Duas semanas antes de o tapeceiro João Victor Nunes Araújo Guedes, de 27 anos, ser morto dentro da Casa de Prisão Provisória (CPP), a Defensoria Pública do Estado de Goiás (DPE-GO) entrou com um habeas corpus pedindo que ele respondesse pelo crime em liberdade. Preso em flagrante no dia 8 de fevereiro por furto em um supermercado de Goiânia, ele deveria ter tido a prisão reavaliada em maio e, segundo a defensoria, poderia responder pelo crime – de menor potencial ofensivo – em liberdade, mesmo que sob monitoramento eletrônico.João Victor foi morto no bloco 3 da Ala B da CPP na quarta-feira (27). A Diretoria Geral da Administração Penitenciária (DGAP) informou que houve um tumulto no final da tarde dentro da cela e que o preso foi resgatado ferido por agentes penais. O socorro médico foi chamado, mas ao chegar foi constatada a morte. O pedido de habeas corpus seria analisado pela Justiça em 1º de agosto.É a quarta morte na CPP nesta semana. Um dia antes, três presos foram encontrados enforcados em duas celas também da Ala B, mas em outro bloco, pelos agentes. Representantes da DPE-GO e da seccional goiana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-GO) foram barrados na terça-feira (26) para averiguar a situação, mas estiveram no bloco na quarta, horas antes da morte de João Victor. A DGAP informou nesta quinta (28) que transferiu de presídio os detentos que seriam responsáveis pelas mortes.João Victor foi detido pela Polícia Militar com duas furadeiras avaliadas em R$ 750 e uma faca, material que furtou junto com a esposa, uma jovem de 21 anos, no Carrefour do Jardim Goiás. O casal estava com a filha de 2 anos e teria deixado a criança para trás durante a tentativa de fuga. A mulher conseguiu responder pelo crime em liberdade, mas ele ficou preso por causa de uma passagem anterior por furto em outro Estado.Titular da 3ª Defensoria Pública Especializada Criminal da Capital, o defensor Daniel Bombarda Andraus diz que a morte de João Victor se deu em um contexto de excesso de prazo da prisão preventiva, “com o qual a Defensoria Pública não concordava, especialmente em se tratando de mero crime de furto em supermercado para o qual não vislumbrávamos regime fechado em caso de condenação”.O defensor pleiteava que João Victor pudesse responder o processo ao menos com a tornozeleira eletrônica. O defensor argumentava que, mesmo em caso de condenação, dificilmente seria fixado regime fechado, “não sendo proporcional que aguardasse preso ao longo de todo o processo”. Quando a DPE-GO entrou com o habeas corpus em 11 de julho, o tapaceiro já estava na cadeia há 152 dias. Ao morrer, 168.Entretanto, Daniel afirma que “seria temerário” estabelecer um nexo entre tal excesso de prazo e o resultado morte. “As circunstâncias da morte ainda estão sendo apuradas”, respondeu ao POPULAR.João Victor chegou a passar por uma audiência de instrução do processo no dia 21 de julho, momento em que foi ouvido junto com a esposa e ambos confessaram o furto.InvestigaçãoA morte de João Victor é alvo de investigação e os entrevistados pelo POPULAR comentaram não haver elementos ainda para estabelecer ou não uma ligação com os outros três presos assassinados.Nesta quinta, a DGAP informou que transferiu para outros presídios os presos identificados como possíveis envolvidos nas mortes. “Após os eventos negativos ocorridos na Casa de Prisão Provisória, a Polícia Penal de Goiás realizou operações dentro da unidade e transferiu os principais criminosos envolvidos com os incidentes de violência dos últimos dias”, afirmou o órgão, em nota.Detento pede para não ir para a CPPUm homem que responde a um processo por homicídio junto com dois dos quatro presos que foram mortos na Casa de Prisão Provisória (CPP), no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia, entrou com recurso na Justiça para que não seja transferido da carceragem da Delegacia de Capturas (Decap) para o presídio onde ocorreram as mortes nem qualquer unidade dentro do complexo em Aparecida. Dos quatro acusados no processo, ele seria o único sobrevivente.Na manhã de terça-feira (26), Hyago Alves da Silva, de 19 anos, e Matheus Junior Costa de Oliveira, de 20, foram encontrados enforcados