A partir de 2022 o goianiense deverá arcar com os custos da limpeza urbana, orçada atualmente em cerca de R$ 160 milhões por ano. A redução deste valor é complexa e pode resultar em um sistema de coleta de resíduos sólidos ainda mais ineficiente. No entanto, especialistas entendem que um aperfeiçoamento da coleta seletiva e uma otimização nos custos, especialmente de transporte, do serviço seriam os métodos com possibilidade de sucesso. Atualmente, a eficácia da coleta seletiva é baixa e cada tonelada coletada chega a custar cerca de 600 reais, ou seja, mais de duas vezes o valor pago na coleta convencional, com média de R$ 276 a tonelada.Assim, aumentar a quantidade de resíduos para a reciclagem, com destino às cooperativas cadastradas na Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg), seria o método mais eficiente para reduzir os custos. Se houver a reutilização de 15% dos resíduos sólidos e 10% dos orgânicos, pode ser gerada renda de R$ 7,9 milhões por ano. De forma indireta, essa ação também diminuiria o volume de lixo despejado no Aterro Sanitário.O professor do Núcleo de Resíduos Sólidos e Líquidos da Escola de Engenharia Civil e Ambiental (EECA) da Universidade Federal de Goiás (UFG), Eraldo Henriques de Carvalho, confirma que a coleta seletiva na capital ainda é baixa. “O básico é melhorar o índice de resíduos secos e melhorar o uso da matéria orgânica”, explica.A dificuldade para tal, segundo Carvalho, é que há necessidade de um investimento inicial. “À medida que queremos um sistema melhor, tem um aumento de custo mesmo. A coleta seletiva precisa de um investimento. Tem de ampliar a coleta e tem de aproveitar a matéria orgânica”, resume. Neste último caso, o professor lembra que a realização de compostagens, que é o uso da matéria orgânica na fabricação de adubo, tem o custo de implantação, dos veículos e trabalhadores, por exemplo. No entanto, há também ações mais baratas.O principal exemplo é a redução na produção de lixo, que deve partir de cada cidadão e também das instituições públicas e privadas, além de realizar uma melhor separação dos resíduos orgânicos e recicláveis. Tudo ocorreria com programas de educação ambiental, como para ensinar a população os métodos corretos de separação e armazenamento dos resíduos, o que promove maior aproveitamento para as cooperativas e, logo, menor quantidade de produtos devolvidos ao Aterro Sanitário. Outro ponto que pode ser melhorado para a redução dos custos seria a otimização das rotas da coletas seletiva e domiciliar.Presidente do Instituto de Desenvolvimento Ambiental, Diógenes Aires, explica que o principal gargalo na coleta dos resíduos sólidos feita pela Comurg é justamente com o transporte. Isso se dá pelo alto custo gasto com combustível e com manutenção, seja em relação à aquisição de peças ou mão de obra. Para se ter uma ideia, de acordo com a Comurg, são gastos cerca de R$ 6,4 milhões por ano com combustível para a realização das duas coletas. Além disso, ainda é pago R$ 3,15 milhões de aluguel dos 16 caminhões tipo baú, com os motoristas, usados para a coleta seletiva na capital.Aires lembra ainda que é possível voltar a realizar o rastreamento dos veículos para verificar as rotas que estão sendo feitas e se é possível otimizar. “Assim é possível verificar quantas vezes o caminhão passou em uma mesma rua, qual o circuito foi feito, se é possível otimizar isso”, diz. No Plano de Coleta Seletiva feito pela Ampla Consultoria e apresentado à Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma) no mês passado constam falhas nos trajetos realizados pelos veículos das duas coletas. Segundo apuraram os técnicos contratados para o diagnóstico do documento, há rotas em que a coleta seletiva e a domiciliar passam no mesmo dia e horário nos mesmos local. Com isso, como não há contêineres ou lixeiras diferentes para cada tipo de resíduo, há uma mistura e, logo, uma menor eficiência. O Plano apontou que isso ocorre em 27% dos setores de coleta da capital.O mesmo documento