A depender das discussões sobre as alterações no projeto de atualização do Plano Diretor de Goiânia, encaminhado pela Prefeitura em julho de 2019, a capital terá prédios maiores e mais unidades habitacionais em bairros concentrados nos próximos 10 anos. A ideia contida no estudo técnico da consultoria ITCO, contratada pela Câmara Municipal, e que deverá ser colocada no relatório da subcomissão de Ordenamento Territorial da Comissão Mista, defende as mudanças sob o argumento de ter uma cidade mais adensada ao longo de eixos e locais estruturados, o que, em tese, tornaria Goiânia mais compacta.No entanto, outros especialistas alertam que essas modificações ao projeto da Prefeitura, tendo como base apenas a questão da mobilidade e do sistema viário, pode ser prejudicial à cidade, por não levar em conta e nem ter realizado estudos técnicos para outras necessidades da população. “Não é só o sistema viário, tem que avaliar se vai ter água, energia, esgoto e mesmo equipamentos públicos para todos, como escolas, unidades de saúde e outros”, diz a conselheira do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás (CAU-GO), Regina Faria de Brito.A urbanista reforça que desde o projeto da Prefeitura já se critica a falta de um Plano de Densificação, ou seja, um estudo que verificaria a capacidade de determinada região quanto a unidades habitacionais e moradores. A proposta do Paço traz uma mudança, em relação ao Plano Diretor atual, quanto ao adensamento, ao colocar a fração ideal no cálculo o que, segundo os técnicos, trará à administração um controle de quantas residências e qual a tipologia delas será possível em cada região. Nessa proposta, o aproveitamento do terreno é de acordo com a quantidade e tipo de unidades habitacionais.O que foi discutido pela subcomissão e teve a concordância dos vereadores presentes modifica essa forma de cálculo, trazendo o conceito de coeficiente de aproveitamento. Neste caso, o quanto pode construir em um terreno leva em conta, basicamente, o seu tamanho e um índice a ser multiplicada para cada área. Ou seja, em um espaço mais adensável esse coeficiente é maior, enquanto será menor em uma área que se busca a desaceleração. Os cálculos apontam que a mudança representa o dobro do número de unidades habitacionais em uma área de desaceleração e até 2,5 vezes mais nas áreas adensáveis.Regina explica que o problema é o aumento do número de moradias para uma área que pode não estar apta a atender todos os moradores. Relator da subcomissão de Ordenamento Territorial, Andrey Azeredo (MDB) afirma que a proposta é atender o conceito de cidade compacta. Para ele, a mudança vai permitir que o mercado construa moradias menores em áreas com infraestrutura estabelecida, pois nestes bairros há a tendência de construir unidades maiores, enquanto que a demanda goianiense é por apartamentos menores, já que as pesquisas apontam famílias com 3 ou 4 membros.“Isso vai reduzir a especulação imobiliária e teremos unidades com valores mais comerciais e um maior aproveitamento do terreno. Onde permitir o adensamento, vai permitir construir apartamentos menores nos lugares melhores. Mas vamos ter as manchas de onde não pode”, garante Azeredo. Segundo o vereador, a proposta do Paço apenas mantém a situação atual, em que os bairros com mais infraestrutura são mais caros porque só é viável a construção de unidades maiores, o que induz o espraiamento, ou seja, loteamentos e condomínios em bairros afastados, com aumento da mancha urbana.Em tese, com mais moradias em um mesmo local a tendência é de aproveitar melhor a infraestrutura já estabelecida, mas, como explica Regina, há um limite dentro das condições de cada bairro. Também neste sentido, há proposta na Câmara discutindo o aumento da verticalização na maior parte da cidade, no chamado adensamento básico, com foco também na capacidade viária. Neste caso, há uma ampliação do conceito de eixos estruturantes para todas as vias de transporte coletivo, o que amplia a proposta da Prefeitura, que contêm apenas a similaridade entre os eixos exclusivos e os preferenciais, em que ambos teriam regras de maior adensamento.No Plano atual, as áreas de adensamento básico, com setores mais residenciais, o que inclui cerca de 70% da capital, um prédio pode ter no máximo 9 metros de altura. A atualização da lei prevê a elevação disso para 11 metros, o que, em ambos os casos, representa 3 