O arquivamento do inquérito que apura a morte do mecânico Marcus Phelipe de Souza Almeida, de 27 anos, após fugir junto de uma blitz da Balada Responsável no Jardim Itaipu, em Goiânia, deve ser revisto pela Procuradoria-Geral da Justiça (PGJ) – órgão máximo do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) – diante de recurso apresentado pela família. A possibilidade de que o processo seja desarquivado reacende a esperança dos familiares e amigos por um julgamento, que alegam excesso por parte dos policiais militares envolvidos na abordagem, ocorrida em outubro de 2023. Quase dois anos depois, o órgão ministerial decidiu arquivar o processo, sob alegação de indícios insuficientes para apontar que houve crime. Marcus Phelipe foi morto com tiros na cabeça e no ombro efetuados por um policial militar no início da madrugada do dia 21 de outubro de 2023, após ele e o amigo que conduzia o carro, o tapeceiro Gustavo Alves Maciel, de 21 anos, evadirem de uma blitz realizada na Avenida Vieira Santos, no Jardim Itaipu. Eles seguiam pela GO-040 com destino à casa de um terceiro quando, ao entrarem na avenida e verem a ação policial, resolveram dar ré a fim de fugir da fiscalização. Em seguida, uma perseguição foi iniciada por cerca de 8,5 quilômetros até a casa de Gustavo, no Residencial Solar Bougainville. Quando o condutor parou o veículo, a vítima já estava morta. À época, a alegação dos militares envolvidos era de que Marcus Phelipe havia atirado contra as viaturas que faziam a perseguição e, por isso, os policiais teriam revidado. Familiares e amigos prontamente contestaram a versão oficial. Após atrasos em meio ao andamento da investigação pela Delegacia de Investigação de Homicídios (DIH), o inquérito foi concluído em julho, apontando que a vítima provavelmente não estaria armada, afastando a tese de legítima defesa apontada. Dentre os cinco agentes envolvidos na ação, somente o terceiro sargento Fellipe Mecenas de Oliveira Lima, de 35 anos, foi indiciado. Ele foi responsável pelos tiros que atingiram e mataram a vítima.O andamento da investigação, contudo, foi marcado por uma série de falhas apontadas no relatório assinado pelo delegado Marcus Vinícius Cardoso do Nascimento. Não houve perícia no local de parada do carro, pois a vítima foi levada ao hospital sob a alegação de que o jovem foi socorrido ainda com vida – versão também afastada pelo laudo cadavérico, que demonstrou morte instantânea após o tiro na cabeça. Além disso, o laudo de vistoria veicular teria demorado ao menos 30 dias para ser realizado, comprometendo a preservação de vestígios. Nem mesmo a reprodução simulada conseguiu responder dar certeza a questões como o momento em que ele foi baleado, ou a trajetória das balas.Ao decidir pelo arquivamento do inquérito em setembro, a promotora Elissa Tatiana Pryjmak, da 29ª Promotoria de Justiça da comarca de Goiânia, apontou em seu parecer contradições nos depoimentos prestados por Gustavo. Logo após o crime, o amigo havia alegado que o mecânico havia disparado na direção dos policiais. Depois, afirmou não ter sido possível ver se ele havia atirado ou não. O parecer citou ainda divergências nos depoimentos dos militares, e ela também se atentou à ausência de perícia no local.Para a promotora, não havia dúvidas sobre a autoria dos tiros, já que o próprio terceiro sargento admitiu ter efetuado os disparos. Contudo, ponderou que “as divergências probatórias impedem a formação de convicção ministerial acerca das circunstâncias específicas que motivaram o uso da força letal pelos agentes policiais”. “Neste contexto, é impossível estabelecer, com segurança, se houve efetiva troca de tiros entre os ocupantes do veículo e os policiais militares, elemento fundamental para a avaliação da legitimidade da atuação policial.”Logo após, a família de Marcus Phelipe ingressou com recurso para que a decisão fosse revista. A promotora manteve a decisão de arquivamento e, no dia 24 de outubro, fez um despacho repassando a possibilidade de revisão à PGJ. No documento, ela cita que a família sustenta “que não foram produzidas provas imprescindíveis – tais como reprodução simulada e demais exames complementares – o que torna impossível concluir, neste momento, pela ocorrência de legítima defesa apresentada pelos policiais militares”. “Aduz que as lesões resultantes da ação policial foram desproporcionais a uma mera reação a uma tentativa de evasão, o que afasta a aplicação da sobredita causa justificante.”A revisão sobre o arquivamento ainda não foi concluída na PGJ. Ao POPULAR, a mãe de Marcus Phelipe, Janaína Fabiana de Souza Almeida, pontua que a decisão pelo arquivamento do processo foi um baque à família “pois a promotora alegou que não havia provas suficientes”. “Para mim e para minha família, nunca houve dúvida quanto à inocência do meu filho. Sabemos que existem provas e que elas são mais do que suficientes para demonstrar que ele era inocente. Estamos confiantes e esperançosos de que o processo seja desarquivado, para que ele possa ser devidamente julgado e para que os verdadeiros responsáveis sejam condenados. Meu filho foi uma vítima e, embora nada o traga de volta, o desarquivamento e o julgamento nos trarão algum conforto e alívio. Ainda acreditamos na Justiça e queremos que a imagem do Marcus, meu filho, seja limpa”, comenta.