também verificou outras falhas que poderiam ser solucionadas e, logo, reduzir o custo final. Entre elas está a medição da coleta seletiva, já que os resíduos dispostos nos caminhões não são pesados, ocorrendo apenas a estimativa de volume com base na capacidade do veículo. Ou seja, a coleta hoje, que fica em torno de 5,58% do total produzido na capital, pode ser até menor do que isso. O que ocorre também pela presença dos catadores informais, que o Plano de Coleta Seletiva estimou em 555 em Goiânia. Além disso, ainda há o descarte irregular do lixo, o que prejudica o serviço, pois os catadores e os veículos ficam com a obrigação de passar por locais que não haveria essa necessidade. O Plano apontou 109 locais em Goiânia onde a população realiza o despejo de resíduos irregularmente. Serviço pode até gerar rendaO Plano Municipal de Coleta Seletiva, além de mostrar meios de aumentar a eficiência do serviço de limpeza pública em Goiânia, também aponta caminhos para gerar renda a partir do uso, reciclagem ou transformação do que é jogado fora. Na estimativa apontada pelo estudo, caso o serviço conseguisse atingir um potencial de reciclagem de 15% dos resíduos sólidos e 10% da matéria orgânica fosse usada em composteiras, ao final de um ano era possível ter uma renda de até R$ 7,9 milhões, que viria da venda de 20.172 toneladas a R$ 395 cada. Além disso, haveria redução de 37 mil toneladas de resíduos que seriam despejados no Aterro Sanitário. Essa renda, no entanto, pelo modelo adotado hoje seria das cooperativas cadastradas na Comurg. Presidente do Instituto de Desenvolvimento Ambiental, Diógenes Aires, aponta que o modelo correto, no entanto, seria a contratação das cooperativas pelo poder municipal, de modo que as mesmas recebessem pelo serviço ambiental que realizam, o chamado PSA. Isso seria calculado a partir da quantidade de aproveitamento dos resíduos por cada cooperativa. Já o professor do Núcleo de Resíduos Sólidos e Líquidos da Escola de Engenharia Civil e Ambiental (EECA) da Universidade Federal de Goiás (UFG), Eraldo Henriques de Carvalho, aponta que o cálculo é mais complexo. “Vai nas cooperativas e vê o lucro que conseguem. É só o salário do trabalhador. Quem é que vai comprar isso? Tem interesse e por esse preço? Mas teríamos o ganho ambiental, sem dúvida.”Apenas 1,26% é recicladoDe acordo com o Plano Municipal de Coleta Seletiva apresentado em junho deste ano para a Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma), apenas 1,26% de todos os resíduos sólidos produzidos em Goiânia é reciclado. O valor é baseado na quantidade de produção das cooperativas cadastradas pela Companhia de Urbanização de Goiânia, que chegam a gerar 500 toneladas de reciclados por mês, no geral. O documento aponta que a capital teria capacidade de reciclar 28,19% do que sai das casas, com base no estudo feito para o Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB), aprovado em 2020. No estudo dos resíduos realizado no PMSB foi verificado que 52,65% do que é jogado fora na capital é matéria orgânica, que poderia ser utilizado para a compostagem. Além disso, há ainda 15,68% de plásticos e outros 6,7% de papel, produtos mais usados na reciclagem.Comurg quer reduzir volumesA Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg), empresa de economia mista que detém o contrato de prestação de serviço de limpeza urbana com o Paço Municipal, informa que o principal problema para a coleta de resíduos sólidos na capital atualmente é a falta de separação dos materiais recicláveis na fonte geradora, ou seja, pela população. O entendimento da companhia é que é possível aperfeiçoar os processos para reduzir custos na coleta ou conseguir recursos. A primeira mudança seria na logística de coleta e destinação final. A Comurg aposta que com a regionalização da cidade será possível fazer o deslocamento dos caminhões em menor tempo, “isso já economiza com manutenção dos carros, com tempo de deslocamento e com gasto de combustível”. Outro ponto seria a criação