Quase dois anos após ter sido apresentado ao governador Ronaldo Caiado (DEM), o Centro de Estudos, Monitoramento e Previsões Ambientais (Cempa Cerrado) começa a tomar forma. Ancorado na Universidade Federal de Goiás (UFG) e com uma equipe formada por pesquisadores de nível internacional baseados em várias instituições acadêmicas, o Cempa Cerrado marcou para dezembro deste ano a exposição do que produziu desde a sua criação, mesmo em meio a adversidades enfrentadas pela falta de recursos e pela pandemia da Covid-19.“O Cempa Cerrado é uma realidade, mas estamos longe da situação ideal. Para sua plena estruturação, para que funcione bem, precisamos de R$ 12 milhões. Entretanto, não tenho dúvida do seu potencial”, afirma o pró-reitor de Pós-Graduação da UFG, Laerte Guimarães Ferreira. O maior volume de recursos até agora veio de uma emenda parlamentar de autoria do deputado federal Elias Vaz (PSB) no valor de R$ 500 mil, empregados na compra de um cluster computacional de alto processamento. Com esta estrutura instalada, foram desencadeadas várias ações, uma demonstração, ainda pequena, do que o Cempa Cerrado pode produzir e contribuir para o desenvolvimento da economia sustentável de Goiás.Já está pronta uma base de dados meteorológicos que abrange um período de dez anos - 2010 a 2020 - com resolução de 25 km. “Ela contém as melhores informações disponíveis no mundo sobre a meteorologia de Goiás. Este banco de dados tem várias funções e uma delas é como nós, cientistas, podemos entender como a climatologia do estado evoluiu”, explica o físico de atmosfera, Saulo Freitas, um dos idealizadores do Cempa Cerrado e coordenador da equipe. Ele explica que esta base ficará disponível no site do Cempa, em construção, numa linguagem acessível, a qualquer interessado.O modelo, configurado e executado com sucesso, também possibilitou a criação de uma grade computacional de previsão climática inédita de até dez dias envolvendo todo o estado de Goiás e parte de estados fronteiriços. São informações detalhadas a cada 5 km. “Ela é mais projetada para atender o agronegócio. É uma resolução mais fina do que existe por aí. O que temos é o estado da arte”, detalha Saulo Freitas.VentoEm dezembro, o Cempa Cerrado irá apresentar ainda um estudo preliminar da viabilidade de geração de energia eólica no estado de Goiás. Um módulo acoplado ao modelo adotado pelos pesquisadores possibilita a simulação de vento, a sua direção e a sua velocidade. “É uma prospecção para identificar locais que oferecem potencial para instalação de um parque eólico”, segundo Saulo Freitas.Outro avanço para a estruturação do Cempa Cerrado foi a assinatura, em maio deste ano, do Protocolo de Intenções entre a UFG e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), de onde vêm muitos dos pesquisadores. “Nosso objetivo é chegar a um dia em que tenhamos uma equipe do Inpe em Goiânia. Estamos tentando demonstrar que o Instituto está em todas as regiões, mas não no Centro-Oeste. A única coisa que existe é uma antena deles em Cuiabá para receber imagens de satélite. Tenho certeza que a pesquisa realizada no âmbito do Cempa vai beneficiar o próprio Inpe”, acredita Laerte Guimarães. O pró-reitor lembra que o modelo de previsões meteorológicas com alta resolução espacial e algoritmos utilizados poderão ser replicados para outras capitais.GoiâniaAinda neste mês de novembro o Cempa Cerrado será apresentado ao prefeito de Goiânia, Rogério Cruz (Republicanos). A capital, que nos últimos anos aumentou o nível de impermeabilização e enfrenta alagamentos em vários pontos, assim como os efeitos de estiagens prolongadas, poderá se beneficiar das informações prestadas pelo centro de estudos climáticos. “No caso de previsão de qualidade do ar, o Cempa poderá fazer alertas de níveis de poluição urbana e de queimadas”, explica Saulo de Freitas. Ele reforça que idosos e crianças sofrem muito durante episódios assim, mas a população não tem o hábito de verificar as condições