É algum mês de setembro entre 1935 e 1939. No casebre de palha, seu Geraldo acorda ainda alta madrugada. Se apronta à luz da lamparina, fazendo cuidado para não despertar a mulher – gentil como poucos chefes de família da época, sabe que a parceira vai precisar de energia para cuidar dos quatro filhos enquanto ele estiver na obra. O homem esquenta o próprio café, toma tudo quase de um gole acompanhado por um naco da codorna abatida para a ceia da noite anterior. Pigarreia a poeira que insiste em ser inalada em meio ao ar seco, enquanto abre a portinhola de madeira, se equilibra na pinguela sobre o córrego e segue rumo a mais um dia de trabalho. Do outro lado está a obra: Goiânia, a cidade que mal saíra da pedra fundamental, mas pela qual Geraldo tinha sido motivado a deixar a baiana Correntina, movido por uma esperança que só a escassez sabia mensurar. Veio para construir moradia – não a dele, mas a de algum alto funcionário público que viria de Vila Boa num futuro próximo. Sua família se amontoava então num rancho, junto a tantos outros abrigos improvisados, naquela ocupação que não constava dos planos de quem erguia a nova capital. Entre a cidade e a “invasão” havia um córrego, o Botafogo, que ele, como milhares de outros operários, atravessava todo dia em ida e volta.