Com pouco mais de 20 anos, Célio (nome fictício), morador de um município da região metropolitana de Goiânia, desistiu de ser um recenseador após 24 dias do início da Coleta do Censo Demográfico 2022 realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os problemas que ele relata são os mesmos apontados por colegas de todo o Brasil que preparam um movimento de paralisação para o dia 1º de setembro sob a alegação de atrasos de pagamentos e falta de condições de trabalho. Em Goiás, das mais de 6,5 mil vagas abertas pelo órgão federal, apenas 4,2 mil foram preenchidas. Célio conta que ficar sem receber nem mesmo os 200 reais previstos para o período de treinamento foi a gota d’água para a sua decisão. Ele decidiu focar na faculdade e conseguiu outro trabalho. Recenseadores, como está no edital, trabalham por produtividade, sem direito a alimentação e transporte, apenas ajuda de custo. Célio diz ao POPULAR que recebeu apenas 50 reais de ajuda para se locomover no primeiro setor. “Faça as contas. Trabalhei cerca de 17 dias, ando de ônibus. A passagem custa R$ 4,30 e gastei o dobro todos os dias.” O jovem reclama das informações confusas repassadas para os aprovados no concurso do Censo 2022. “Não foi passada a tabela exata de quanto vão valer as coisas, cada domicílio visitado, a pessoa entrevistada. Quando questionamos, nos pedem para verificar o simulador. Fiz uma prova, paguei por ela, inicialmente achava que deveria voltar numa casa umas quatro vezes e, pronto, estaria finalizado, mas agora sabemos que não pode ter mais de 5% de pendência (ausência com recusa). Cheguei no meu limite, físico e psicológico”, afirma Célio. Leia também:- Recenseadores do IBGE reclamam de atraso no pagamento da ajuda de custo- Recenseadores do IBGE denunciam agressões verbais e recusa dos moradores ao Censo- Censo do IBGE visita 2,8 milhões de domicílios em GoiásOs recenseadores estão mobilizados, expondo as falhas do trabalho no Censo 2022 em diversos grupos nas redes sociais. Uma das lideranças é Paula Fonseca, que atua no bairro de Madureira, no Rio de Janeiro. Segundo ela, o objetivo não é desistir, mas relatar o que vem acontecendo para que as condições de trabalho melhorem para todos. “Nós não temos salário fixo e o simulador de produtividade não bate com o valor definido pelo supervisor para nos pagar.” A coleta de dados feita pelo recenseador é supervisionada por agentes censitários para evitar que haja falsificação. Paula Fonseca diz que já gastou mais de 500 reais do próprio bolso e sente que caiu “no conto do vigário do IBGE”, mas, embora seja contundente em suas críticas, não apoia a desistência. O goiano Célio referenda o que diz a recenseadora fluminense. “Nas apostilas e no treinamento cobram comprometimento e ética, mas não honram a palavra”. Para o jovem, o IBGE falhou na divulgação em massa sobre o Censo, que está atrasado dois anos em razão da pandemia da Covid-19. “Muitos moradores nem sabem o que é Censo e IBGE”, lamenta. O anapolino Pedro integra um dos grupos. Ele reforça que os obstáculos são os mesmos para todos os recenseadores. Nesta quarta-feira (24) ele agendou uma entrevista presencial, se deslocou até o domicílio e não foi atendido. “Tive de fazer por telefone, ainda bem que me atendeu porque na maioria das vezes, nem isso.” O recenseador recebeu até agora pouco mais de 100 reais, relativos à ajuda de custo pela conclusão do primeiro setor. “Uma colega, nem isso. E ela não tem dinheiro para deslocamento.” GreveA Bahia tem um dos mais fortes movimentos de recenseadores. Por lá, quase 600 aprovados no concurso do IBGE desistiram do trabalho. Quem resiste promete reforçar a paralisação marcada para quinta-feira (26), um dia antes de uma reunião on-line nacional, às 18 horas, para definir a plataforma de reivindicações que serão apresentadas na greve geral do dia 1º de setembro. Entre os temas a serem debatidos estão o pagamento do treinamento e de setores já fechados; ajuda de custos para locomoção e alimentação; suporte dos agentes censitários; retorno várias vezes a domicílios com morador ausente; falta de segurança; valores divergentes da tabela para o simulador e a reivindicação de um fixo de 500 reais. “O IBGE está alegando que já pagou mais de 90% dos recenseadores, mas nos grupos que participo ninguém recebeu. No Instagram, WhatsApp, Telegram e Facebook todos fazem a mesma reclamação. Onde