do ar para evitar atividades ao ar livre. Fapeg pretende investir R$ 5 milhões na iniciativaPró-reitor de Pós-Graduação da UFG, Laerte Guimarães destaca que o Cempa deve ser visto como uma iniciativa de Goiás, não da UFG. “Estamos liderando esta discussão, mas ele é objeto de um conjunto de atores, no qual estão incluídos também o governo estadual, por meio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) e da Universidade Estadual de Goiás (UEG), o Inpe, e o Instituto Federal Goiano (IF Goiano). O Cempa precisa ser pensado como uma estratégia para a economia de Goiás.”Presidente da Fapeg, Robson Domingos Vieira concorda. O projeto de financiamento do Cempa Cerrado apresentado à agência de fomento foi aprovado por seu conselho superior e a previsão é de que até o fim deste ano seja oficializado um convênio com duração de cinco anos para aporte de recursos. “Chegamos à conclusão que este projeto é extremamente importante do ponto de vista socioeconômico. Nossa economia é dependente do agronegócio que é impactado pelas variações climáticas. Nossa projeção é transferir R$ 5 milhões para o Cempa.” Robson Vieira detalha que a Fapeg possui diversos instrumentos de fomento, além do investimento em capital. “Podemos comprar computadores, instalar estações meteorológicas, custear insumos e viagens para atrair pesquisadores experientes. Eles são fundamentais para que o Cempa traga resultados que nos levem a definir políticas públicas de uma forma assertiva.” De acordo com o presidente da Fapeg, todas as ações serão desencadeadas sob a coordenação da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).A expectativa é de que, a partir de dezembro, quando os primeiros produtos forem apresentados, o potencial do Cempa fique evidente para possíveis financiadores. “Previsão de tempo é uma atividade difícil em termos tecnológicos e cara do ponto de vista de produção de informação. Não é um capricho. A cada quatro anos, os maiores centros de operação de previsão de tempo do mundo investem algo em torno de 50 milhões de dólares em computadores”, afirma Saulo Freitas. O pesquisador reforça que o custo para produzir essa informação, de longe, é pago pelos resultados que ela gera.Estrutura humana conta com time de pesquisadores de pontaO Cempa Cerrado já conseguiu reunir um time de alto gabarito (leia mais ao lado). “O que o mundo faz de melhor lá fora, nós conseguimos fazer, mas precisamos de infraestrutura para que nosso trabalho aconteça na plenitude que estamos propondo. O grupo é formado, em sua grande maioria, por doutores com 20 anos a 30 anos de experiência, muitos com atuação internacional”, afirma Saulo de Freitas. Egresso da UFG, ele coordenou a equipe que desenvolveu um modelo de previsão para a agência espacial norte-americana (Nasa), considerado o mais preciso do mundo. “A crise orçamentária da UFG é dramática”, lembra Laerte Guimarães, que tem feito um trabalho de formiguinha para manter os pesquisadores vinculados ao Cempa. Saulo de Freitas e Karla Longo, que desenvolvem um projeto de prospecção de energia eólica para Furnas, transferiram recursos para bolsas de alguns pesquisadores. O pró-reitor de pós-graduação da UFG fez o mesmo com a verba que recebeu de uma fundação norte-americana para um de seus projetos de pesquisa.Outras duas bolsas foram viabilizadas por meio do Centro de Excelência em Inteligência Artificial (Ceia), baseado na UFG, e do Centro de Excelência em Agro Exponencial (Ceagre), que funciona no IF Goiano, em Rio Verde. Ambos os centros foram ancorados pela Fapeg. “Todos estes projetos se complementam, por isso foram aproximados. Nosso objetivo é montar um conjunto de ações no qual possamos nos basear para estabelecer políticas públicas”, explica Robson Vieira. COP evidencia importânciaSaulo Freitas explica que a ideia do Cempa nasceu a partir de uma preocupação com as mudanças climáticas, que têm afetado de maneira substancial o Cerrado, bioma que cobre a maior parte do território