Um anúncio feito pelo presidente dos Estados Unidos (EUA), Donald Trump, na tarde desta quinta-feira (19), de que um medicamento teria o potencial de “virar o jogo” contra o novo coronavírus (Covid-19), causou grande comoção mundial. Apesar disso, as pesquisas são iniciais, feitas com uma amostragem de 40 pessoas e não englobam o grupo de pacientes com complicações mais graves. Diante do cenário, o Conselho Regional de Farmácia de Goiás (CRF-GO) recomenda cautela e pede que a população não faça a compra indiscriminada dos medicamentos cloroquina, usada há 70 anos contra a malária, e a hidroxicloroquina, um derivado menos tóxico da droga.Uma carta escrita por cientistas das Universidades Stanford e Columbia afirma que pacientes que receberam a medicação tiveram efeitos curativos com eficácia. Entre os pontos analisados, melhora no quadro febril e nas imagens de pulmão. Além disso, precisaram de menos tempo para se recuperarem do que os que não teriam recebido a medicação. O CRF-GO, entretanto, faz um alerta: “Neste momento, mais do que nunca, é importante que a população não se automedique e não difunda receitas milagrosas”. Isso porque, muitas pessoas procuraram as farmácias em busca do medicamento.Os estudos não foram os únicos e similares ocorreram na China, Coreia do Sul e na França. Neste último, entretanto, que foi divulgado na última terça-feira (17), foram analisados efeitos da hidroxicloroquina em 20 contaminados e um combinado da droga anti-malária com a azitromicina, um antibiótico tradicional, em outras seis pessoas. Apesar de resultados promissores, uma análise que possa ser mais esclarecedora, as substâncias ainda carecem de mais testes.Diretor secretário do CRF-GO, Daniel Jesus, que é farmacologista e também professor, explica que o trabalho nos Estados Unidos foi feito com 40 pacientes e que ainda é muito pequeno. No geral, segundo ele, pelo menos 3 mil pessoas devem ser testadas até o fim das pesquisas. “Escolheram pacientes aleatórios, nenhum em estado grave, amostras não foram randomizadas e não englobaram todas as faixas da população. A doença em si não é grave para grande parte da população e para a maioria, depois de 11 dias, não há sequelas ou internação. Os resultados mostram redução da carga viral após seis dias e apesar de animador, não significa que vai aumentar sobrevida de idosos”, pontua.Também nesta sexta-feira (20), a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) emitiu uma nota técnica destacando que os medicamentos são registrados para o tratamento da artrite, lúpus eritematoso, doenças fotossensíveis e malária. Além de reafirmar que a automedicação pode representar um grave risco à saúde, explica que não existem estudos conclusivos que comprovam o uso destes medicamentos para o tratamento da Covid-19. “Portanto, não há recomendação da Anvisa, no momento, para a sua utilização em pacientes infectados ou mesmo como forma de prevenção à contaminação pelo novo coronavírus”, diz.O Conselho Federal de Medicina quer que a venda de medicamentos que contém cloroquina e hidroxicloroquina seja autorizada apenas com receita médica. A entidade argumenta que a compra e o uso indiscriminado deste medicamento não é recomendada. (Com Agência Estado) Automedicação pode ter efeitos graves à saúde, como cegueiraO Conselho Regional de Farmácia de Goiás (CRF) Afirma que já houve uma corrida às farmácias em busca do medicamento à base de hidroxicloroquina. Daniel explica, entretanto, que isso não deve ocorrer, até mesmo porque são remédios utilizados para pacientes com lúpus, malária e artrite, por exemplo. Se os estoques ficarem escassos, as pessoas que precisam podem não encontrá-los. “Além disso, o uso indiscriminado pode resultar em efeitos colaterais como perda de visão, alterações cardíacas e problemas hepáticos”, completa.Para o farmacologista, ainda que o remédio seja utilizado no tratamento de doentes, a conduta de ir à farmácia para comprar o medicamento, é inadequada. “Acreditamos que 98% da população não terá riscos graves e complicações. Ainda assim, os 2% são suficientes para tumultuar o Sistema Único de Saúde (SUS). Até o momento temos uma média de 30 pacientes mais graves no País. Imagina se tivermos 1 milhão, este remédio for nossa alternativa e estivermos desabastecidos. Mesmo se for um bom medicamento, estamos agindo errado”, acrescenta.De acordo com o Conselho, também o Hospital Albert Einstein cita a hidroxicloroquina (derivado menos tóxico destas drogas) em seu protocolo de manejo da Covid-19 como opção de tratamento, ficando a critério médico a escolha por não haver estudos conclusivos para esta indicação. Outras pesquisas também estão sendo realizadas com medicamentos que são utilizados para tratamentos de Aids, H1N1 e o vírus Ebola. “É claro que torço para dar certo, mas ciência não é milagre e a doença ainda é muito jovem, recente e imprevisível. Trump fez o anúncio, quer achar a cura, mas não é cientista, é empresário”, pondera Daniel.