andares. Os vereadores estudam ampliar esse número para praticamente o dobro, permitindo até 21 metros, o que significa prédios de 7 andares. A justificativa, explica Andrey, é um melhor aproveitamento do terreno e a manutenção de maior área verde e da circulação do ar, já que os prédios não ficarão juntos, além de também ampliar o adensamento nestas determinadas áreas.Proposta cria área híbrida entre zonas rural e urbanaA discussão técnica entre vereadores e a consultoria ITCO, na subcomissão que trata do eixo Econômico, avaliou a criação de uma área híbrida entre as zonas rural e urbana de Goiânia para a atualização do Plano Diretor. Nos encontros, o território foi chamado de “rururbano” e o conceito é de que seria permitido em determinados locais a construção de condomínios de chácaras, por exemplo, e mesmo a exploração de atividades econômicas de menor potencial agressivo ao meio ambiente.Entre os locais apontados estavam áreas nas regiões Norte e Noroeste da cidade, em que seria possível a instalação de empresas de ecoturismo ou mesmo de pequenas atividades agrícolas, até nas proximidades da barragem do Ribeirão João Leite. Na reunião que se discutiu o assunto, representante da Saneago se colocou contra a proposta, reforçando que é necessária a manutenção da mata original para a garantia do manancial da região.Para a conselheira do CAU-GO, Regina Faria de Brito, proposta semelhante também foi colocada na discussão do Plano Diretor de Terezópolis de Goiás, cidade onde fica o reservatório de água do João Leite, e a entidade foi contrária a essa medida. “Continuamos com a mesma opinião. Essa é uma forma de expansão urbana e um termo que não existe em lei”, diz. A conselheira reforça que a proposta, assim como em relação ao que foi discutido sobre a verticalização e adensamento da cidade, só chegou ao conhecimento do CAU por terceiros, já que a entidade não foi chamada a participar da maioria das reuniões na Câmara, apesar de ter pedido.O estudo feito pelo ITCO também não chegou ao conhecimento do CAU. A reportagem do POPULAR também tentou acesso ao estudo técnico e não lhe foi enviado. As propostas citadas, portanto, foram colhidas de informações sobre os relatos das reuniões das subcomissões da Comissão Mista e junto a parlamentares. Entre elas está também a retirada do grau de incomodidade das vias como item de avaliação do zoneamento econômico, sem que se tenha um novo critério para tal.Nesse caso, se houver modificação nesse sentido, seria possível que qualquer empreendimento fosse instalado em qualquer local, independente da capacidade viária. Tecnicamente, a Prefeitura passaria a não ter elementos para impedir a instalação de um shopping em uma rua sem saída, por exemplo.Vereadores aguardam calendário para apresentar seus relatóriosOs relatórios das subcomissões formadas na Comissão Mista da Câmara Municipal para a discussão do Plano Diretor podem ser finalizados em até 15 dias, a depender do calendário da Casa, pois ainda não se definiu os prazos para os mesmos e não se sabe se haverá recesso parlamentar neste ano. Os documentos terão as propostas de emendas ao projeto da Prefeitura, com as modificações no estudo do Paço Municipal, a partir das discussões técnicas que ocorreram com o apoio do ITCO. A comissão de Mobilidade, por exemplo, não conseguiu quórum para eleger presidente e relator e os componentes que participaram das reuniões (apenas os vereadores Álvaro da Universo e Paulo Magalhães) vão apresentar as emendas desejadas diretamente ao relator da Comissão, Cabo Senna. As demais deverão fazer um relatório com um resumo das discussões técnicas e as mudanças desejadas.Senna deve compilar, com apoio técnico do ITCO, essas emendas e fazer um novo relatório, que será votado na Comissão Mista e, se aprovado, o projeto vai ao plenário da Casa pela segunda e última vez. Lucas Kitão, presidente da Comissão, aguarda uma reunião entre os vereadores para decidir sobre o calendário. A secretária de Planejamento e Habitação, Zilma Peixoto, afirma que os parlamentares foram solícitos durante todo esse tempo de discussão e espera que as emendas a serem apresentadas não modifiquem a essência do Plano Diretor. “A gente sempre está aberto para a discussão e não dizemos que nossa proposta é melhor ou pior, só que se for mudar toda a essência, precisa ter estudos técnicos que baseiem a nova proposta”, afirma.-Imagem (1.2076564)