goiano. “Tudo isso vem de encontro ao que se discute na Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 26). O que está sendo dito lá é que as mudanças no clima estão ocorrendo de uma forma mais rápida e mais brusca do que a ciência antecipou, por isso a necessidade de ações de prevenção.” Ele mostra que há uma vertente do Cempa, ainda não totalmente identificada, que é o da educação ambiental. “O banco de dados dos últimos dez anos terá uma interface amigável não só para a academia, mas também para o ensino médio. Essa fonte de informações visa a despertar o interesse para as mudanças climáticas e criar a percepção na sociedade civil de que ela precisa se mobilizar para pressionar governos e instituições privadas no sentido de que seja feito algo mais concreto e robusto no sentido de mitigar e prevenir as consequências das transformações do clima.” Em fevereiro de 2020, quando apresentou o projeto do Cempa ao governador Ronaldo Caiado (DEM), Saulo destacou que Goiás tem sido afetado nas últimas décadas por redução nos volumes de precipitação e aumento da temperatura.EquipeSaulo Ribeiro de FreitasFísico pela UFG e doutor em Física da Atmosfera pela USP. Fez pós-doutoramento na Nasa (EUA) onde foi pesquisador sênior por cinco anos. Tem mais de 25 anos em modelagem numérica da atmosfera. Pesquisador e professor de Pós-Graduação em Meteorologia do Inpe. Demerval Soares MoreiraDoutor em Meteorologia, pesquisador da Unesp. Possui vasta experiência em modelagem atmosférica, com foco nos processos que ocorrem em superfície, ciclo do carbono e aerossóis de queimadas.Karla Maria Longo Física pela UFG e doutora em Física da Atmosfera pela USP. Possui pós-doutoramento na Nasa onde atuou como pesquisadora por cinco anos. Pesquisadora do Inpe. Investiga a composição química da baixa troposfera, com foco nas emissões de queimadas, transporte e impactos no clima e na saúde pública.Luiz Flávio Rodrigues Especialista em processamento de alto desempenho. Há 38 anos atua com dados de satélites, modelos ambientais e de previsão de tempo, arquitetura de computadores e linguagens de programação. Angel Domínguez Chovert Físico da Atmosfera. Doutor em meteorologia pelo Inpe. Trabalha com modelos de previsão numérica do tempo utilizados para estudo sobre eventos extremos de poluição atmosférica e de precipitação em regiões urbanas.Eugênio Sper de AlmeidaDoutor em Computação Aplicada pelo Inpe e pós-doutor em Ciência da Computação pela Western University (Canadá). Atua nas áreas de análise de dados, IoT, Cloud Computing e redes de computadores. Jairo PanettaEngenheiro Eletrônico pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e doutor em Ciência da Computação pela Purdue University (EUA). Professor colaborador do ITA. Experiente em arquitetura de computadores, processamento paralelo, processamento de alto desempenho, computação científica e supercomputação.Valter José Ferreira de OliveiraTecnólogo em informática com ênfase em redes de computadores. Possui dez anos de experiência em linguagens de programação e manipulação de dados. Rodrigo BrazGraduado em Computação Científica e pós-graduado em Engenharia Aeronáutica. Experiência no desenvolvimento de software e automação de processos em ambiente Linux, processamento de dados meteorológicos e de cálculos estatísticos. Haroldo Fraga de Campos VelhoEngenheiro químico, mestre e doutor em Engenharia Mecânica. Um dos pioneiros em IA no Brasil. Pesquisador do Inpe. Seus interesses envolvem, entre outros, pesquisa espacial, modelagem matemática de turbulência atmosférica e aprendizado de máquina aplicado à geociências. Mateus Ferreira e FreitasPossui graduação e mestrado em Ciência da Computação pela UFG. Tem experiência em administração de sistemas, projeto e implementação de algoritmos paralelos de granularidade fina e aprendizado de máquina.Ingrid PortilhoAluna do curso de Inteligência Artificial da UFGRaianny Cardoso - Aluna do curso de Inteligência Artificial da UFG