de Centrais de Tratamento de Resíduos (CTRs), onde a companhia pretende “reduzir bastante o volume que vai para aterro no primeiro momento”, ou seja, seria possível aumentar a produção de recicláveis, podendo cobrir parte dos custos. “Ressaltamos que a coleta seletiva continua com as cooperativas, não vamos mudar nada, pelo contrário, vamos ampliar programas de educação ambiental para coleta seletiva, o que aumentará a renda das cooperativas”, informa. Nas usinas da Comurg haverá maior aproveitamento dos recicláveis e os resíduos orgânicos para fazer geração de energia a partir do gás e da compostagem, cuja promessa é que será ampliada. “São oportunidades para redução de custos operacionais da companhia”, garante. Taxa não prevê melhorias em sistemaA proposta de criação da Taxa de Limpeza Pública (TLP), enviada à Câmara Municipal no último dia 14, estabelece apenas que o custo com a coleta de resíduos sólidos e demais serviços de limpeza, como varrição, serão arcados pelos proprietários de imóveis na capital, edificados ou não. No entanto, não é citado como o serviço será feito, se haverá melhorias, qual o custo, e nem mesmo a disposição de metas a serem realizadas com a verba destinada pela população da capital. Para o professor do Núcleo de Resíduos Sólidos e Líquidos da Escola de Engenharia Civil e Ambiental (EECA) da Universidade Federal de Goiás (UFG), Eraldo Henriques de Carvalho, se existe apenas uma troca de origem do custeio, não há vantagem, a não ser a transparência de a população saber o valor total da coleta de resíduos. Já o presidente do Instituto de Desenvolvimento Ambiental (IDA), Diógenes Aires, afirma que nem mesmo esta questão da transparência pode ser avaliada a partir do projeto de lei apresentado.“Este dinheiro, pelo o que está no projeto, está indo para o Tesouro Municipal, misturado com os outros recursos, não tem como saber como vão gastar. O correto seria ir para um fundo especial, destinado apenas para este serviço. E também deveriam colocar metas e verificar o que vai ser feito, para onde vai esse dinheiro”, diz Aires. Ele afirma ser a favor da taxa para a manutenção do sistema de coleta de resíduos sólidos, mas é preciso verificar se está tudo funcionando e justificar o valor.O presidente do IDA reforça que é preciso verificar se a TLP possui modicidade, ou seja, se existe capacidade da população pagante de fato o fazer. “Tem de ser acessível e justa (a taxa). Não existe apenas o custo do serviço. Pela resolução da Agência Nacional de Águas (ANA), há ainda o custo da regulação, o custo de contratar as cooperativas e outras coisas. Tudo isso deve ser calculado.” O professor Carvalho concorda que é preciso ter mais transparência e a cobrança deve ser mais clara, de modo que a sociedade possa saber pelo o que está pagando.“O custo hoje é uma caixa-preta. O que eu sei é que, por estudos internacionais, o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) sozinho não sustenta o que precisa para o mínimo. Para melhorar, é preciso um custo de investimento”, diz Carvalho. Segundo eles, o modelo ideal seria que a taxa fosse cobrada por produção de lixo, de modo que fazer a divisão apenas pelo tamanho e localização da casa é injusto. Aires lembra que ele, morador único de uma residência e que realiza a separação dos resíduos e a compostagem de matéria orgânica, vai pagar a mesma taxa de seu vizinho, que não realiza essas ações ambientalmente corretas e mora com outras quatro pessoas.“O correto seria colocar condicionantes. Se a pessoa reutiliza ou recicla teria uma taxa menor, se faz compostagem, teria taxa menor. Do jeito que está não incentiva ações de reaproveitamento dos resíduos, pois a pessoa vai pagar o mesmo tanto fazendo ou não (reciclagem)”, afirma Aires. Para Carvalho, o principal problema da TLP será colocar na prática o modelo adotado e mesmo o valor estimado em R$ 160 milhões anuais não seria caro. “O problema são as discrepâncias, como fazer esta cobrança. Esse é o mais difícil.”-Imagem (1.2289484)