está o pessoal que recebeu?”, questiona Paula Fonseca. A recenseadora afirma que os supervisores insistem em dizer que o edital explicava que eles não teriam direito a transporte e alimentação. “Mas o edital também não dizia que não iríamos receber”, rebate. “Foi muito difícil o tempo que trabalhei, muitos dias sem almoço, só com o café da manhã”, comenta Célio. Em um dos grupos, um recenseador do Rio de Janeiro mostrou o “almoço” de um dia de trabalho: um ovo cozido. Corte no orçamento pode atrasar os trabalhosO Censo é realizado pelo IBGE de dez em dez anos e permite não apenas saber qual é o número de brasileiros, mas também conhecer as condições de vida da população para definir políticas públicas adequadas. Em 2022 os trabalhos de coleta de dados começaram no dia 1º de agosto nos 5.570 municípios do País, com previsão de visita de 89 milhões de endereços, 75 milhões deles domicílios. Embora com déficit de recenseadores, abaixo da média nacional em estados do Sudeste, Sul e Centro-Oeste, o IBGE anunciou o fim dos trabalhos para 31 de outubro, mas a mobilização dos aprovados pode impactar esta previsão.No Brasil, a última coleta de dados para o Censo ocorreu em 2010, mas a seguinte, prevista para 2020, precisou ser adiada em razão da pandemia da Covid-19. No ano passado, houve novo adiamento por problemas orçamentários. Inicialmente estavam previstos R$ 3,1 bilhões para o Censo, mas houve vetos durante a tramitação da lei orçamentária no Congresso Nacional. Após determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), o governo federal liberou R$ 2,3 bilhões para a pesquisa, 26% a menos do orçamento original. Corte no orçamento pode atrasar os trabalhosO Censo é realizado pelo IBGE de dez em dez anos e permite não apenas saber qual é o número de brasileiros, mas também conhecer as condições de vida da população para definir políticas públicas adequadas. Em 2022 os trabalhos de coleta de dados começaram no dia 1º de agosto nos 5.570 municípios do País, com previsão de visita de 89 milhões de endereços, 75 milhões deles domicílios. Embora com déficit de recenseadores, abaixo da média nacional em estados do Sudeste, Sul e Centro-Oeste, o IBGE anunciou o fim dos trabalhos para 31 de outubro, mas a mobilização dos aprovados pode impactar esta previsão.No Brasil, a última coleta de dados para o Censo ocorreu em 2010, mas a seguinte, prevista para 2020, precisou ser adiada em razão da pandemia da Covid-19. No ano passado, houve novo adiamento por problemas orçamentários. Inicialmente estavam previstos R$ 3,1 bilhões para o Censo, mas houve vetos durante a tramitação da lei orçamentária no Congresso Nacional. Após determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), o governo federal liberou R$ 2,3 bilhões para a pesquisa, 26% a menos do orçamento original. Movimento é acompanhado pelo IBGE Em Goiás, o IBGE marcou para o próximo dia 30 a divulgação dos resultados do primeiro mês de trabalho dos recenseadores. Dados do órgão, em âmbito nacional apontam que o estado tem 1,2% da coleta concluída, abaixo da média nacional que chegou a 2,3%. A superintendência estadual esclarece que 36% dos setores censitários estão na fase de coleta de dados e esses passam por uma série de supervisões antes da liberação do pagamento e de serem considerados concluídos.De acordo com a assessoria de comunicação, a ameaça de greve vem sendo acompanhada pelo órgão em âmbito federal que tem se esforçado para evitar a paralisação do censo demográfico. Sobre a falta de pagamento, o órgão confirma que houve problemas para o repasse dos valores relativos ao treinamento, mas que a maior parte dos recenseadores já recebeu. “Estamos atuando para solucionar problemas pontuais que persistem”. O IBGE também confirma que houve relatos de desistência.De uma maneira geral, conforme o IBGE, os recenseadores são bem recebidos, mas há reclamações de rispidez e negativas para responder os questionários. Em alguns casos foi necessário chamar reforço policial. Pela Lei nº 5.534/1968, o cidadão é passível de multa de até dez (10) salários mínimos se não prestar as informações solicitadas pelo IBGE e o dobro deste valor, em caso de reincidência. “O Censo tem se mostrado desafiador, mas contamos com a colaboração da população para que possamos trazer ao País o retrato mais fidedigno da nossa realidade”, afirma o superintendente Edson Roberto Vieira.