PM que moveu corpo em conflito simulado no Jaó não foi preso
Policial do serviço de inteligência estava na ação policial que resultou na morte de dois homens. O nome dele não aparece no registro da ocorrência e a corporação não o informou após pedido do POPULAR. Os outros quatro envolvidos foram detidos sábado
Gabriella Braga
Promotores alegaram que o Código de Processo Penal Militar contraria a Constituição Federal quando classifica homicídios praticados por PMs contra civis como crimes militares. (Wildes Barbosa/O Popular)
Quatro policiais militares do Comando de Operações de Divisas (COD) envolvidos no confronto simulado que resultou em duas mortes no Setor Jaó, em Goiânia, na última segunda-feira (1º), foram presos seis dias após o caso. O quinto policial afastado das funções após ser filmado na ação, que é do serviço de inteligência (PM2), não teve o nome citado no boletim de ocorrência e também não foi detido na ocasião.
Os mandados foram cumpridos na manhã do último sábado (6), pela Delegacia Estadual de Investigação de Homicídios (DIH), em ação conjunta com a Corregedoria de Polícia Militar do Estado de Goiás (PM-GO). Dentre os presos na manhã do último sábado (6), estão o tenente Wandson Reis dos Santos, os dois sargentos Marcos Jordão Francisco Pereira Moreira e Wellington Soares Monteiro, e o soldado Pablo Henrique Siqueira e Silva.
Os três primeiros foram responsáveis pelos 18 disparos que mataram Junio José Aquino Leite, de 40 anos, e Marines Pereira Gonçalves, de 47. Os militares alegaram que houve confronto. Entretanto, imagens registradas pelo aparelho celular de Junio mostram que as duas vítimas não portavam armas e nem tampouco apresentaram reação. Dois policiais também foram filmados implantando armas no local da abordagem.
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Dentre os mandados de prisão, dois foram cumpridos em Goiânia, um em Senador Canedo e outro em Anicuns. A informação foi divulgada pela TV Anhanguera no dia da ação conduzida pela DIH. Após a prisão, todos prestaram depoimento. O inquérito conduzido pela Polícia Civil do Estado de Goiás (PC-GO) corre sob sigilo. Por isso, nenhuma informação sobre o caso foi divulgada pela corporação até o momento.
A Secretaria de Estado da Segurança Pública de Goiás (SSP-GO) disse, em nota, que os quatro policiais presos foram levados ao Presídio Militar, "onde permanecerão à disposição da Justiça". O POPULAR questionou à pasta se o quinto envolvido na abordagem também deve ser preso, e qual a identidade dele. Descaracterizado, o militar também foi afastado das funções após ser filmado na abordagem. Ele faz parte do serviço de inteligência (PM2).
Na gravação da ação policial feita no celular de Junio, o quinto policial foi visto movendo um dos corpos já baleados. Não é possível dizer se era o de Marines, que estava como motorista e foi morto dentro do carro, ou se foi o de Junio. Este último foi alvejado do lado de fora do veículo. Ao ser atingido, o aparelho celular dele caiu no chão, com a câmera voltada para cima, e registrou toda a abordagem.
Após atirarem contra Junio e Marines, dois militares foram filmados manuseando uma pistola e um revólver, e atirando duas vezes cada. Em seguida, os armamentos foram colocados na cena do confronto simulado e apreendidos junto às vítimas. Após todo o tiroteio, o policial do serviço de inteligência aparece na filmagem.
No registro de atendimento integrado (RAI) consta o nome dos quatro envolvidos, os quais foram presos. Todos estavam fardados no momento da ação. O quinto militar não tem o nome divulgado no RAI, nem tampouco pela PM-GO. O POPULAR cobrou à corporação a identidade do quinto policial na última quarta-feira (3), após a mesma informar que cinco militares foram afastados, e voltou a solicitar na última sexta-feira (5). Não houve resposta.
Conforme o boletim de ocorrência feito pelos próprios policiais, foram efetuados nove disparos de carabina calibre 5.56 pelo sargento Wellington Soares Monteiro. Outros sete tiros foram do tenente Wandson Reis dos Santos, com fuzil calibre 7.62. O armamento é o mesmo do sargento Marcos Jordão Francisco Pereira Moreira, que efetuou dois disparos. O soldado Pablo Henrique Siqueira e Silva foi o único que não atirou contra os homens.
O POPULAR apurou que também foram cumpridos seis mandados de busca e apreensão. Os endereços, entretanto, não foram mencionados. Até o fechamento desta matéria, a reportagem também não conseguiu localizar a defesa dos policiais militares presos.
Mortos estiveram no COD antes
No registro de atendimento integrado (RAI) feito logo após a abordagem, na última segunda-feira (1º), no Setor Jaó, em Goiânia, os policiais militares do Comando de Operações de Divisas (COD) relataram que procuravam três indivíduos que estavam se passando por policiais civis para cumprir um falso mandado de prisão contra um outro homem, no intuito de sequestrá-lo para que ele pagasse uma dívida.
Ainda conforme a versão oficial, os três teriam ido atrás do outro homem em uma fazenda em Petrolina. No entanto, como não o encontraram, teriam mantido em cárcere privado outras pessoas que estavam na residência para extorqui-las. Em patrulhamento, a equipe do COD teria, então, avistado um carro semelhante ao informado pela suposta vítima e tentado uma abordagem. Teria sido neste momento que se iniciou o confronto.
O boletim aponta ainda que Junio José Aquino Leite, de 40 anos, morreu ainda no local. Já Marines Pereira Gonçalves, de 47, teria sido levado a uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), e teve óbito registrado na unidade.
O POPULAR mostrou no último sábado (6) que Junio e Marines estiveram na sede do COD, localizada a cerca de 1,5 quilômetro de distância do local onde ocorreu o confronto simulado. Junio atuava como informante de policiais militares e teria ido naquele dia falar com um policial do serviço de inteligência (PM2), que seria o mesmo filmado movendo um dos corpos das vítimas ao lado do veículo.
A informação repassada naquele dia pelo advogado que representa as famílias de Junio e Marines, Walisson Reis, foi registrada por um sistema no celular de Junio, que era acompanhado por um familiar. Conforme o advogado, Junio já imaginava que poderia ser morto. Após o encontro no COD, o homem e o PM2 teriam marcado de se encontrar em outro local. A abordagem ocorreu em frente ao Centro de Treinamento (CT) do Vila Nova Futebol Clube, onde os dois homens foram mortos.
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