Uma palestra da Guarda Civil Metropolitana (GCM), nesta terça-feira (3), terminou com dez estudantes de uma escola de Goiânia, com idade entre 11 e 14 anos, socorridos após serem atingidos por spray de pimenta.Conforme os relatos de alunos, de professores e da própria corporação, a confusão se desencadeou porque os agentes não foram bem recebidos no local. Diante de focos de brigas entre as crianças e adolescentes, os GCMs lançaram a substância na quadra onde todos estavam reunidos.A confusão teve início por volta das 9h30. Era o momento de intervalo dos estudantes da Escola Municipal Professora Dalka Leles, localizada no Residencial Orlando de Morais, região norte da capital.Pouco antes desse horário, a direção da unidade e a Secretaria Municipal de Educação (SME) haviam convidado a corporação para uma “palestra sobre civismo”, conforme afirma a GCM. Já nas dependências da escola, presenciando uma briga no banheiro masculino, os agentes levaram cerca de 110 estudantes para a quadra de esportes, local em que as confusões saíram do controle.Uma estudante ouvida pelo POPULAR diz que andava pelos corredores com uma amiga quando recebeu a ordem de ir para a quadra. “Chegando lá, quando os agentes começaram a falar, alguns dos meninos ficaram gritando, fazendo som de sirene”, diz a menina de 13 anos que não será identificada por solicitação da mãe. Segundo ela, um dos estudantes foi confrontado por um guarda sobre o barulho, momento em que os demais estudantes começaram a emitir os mesmos sons, iniciando a confusão generalizada.PimentaAlém dos barulhos, a GCM diz que parte das crianças estava com paus e pedras nas mãos. Por conta disso, a Guarda afirma que precisou fazer o “uso seletivo da força” para evitar que os estudantes se ferissem. Os estudantes ouvidos, porém, dizem que não se recordam de nenhum colega com pau ou pedra nas mãos.Com a confusão, um dos guardas teria começado a gritar com as crianças e adolescentes, momento que antecedeu o uso do spray de pimenta, que segundo a Guarda, foi jogado em direção ao chão e não diretamente nos alunos.Janilson Saldanha, assessor de comunicação da Guarda, afirma que o uso foi necessário e respeitou os protocolos de atuação já conhecidos. “Caso a Guarda não tivesse agido assim, muitas crianças teriam se machucado. Evitamos o mal maior utilizando o spray. O foco foi conter a briga das próprias crianças. Em nenhum momento elas foram para cima dos agentes. Mas, como eram muitos, então foi necessário para a integridade física delas mesmo”, alegou.Os estudantes dizem que viram pelo menos três jatos de spray de pimenta, que teriam sido jogado entre eles enquanto estavam enfileirados. Neste momento houve muita correria. Funcionários que buscavam proteger as crianças trancaram várias delas em salas de aula.FeridosAmbulâncias do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e do Corpo de Bombeiros se deslocaram até o local e fizeram o socorro por conta dos efeitos do gás. Apesar do relato de ardência nos olhos e no sistema respiratório, nenhum dos estudantes precisou ser levado para o hospital.SMEApesar de ter sido citada como sendo responsável pelo convite para que a GCM comparecesse à escola, a SME respondeu à reportagem que apenas a Guarda responderia sobre o ocorrido.Pais prometem denunciar ocorrido Diversos responsáveis pelos estudantes envolvidos na confusão prometem denunciar o caso à Polícia Civil. Uma das lideranças do bairro, que preferiu não se identificar e faz a gestão de um projeto de iniciação esportiva, afirma já ter reunido dezenas de pais que levarão o caso para a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA).O líder de bairro diz que várias crianças têm o contato dele em razão do projeto esportivo. Foi por meio de ligações que ele soube da confusão. “Comecei a receber ligação falando: ‘professor, eu vou morrer’, ‘vão matar a gente’”, relata o homem que também tem um filho estudando na unidade.“Cheguei à escola depois de dois minutos e me assustei. Vi que quem deveria servir e proteger está com o despreparo total a ponto de entrar em uma escola e jogar spray de pimenta em crianças”, critica o pai. Pela experiência lidando com crianças da mesma idade, o representante diz que jamais irá concordar que o uso de força tenha sido necessário.Os vizinhos da escola dizem que nas últimas semanas as brigas na porta da escola têm sido comuns. A GCM afirma que a unidade escolar tem recorrentes problemas de indisciplina.Suzana é mãe de uma estudante de 13 anos que precisou ser atendida por socorristas após a confusão. “Uma funcionária da secretaria ligou e disse que minha filha estava tendo uma crise de ansiedade. Minha filha nunca teve isso, então achei estranho. Questionei e ela disse que todos da escola estavam com crise de ansiedade, então é claro que vi que alguma coisa grave tinha acontecido”, relata a mãe.Outra mãe, que pediu anonimato, conta o que ouviu da filha pelo telefone: “Mãe eu estou passando muito mal, não estou conseguindo respirar, acho que vou desmaiar”. Depois de escutar as reclamações da filha, a mulher foi para a escola, encontrando a estudante dentro de uma ambulância. “Você vai trabalhar, acha que seu filho está seguro, chega lá e ele está dentro da ambulância, amanhã pode ser o quê? Vou encontrar dentro de um caixão?”, questiona.ApuraçãoAinda nesta terça, representantes do Conselho Tutelar estiveram na escola ouvindo os pais e os funcionários da escola. A Corregedoria da GCM também esteve no local e promete investigar o caso.A GCM diz que o protocolo de visitas e reações seguirá o mesmo. “O que a gente fica preocupado é que a escola é um lugar para aprender ciências, não um local para brigar”, diz Saldanha.