Titular da Secretária de Estado Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Andréa Vulcanis explica risco apontado em relatório sobre as condições do lixão de Goiânia, rebate críticas do prefeito Sandro Mabel (UB) à análise dos técnicos e classifica como absurdas as insinuações que o gestor municipal faz em relação a uma suposta “máfia do lixo”. “Me parece que o prefeito está fazendo uma cortina de fumaça, levantando uma série de acusações, inclusive criminosas, contra a secretaria, o que é inadmissível, para continuar operando nessas condições irregulares”, diz. A situação do aterro de Goiânia corre, de fato, algum risco?Nosso relatório aponta uma condição bastante irregular na gestão e manejo dos resíduos sólidos no lixão de Goiânia. É um relatório de que participaram só pessoas da área técnica, analistas e especialistas nesse tipo de atividade. São os mesmos analistas que fazem as análises de licenciamento ambiental e também fazem as análises de pós-licença, ou seja, é uma equipe especializada que conhece operação e manejo de resíduos. Essa equipe, pelo relatório, aponta que, como a gestão foi muito precária e deficitária ao longo dos anos, nesse momento em que as vistorias e análises foram feitas há sim uma questão de risco, uma vez que se desconhecem as condições de manutenção e operação do aterro. A pilha está lá, mas não se conhece sua situação de estabilidade. Não temos acesso a nenhum laudo, a nenhum documento do município até o presente momento, que aponte que o aterro opera em condições de segurança. O que foi verificado é, se nós temos lá a gestão de gases com dutos que estão interrompidos, isso pode ser um problema. Isso foi constatado, foram fotografados esses dutos quebrados, interrompidos, entupidos.O prefeito Sandro Mabel divulgou vídeo nesta segunda-feira questionando alguns pontos do relatório.Viu-se, na vistoria, que o lixo estava descoberto. O próprio prefeito hoje falou que eles esperam encher 5 metros de lixo (para aterrar). É muito tempo que esse lixo fica descoberto e isso gera vetores, doenças, aqueles animais todos. Tem o problema do chorume, em que o município ainda não conseguiu demonstrar que está fazendo gestão adequada. Então, é importante dizer, isso o relatório constatou. Agora, a demonstração de que aquelas condições de operação estão mais bem adequadas, isso até agora não chegou à secretaria, como também não chegou nenhum pedido de licenciamento ambiental. De fato isso nos preocupa, porque a vistoria mostra uma coisa e não temos uma contraprova que diga o contrário.O prefeito também rebate o fato de a Semad chamar o aterro de lixão.É bem importante dizer que para ser considerado aterro sanitário há vários itens técnicos definidos nas normas da ABNT. O relatório basicamente demonstrava que o aterro de Goiânia não cumpre nenhum dos requisitos técnicos. Então é isso que o coloca na condição de lixão, além de não ter licenciamento ambiental.O aterro precisa ir para outro lugar?O que nós queremos é que o lixo de Goiânia seja depositado num local ambientalmente adequado. Queremos isso por dois motivos: um, é que a lei federal atribuiu o prazo para encerramento de lixão até 2024 e há mais de ano Goiânia está descumprindo esse prazo; o segundo motivo é por condições técnicas. Se o aterro tivesse as condições operacionais, a secretaria poderia licenciá-lo e ele continuar operando, mas até o dia de hoje Goiânia não submeteu nenhum pedido de licenciamento. Então não temos condições de avaliar e licenciar esse aterro. Não queremos perseguir ninguém, não somos contra o prefeito, contra o município de Goiânia. Tendo condições técnicas, ele pode continuar no mesmo lugar?Pelas condições de proximidade com residências e com córrego, ele não é um aterro licenciável. Agora, nós estamos em uma fase de transição de modelo. Estamos saindo do modelo atual para um modelo futuro via concessão regionalizada nas microrregiões de saneamento. Se se verificar que está em condição de segurança, que os taludes estão bem mantidos, que não há instabilidade na pilha, que não tem umidade demais dentro daquele resíduo que provoque risco de desmoronamento, então, imaginando que o aterro de Goiânia cumprisse tudo, a gente poderia dar uma licença provisória até a etapa definitiva. Não parece