A defesa de uma polícia mais letal não só pode contribuir para casos como o dessa semana, como ela referenda, incentiva e instiga uma polícia violenta. Temos a mania de tratar casos de violência policial sob o ponto de vista de quem eram os soldados que mataram e quem era a pessoa que morreu. Quando o que tem que estar em questão é justamente esta prática como recorrente das polícias brasileiras e como uma prática não só tolerada, mas incentivada pela sociedade.Não adianta a gente pincelar casos a casos, por exemplo, nomear o Roberto como estudante e não como traficante, o que o coloca em um critério de pessoa defensável, que foi o mesmo fenômeno que aconteceu com o Amarildo no Rio de Janeiro, que a imprensa passou a colocar o “pedreiro Amarildo”.Quando se tenta psicologizar ou individualizar a morte de pessoas pela polícia brasileira não se está tocando em uma questão de fundo, que é muito mais complexa. Que decorre da forma como a Polícia Militar é treinada, concebida pela constituição, como uma força auxiliar do exército e como ela é organizada. Ela é organizada de uma forma hierárquica, o seu treinamento é fundado na metáfora da guerra, eles são treinados para a guerra, sendo que a função para a Polícia Militar é lidar com a sociedade. Eu te pergunto, essa guerra é contra quem? Uma guerra sem propósitos, uma guerra de brasileiros contra brasileiros. Quem será o vencedor dessa guerra?A sociedade por seu turno criou uma dicotomia, como se houvesse uma linha intransponível entre as pessoas do bem e as pessoas do mal. Quando na realidade não é isso que acontece. Se você pega uma vala e coloca traficantes e viciados, essas pessoas são desumanizadas e são passíveis de morrer.Só que elas se esquecem que o apoio declarado e incentivado a uma polícia violenta afeta a qualidade de vida de todas as pessoas. Daquelas que estão envolvidas com a criminalidade, assim como das que não estão. Acredito que esse posicionamento acontece em virtude de uma descrença no nosso sistema jurídico punitivo, tendo em vista que temos baixa elucidação de crimes violentos contra a vida. Parece que as pessoas ao perderem a crença no devido processo legal, apostam em uma polícia violenta, que a partir de critérios absolutamente questionáveis vai decidir quem vai morrer e quem vai viver.Esse fenômeno é tão gritante, que toda vez que alguém é morto pela polícia, a família não pode sentir a dor do seu morto, ela tem que justificar que ele não tinha passagem pela polícia. É como se duas sentenças, envolvimento por tráfico de drogas e passagem pela polícia, já por si só decretassem que uma pessoa não merece viver.