Goiás foi o estado com maior aumento porcentual da área desmatada no Brasil, conforme o último Altas da Mata Atlântica, para o bioma, divulgado nesta semana. O documento mostra que houve variação positiva de 1.350% nos últimos 12 meses avaliados na comparação com o mesmo intervalo anterior. Os números absolutos são menos significativos, mas a preocupação escala porque a formação florestal cobre apenas 3,5% do território goiano. De outubro de 2019 a setembro de 2020 foram 7 hectares contra 105 hectares de outubro de 2020 a setembro de 2021.A área de Goiás que tem intersecção com a Mata Atlântica soma 1.190.894 hectares. Não é muito comparado ao território total do estado. Entretanto, ela guarda uma riqueza de biodiversidade grande, conforme especialistas. No Brasil, só as espécies de plantas somam mais de 20 mil (veja quadro).No estado, as frações de Mata Atlântica reconhecidas se situam na porção sul goiana, na divisa com Minas Gerais. Elas estão em municípios como Itumbiara, Bom Jesus de Goiás, Quirinópolis e Água Limpa. As características não são idênticas às verificadas ao longo da faixa litorânea, em locais como a Serra do Mar, mas, ainda assim, apresenta formações florestais e espécies consideradas típicas do bioma.O atlas apresenta 11 tipos de cobertura vegetal na área de aplicação da Lei da Mata Atlântica (Lei Federal n° 11.428/2006). As frações em Goiás são descritas como “Floresta Estacional Semidecidual (Floresta Tropical Subcaducifólia)”, que, conforme a Embrapa, são formações florestais com porte médio de árvores em torno de 20 metros. Além disso, manifesta uma perda de folhas no período seco, enquanto que no período chuvoso é mais densa.O monitoramento do desmatamento na Mata Atlântica existe desde 1989 e é realizado em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que também alimenta bancos de dados sobre o que acontece no Cerrado, por meio do Prodes, e na Amazônia.O Atlas, que leva a assinatura da Fundação SOS Mata Atlântica, chamou a atenção neste ano com o resultado apresentado para Goiás. Assim como todo o relatório, houve uma checagem da informação relativa a Goiás, conforme o diretor de conhecimento da ONG, Luis Fernando Guedes Pinto. “Subiu para mais de 100 hectares, mas é uma proporção muito pequena de desmatamento do bioma no Brasil. Ainda assim, foi um alerta”, frisa.Em todo o Brasil, o aumento na perda de vegetação do bioma foi de 66%. Os relatórios de outra ONG, o MapBiomas, que faz análises de dados, têm apontado que mais de 90% dos desmatamentos da Mata Atlântica apresentam indícios de ilegalidade.Nova áreaNa região dos municípios de Itajá, Aporé e Lagoa Santa, também no sul do Goiás, há pesquisas realizadas pela Universidade Federal de Jataí (UFJ), iniciadas há mais de dez anos, que apontam a ocorrência de florestas com a presença de espécies vegetais e animais típicas do bioma Mata Atlântica.Doutor em Ciências Biológicas pela Unesp de Rio Claro, o professor da UFJ Frederico Augusto Guimarães Guilherme é um dos pesquisadores do assunto na região. Ele explica que o trabalho dele e sua equipe tem estudado as florestas de galeria (florestas associadas à cursos d’água de pequeno porte localizadas em vales e com umidade maior ao longo do ano do que as florestas estacionais e as florestas ciliares que margeiam rios) na região. Estas conhecidas também como matas de brejo ou florestas paludosas, onde o solo apresenta-se encharcado boa parte do ano.Os trabalhos fazem parte do programa Pesquisas Ecológicas de Longa Duração na Transição Cerrado-Mata Atlântica (Peld-Cema), que é financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg).AnáliseOs estudos do professor e sua equipe têm verificado a presença e elevada abundância de espécies típicas da Mata Atlântica, como o palmito-jussara ou palmito-doce, cujo nome científico é Euterpe edulis. Além disso, Frederico Guilherme afirma que é notória a ocorrência de muitas samambaias, que têm