ser o caso, mas é essa a condição. Estar próximo à vizinhança, de fato, é uma condição de operação não adequada, mas em uma fase de transição, já que ele veio assim até hoje, não seria esse o impeditivo. O que mais configura lá é questão técnica geral do aterro para a concessão do licenciamento.O prefeito tem falado muito em máfia do lixo. Há algum indício desse tipo de prática?Eu repudio veementemente essas afirmações do prefeito no que diz respeito à secretaria. Aqui somos um órgão técnico. Eu sou procuradora federal. Jamais, em hipótese alguma, poderia operar em um órgão técnico fazendo o que ele está dizendo, que estaríamos favorecendo aterros privados. Isso é um absurdo! Inclusive, a legislação não fala em aterros privados. Falamos em destinação a aterros licenciados. Então, se o município de Goiânia tivesse licenciamento ambiental, poderia continuar destinando para esse aterro. Me parece que o prefeito está fazendo uma cortina de fumaça, levantando uma série de acusações inclusive criminosas contra a secretaria, o que é inadmissível, para continuar operando nessas condições irregulares, talvez ganhando tempo não sei nem para quê. O fato é que o modelo que ele propõe não existe, não tem previsão na lei. Suas acusações são absolutamente, veementemente, rechaçadas. Trabalhamos com relatórios técnicos e até o dia de hoje não foi apresentado um único documento para contestar as afirmações técnicas de nosso relatório. Não é o caso de transformar isso em uma guerra de mídia, ou guerra jurídica. O que precisamos fazer é proteger o meio ambiente e, sobretudo, cumprir a lei e fazer o que é melhor para Goiânia e Goiás.Quais serão as providências para o aterro de Goiânia a partir de agora?Tinha uma decisão do Tribunal de Justiça que atribuía condição ao município de continuar operando o aterro lá naquelas condições. Foi suspensa a decisão judicial que dava um prazo de 30 dias para o descomissionamento (desativação) e, em razão disso, essa decisão do TJ não deixou claro se a Semad poderia operar com seu poder, sua competência, neste caso. Por fim, essa decisão foi revista na semana passada, atribuindo competência à secretaria e, por conta disso, começamos a adotar as providências. A Semad agora atua como órgão de controle. Comunicamos o município sobre o relatório, aplicamos multa diária ao município para que ele providencie solução adequada e, por fim, chamamos o município a um diálogo, para a construção desse descomissionamento nos prazos, e para assegurar as condições sanitárias adequadas para Goiânia. Não queremos causar problemas à cidade. Queremos é fazer aquilo que tem de ser feito, dentro da ética, de um processo jurídico, no tempo razoável que seja possível assegurar tanto as questões ambientais quanto sanitárias. O município está convidado para uma reunião, para que a gente possa estudar esse modelo de transição. Espero que a gente possa ter um diálogo razoável, inclusive porque, se acontecer um acidente lá no aterro de Goiânia, que Deus o livre, o Estado, se não tomar providência acaba sendo corresponsável, o que é tudo que a gente não quer.Por que vocês decidiram assumir o aterro em Padre Bernardo?Estamos assumindo as ações emergenciais, não toda a gestão. Neste momento, a decisão é fazer aquilo que é essencial, porque já são 12 dias desde o acidente e até agora a empresa não adotou medidas efetivas para resolver o problema mais urgente. É sempre jogando isso mais para frente e estamos muito preocupados com o agravamento da situação ambiental da área. O lixo, aonde ele caiu, interrompeu o curso d’água e fez um barramento. Aquele curso d’água que era bem pequeno está subindo muito. Nossa preocupação é que essa água ultrapasse a pilha que caiu em cima dele e depois comece a levar lixo córrego abaixo. Inclusive, a gente já observou que tem lixo hospitalar no meio. A situação é bastante grave e por isso assumimos os custos para as ações operacionais e emergenciais lá na área.Qual será a ação prioritária?Será feita a drenagem, o bombeamento dessa água represada, para que possa ser reduzida e a gente entre em condição mais segura, para fazer a retirada do lixo do curso d’água. Não podemos correr o risco de chegar com essa situação no período de chuvas. Temos três meses para todas essas ações.