagens, fotos, vídeos ou simples toques. Porém, em razão do uso contínuo, a Secretaria de Engenharia de Trânsito (SET) de Goiânia tranquiliza sobre como vai interpretar o uso do aparelho.
A pasta reforça que o uso do celular ao volante, independentemente da profissão, configura infração conforme o CTB. "No entanto, entendemos a realidade dos motoristas de aplicativo e, por isso, a SET tranquiliza que o simples toque para o aceite de corrida não vai ser suficiente para que haja entendimento de uso de celular ao volante. O manuseio, em que há a digitação, tirar fotos, ver vídeos e etc. isso sim configura infração de trânsito. A orientação então é: coloque o celular em um suporte, programe sua viagem antes de sair com o carro e se for necessário conversar no bate papo virtual com o passageiro, aí sim, estacione o carro em local permitido e faça isso com segurança", informa a secretaria.
Essas ações devem ser tomadas até mesmo com o carro na espera em semáforos, rotatórias, pares ou congestionamentos. Ou seja, não é permitido digitar qualquer mensagem, enviar áudios, tirar fotos ou fazer vídeos, ligações e outras ações. Porém, o simples toque para recusar ou aceitar uma viagem durante a condução dos veículos serão relevadas pelos agentes que operam as câmeras de videomonitoramento e também aqueles que estão nas ruas da capital. Em um vídeo encaminhado em grupos de profissionais motoristas e entregadores, o secretário da SET, Tarcísio Abreu, esclareceu que a utilização na mão dos condutores continuará sendo autuada, mas que o aceite ou recusa das viagens, desde que os aparelhos estejam em um suporte, e não nas mãos, não será considerada infração.
O advogado civilista e membro do Mova-Se Fórum de Mobilidade, Tomaz Lobo, reforça que as autuações podem ser feitas até mesmo por manuseio do celular e ainda que durante as paradas em semáforos ou em sinalização de pare. "O motorista tem que encostar o carro, estacionar mesmo para mexer no celular, por exemplo. O agente de trânsito é um servidor público, logo, ele tem fé pública de que está fazendo a autuação dentro dos parâmetros da lei", entende. Sobre a posição da SET, ele entende que há limite para essa interpretação, já que a lei configura como multa o manuseio do aparelho e, logo, poderia ser uma prevaricação do agente público, ou seja quando é visto algo considerado ilegal e não ocorre a punição.
Ele explica que o agente de trânsito que monitora as imagens da câmera tem o mesmo serviço se estivesse na rua observando os veículos, ou seja, pode autuar sob as mesmas condições e as mesmas infrações, como o uso do celular, o não uso do cinto de segurança ou mesmo o transporte irregular de crianças, animais ou cargas. "Há um pouco de hipocrisia na lei também, porque o cara não poderia clicar em um celular, mas poderia mexer na mídia que os carros mais novos possuem hoje, ou no aparelho de som. O motorista tem que encostar e parar o veículo para não correr o risco de ser multado", diz o advogado.
O tema é controverso e cabe interpretação, já que o CTB determina como infração o fato de dirigir com apenas uma mão no volante ou mesmo "utilizando-se de fones nos ouvidos conectados a aparelhagem sonora ou de telefone celular", em seu artigo 252. O documento, em seu parágrafo único, explica que dirigir com apenas uma das mãos estando a outra segurando ou manuseando um aparelho celular configura como uma infração gravíssima. Logo, cabe a interpretação do que é entendido como "manusear" o aparelho, estando ele em um suporte, por exemplo. No começo do mês, o secretário Tarcísio Abreu chegou a dizer, em entrevista à TV Anhanguera, que "qualquer movimento feito com o aparelho é considerado infração. Se o motorista perde 5 segundos olhando o celular a 80 km/h, ele percorre 100 metros sem prestar atenção no trânsito. Isso representa um grande risco".
A declaração, depois, foi esclarecida pela secretaria de que um clique para aceitar ou recusar uma corrida não seria considerado infração. a Até o final de abril, Goiânia contará com mais duas novas câmeras em funcionamento e 56 radares na área sul. Já na área norte a ideia é entregar 32 câmeras PTZ até final de abril. Até o final de julho, haverão 100 câmeras distribuídas estrategicamente, segundo a SET, que explica que a fiscalização via videomonitoramento é feita por agentes de trânsito que monitoram o tráfego em tempo real de forma remota no Centro de Controle Operacional (CCO) de Trânsito da SET, inaugurado no dia 30 de março.