como característica a necessidade de alta umidade e água para a reprodução, além de espécies de bromélias e orquídeas. “Mesmo com essas características que se assemelham à Mata Atlântica da região litorânea brasileira, o clima do sul goiano é típico de Cerrado, bem diferente do litoral. Portanto, há sim diferenças nas características físicas e biológicas (flora e fauna) entre essas situações de Mata Atlântica, que acompanha essa gradual variação climática. No Cerrado há períodos de cinco a seis meses com chuva escassa, o que não ocorre na Mata Atlântica do litoral do Brasil”.Esta região de Goiás, onde se concentram as pesquisas do Peld-Cema, tem registrado outros elementos da flora que antes só eram verificados próximo do litoral ou até mesmo em florestas tropicais, como na Amazônia. “Isto reforça cada elo que o Cerrado tem com esses biomas florestais (Florestas Amazônica e Atlântica) no Brasil, aumenta a importância na preservação dessas florestas do Cerrado”. O pesquisador explica que análises para a delimitação entre biomas necessita, além de imagens de satélite, pesquisas detalhadas em campo e em escalas menores, para melhorar o conhecimento da distribuição das espécies e da biodiversidade de cada local. “Por isto, são necessárias mais pesquisas e mais recursos humanos para efetivação desses estudos em um território tão vasto e progressivamente ameaçado pela ocupação humana.”Ponto de vistaDoutora em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Goiás (UFG), a professora da Universidade Estadual de Goiás em Quirinópolis, Isa Lucia de Morais, afirma que não conhece toda a região sul do estado, mas com base nas pesquisas que conduz no município e proximidades, diz não concordar que haja Mata Atlântica na região. “Pode ser que algum outro lugar que ainda não andei, tenha o bioma, mas tudo o que eu já andei aqui é predomínio do Cerrado.”Atualmente, ela acompanha o trabalho de uma aluna que pesquisa Unidades de Conservação no estado. Conforme a análise de mapas, a pesquisadora sustenta que na região reconhecida como Mata Atlântica não há o bioma. Área protegida pode ser ampliadaOs municípios de Aporé e Itajá foram objetos de uma Análise Ambiental como subsídio para a criação de uma unidade de conservação. As duas cidades têm no território estudos que apontam a ocorrência de florestas com a presença de espécies vegetais e animais típicas do bioma Mata Atlântica.O objetivo é promover a proteção de espécies em uma região que tem perdido parte da cobertura natural.O trabalho, que teve a atuação do doutor em Ciências Biológicas pela Unesp de Rio Claro e professor da Universidade Federal de Jataí Frederico Augusto Guimarães Guilherme, mostra a expansão da área em uso pela pecuária e pela agricultura. “Nos últimos anos, a região passou por conversão das culturas de soja e milho, para o plantio da cana-de-açúcar, em função da expansão das indústrias de produção de açúcar e biocombustíveis”, diz trecho o levantamento ao citar um dado de 2016.A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) informou ao POPULAR que desde 2012 o assunto tramita na pasta com a elaboração de estudos técnicos, o nome ainda não foi escolhido: “Parque ou Refúgio de Vida Silvestre”.A pasta informou ainda que na atual gestão os estudos foram atualizados e a questão deve ser submetida a consulta pública, etapa obrigatória para a criação de Unidades de Conservação. Goiás tem ao menos uma unidade de conservação para o bioma. É o Parque Estadual da Mata Atlântica, no município de Água Limpa. Ele está sob a gestão da Semad e tem área de 938,35 hectares. A criação foi regulamentada em 2006 pelo decreto estadual nº 6.442.Leia também: - Mais de 75% da área desmatada em Goiás não teve fiscalização da Semad- Após 5 anos, área do parque da Chapada dos Veadeiros segue em disputa- Estrela da novela Pantanal, onça-pintada Matí vive em instituto em Corumbá de Goiás-Imagem (1.2463413)-Imagem (1.2463432)