em uma cela com outros 28 detentos. Eles são acusados de matar o barbeiro Clayton Junior Cestino Costa, então com 23, no dia 16 de março, em Aparecida, e foram detidos em maio. Após o depoimento de ambos, a polícia prendeu no começo de julho Lucas Marques Pereira, de 18 anos, acusado de ter vendido a arma para a dupla em troca de R$ 2 mil. Lucas também responde por outros homicídios.A defesa de Lucas diz que o quarto acusado pelo crime contra Clayton, Matheus Xavier do Rêgo, de 23 anos, suspeito de ser o mandante do homicídio, também está morto. Ele não chegou a ser preso e estava foragido. Os advogados Clodomir Ferreira Pimentel e Ronaldo Rodrigues Borges entraram com pedido para que o custodiado fosse transferido “com urgência” para “outro lugar seguro, desde que não seja no referido Complexo Prisional”.“Não dá pra apontar local seguro, mas sabe-se que o sistema penitenciário possui módulos de segurança capaz de produzir maior segurança a presos com risco de vida, seja por desavenças entre presos, seja por confrontos com facções etc”, afirmaram em nota.A defesa de Lucas destaca que até o momento as mortes de Hyago e Matheus não foram esclarecidas. “A falta de informações precisas sobre a morte dos presos acima citados preocupa não somente os advogados, mas os familiares de Lucas, e depõe contra a segurança do sistema carcerário.”O custodiado não teria recebido nenhuma ameaça dentro da Decap, onde se encontra desde o começo do mês. Segundo os advogados, o número de presos lá é mínimo.O temor dos advogados é que a morte da dupla tenha a ver com o crime pelo qual são acusados. “O receio é que possa estar havendo algum tipo de vingança face ao crime cometido por àqueles. Lucas, mesmo não tendo nenhuma participação, teve seu nome apontado nos autos. Agora poderá também sofrer as consequências que resultou no óbito de Matheus e Hyago.”Defensoria e OAB cobram soluçãoA Defensoria Pública do Estado de Goiás (DPE-GO) e a Comissão de Direitos Humanos da seccional goiana da Ordem dos Advogados de Goiás (OAB-GO) cobram da Diretoria Geral de Administração Penitenciária (DGAP) uma resposta rápida para conter o que acreditam ser uma escalada de tensão e violência dentro do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia. Impedidos de entrar na CPP no dia em que três presos foram encontrados mortos, eles estiveram no local e conversaram com colegas de celas dos detentos no dia seguinte, horas antes da quarta pessoa ser morta.O defensor público Marco Túlio Félix Rosa, coordenador do Núcleo Especializado de Direitos Humanos (NUDH) da DPE-GO, afirma haver um problema pontual, relacionado a quem cometeu os crimes, e outro mais amplo, estrutural, que envolve uma escalada de violência que culminou com as mortes. Para ele, a transferência dos presos noticiada pela DGAP resolve o primeiro.As primeiras informações coletadas pelos visitantes apontam que as mortes dos três primeiros presos teria a ver com a suspeita entre outros custodiados de que estes teriam delatado algumas situações para agentes penais e que a forma como foram mortos seria também um alerta para os outros presos. Hyago Alves, Matheus de Oliveira e Paulo César Pereira dos Santos, este preso por furto, foram encontrados enforcados em duas celas. Para Marco Túlio, a violência nesta semana pode ter relação com as queixas cada vez maiores dos detentos em relação à superlotação das unidades e a aspectos envolvendo o banho de Sol, a qualidade da alimentação e o momento das visitas. Conforme O POPULAR apurou, as duas celas em que estavam os três presos mortos na terça tinham, cada uma, 30 pessoas no momento.A advogada Isadora Costa Correa, da OAB-GO, diz que um relatório está sendo feito pelos órgãos a partir do que ocorreu e das providências da DGAP.Leia também:- Três presos são encontrados mortos dentro de celas da CPP, em Aparecida de Goiânia- Dois dos três mortos na CPP cometeram crime juntos- Defensoria pede explicações à DGAP sobre mortes em CPP- Polícia investiga três mortes de presos na CPP, em Aparecida de Goiânia- Mais um preso morre na CPP de Aparecida de Goiânia, o quarto em dois dias- Presos envolvidos em mortes na CPP, em Aparecida de Goiânia, são transferidos