O Ministério Público de Goiás (MPGO) concedeu parecer favorável ao pedido liminar de fornecimento de bomba de insulina pelo plano de Saúde Unimed Goiânia a uma criança de dois anos diagnosticada recentemente com Diabetes Mellitus (DM) tipo 1. O plano de saúde alega que liminar já é cumprida. Na ação, o MPGO informa que a operadora alegou ser “facultativa a disponibilização de medicamento de uso domiciliar” e que não existe uma “cláusula contratual autorizadora de tal providência”, além de entender que o aparelho solicitado configura espécie de “próteses, órteses e seus acessórios não ligados ao ato cirúrgico”.O advogado especialista em Direito Civil e Processo Civil, Lucas Dunck, afirma que situações assim só chegam à Justiça após o pedido no âmbito administrativo ter sido negado pela prestadora de saúde.Recentemente, em setembro deste ano, foi derrubada a decisão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) que estabelecia o chamado “rol taxativo” para procedimentos listados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), desobrigando os planos de saúde a cobrirem os custos de tratamentos que não estejam nesta lista.Dessa maneira, com a publicação da Lei 14.454/2022, as prestadoras de saúde terão o rol da ANS apenas como uma referência básica, cabendo a própria ANS editar novas normas com a amplitude das coberturas, para que outras pessoas que necessitem de tratamentos específicos (e comprovados cientificamente sua eficácia), não precisem ir até a Justiça para garantir os procedimentos. Dunck explica que casos como estes chegam normalmente à instâncias superiores, como o STJ e Supremo Tribunal Federal (STF). Além disso, ele destaca que a posição jurídica favorável do MPGO contribui para conduzir o juizado pelas questões que são de interesse da menina, podendo ser acolhida ou não pelo magistrado. Ele alerta que essa questão perpassa por duas vias jurídicas.“Entra na questão Constitucional, visto que é um tratamento que é necessário para manter a vida da criança e aí estamos falando sobre assegurar o direito à vida e a saúde, que são dispositivos previstos na Constituição Federal. E também passa possivelmente pelo STJ, visto que há uma lei federal (sobre o rol da ANS) que pode estar sendo interpretada de forma equivocada”, diz. O advogado explica que, de certa forma, é benéfico que casos assim tenham sucesso para que haja precedentes favoráveis a outras famílias e pacientes que passam por situação parecida possam se sentir mais confiantes ao entrar com processo no poder judiciário, além de que mobiliza a ANS a incluir outros tratamentos mediante a tantas demandas judiciárias.“Quando isso chega nas instâncias superiores, é sinal de que alguma coisa precisa ser feita”, disse. A fala do advogado vai de encontro com o entendimento do MPGO.Por mais que o órgão considere a bomba de insulina como uma órtese (dispositivo externo aplicado ao corpo), o caso da criança possui peculiaridades, como a descoberta recente da doença - em junho deste ano - após uma crise glicêmica que quase a levou à morte, deixando-a internada em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI).A família da criança reuniu uma série de relatos médicos para o pedido na Justiça. O MPGO chegou à conclusão que a bomba infusora de insulina não é apenas o “tratamento mais indicado, e, sim, o único viável para o controle adequado da doença”. Leia também:- Após MP recomendar saída de OS do Hugo, trabalhadores denunciam atraso salarial e falta de UTIs- MP pede autorização para mulher com câncer de intestino fazer aborto em Goiás- Saúde infantil e diabetesO promotor que assinou o parecer, Pedro Henrique Guimarães Costa, pontuou que a negativa da Unimed Goiânia “representará, em última análise, negativa integral ao resguardo do direito à saúde da autora, deixando-a entregue à própria sorte”. Ao se manifestar favorável à liminar para fornecimento da bomba de insulina, Pedro Guimarães ponderou que a concessão deverá estar sujeita à renovação semestral da receita médica. Doença A endocrinologista pediátrica, Yasmin Eugênia, explica que o DM tipo 1 é uma doença crônica caracterizada por hiperglicemia (aumento dos níveis de glicose no sangue) decorrente de deficiência absoluta de insulina.“Ocorre uma destruição gradativa das células pancreáticas que produzem insulina devido uma falha do sistema imune”, sendo desta forma uma doença autoimune. “As células de defesa vão destruindo as células do pâncreas que produzem insulina até que o diabetes é então manifestado por hiperglicemia. Ocorrem outros sintomas como aumento da diurese, aumento da ingesta de líquidos, aumento da fome e perda de peso”, diz. A especialista diz que estudos demonstram que o tratamento intensivo do DM tipo 1 diminui significativamente suas complicações e sua mortalidade, além da monitorização glicêmica regular. “O sistema de infusão contínua de insulina, conhecido como bomba de insulina, é indicado para a administração de insulina, em ritmos predeterminados e variáveis, para o tratamento de DM em pessoas que necessitam de insulina. Ao utilizar o sensor e o transmissor, a bomba de insulina mostra os valores contínuos do sensor e armazena estes dados para que possam ser analisados de forma a acompanhar padrões e a melhorar o controle das glicemias”, explica. No caso da criança, a bomba de insulina possibilita a redução desses episódios e a segurança de correção da glicemia, oferecendo uma melhora importante da qualidade de vida da paciente. “Esse caso tem indicação de terapia contínua de insulina associada a sensor de glicose para melhora do controle glicêmico, maior segurança no tratamento e menor risco de complicações agudas e crônicas”, destaca. Em resposta ao POPULAR, a Unimed Goiânia informou que a liminar, deferida em agosto deste ano, já está em vigor. Além disso, a prestadora destaca que cumpre rigorosamente todas as normas legais da ANS, dos contratos com seus beneficiários e também as decisões judiciais. Confira a nota na íntegra: A Unimed Goiânia tem, por princípio, seguir rigorosamente todas as normas legais da Agência Nacional de Saúde (ANS) e dos contratos com seus beneficiários, bem como cumpre rigorosamente todas as ordens judiciais. No presente caso, trata-se de uma liminar deferida em agosto e que já é cumprida pela Unimed Goiânia.