Até o final deste ano, cerca de 1.490 contratos de funcionários temporários da Universidade Estadual de Goiás (UEG) serão rescindidos. Este número representa 47% da mão de obra da instituição de ensino superior atualmente, entre técnicos e professores. As primeiras rescisões aconteceram no início deste mês, com 190 demitidos. Com um desfalque tão grande, o futuro da UEG é incerto. Enquanto isso, uma segunda comissão estuda um redesenho da instituição, que na prática será o fechamento de cursos e câmpus, e um parecer jurídico é aguardado para se iniciar o processo eleitoral para o cargo de reitor.Deste total de contratos que serão rescindidos, cerca de 700 são de professores e 790 de técnicos administrativos. Esta demissão em massa obedece a uma decisão judicial de março deste ano, que ordena a contratação de candidatos aprovados no último concurso e a realização de novos certames. A decisão estipula um limite de funcionários temporários, que é de 20% para técnicos e 33% para docentes.Atualmente, mais da metade dos servidores da UEG são temporários. Este excesso de temporários na instituição é um problema antigo, que já foi discutido em outros momentos. Em 2014, por exemplo, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) fez uma série de recomendações para diminuir este tipo de contratação. Na época, os temporários representavam mais de 70% da folha de pagamento da universidade (veja quadro).Esta situação irregular, que vem desde a fundação da universidade, em 1999, se explica em parte pelo custo menor dos temporários. O custo médio de um trabalhador efetivo na instituição é de R$ 10,8 mil, já de um temporário é R$ 2,7 mil. Apesar de serem menos de 50% do total de servidores, os efetivos representam 74% do valor total da folha de pagamento da UEG, que no último mês foi de cerca de R$ 20,7 milhões.Com este contexto, acabaram sendo criadas situações de trabalhadores que estão há muitos anos na instituição, com um contrato precário, que foi sendo renovado automaticamente ao longo do tempo. A saída repentina destes funcionários produz um impacto não só na universidade, que está acostumada com esta mão de obra, mas também na vida de cada uma dessas pessoas, que já tinha como certo o emprego. Organizados pelas redes sociais, alguns desses temporários dizem que pretendem entrar na Justiça para tentar se tornar efetivo ou pelo menos receber o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).A primeira lista de demitidos saiu neste mês. Inicialmente foi publicada uma portaria com a rescisão de 235 contratos temporários em agosto. No entanto, alguns desses contratos eram de servidores que já haviam pedido remoção ou tido o contrato encerrado em junho. Por isso, uma nova portaria com 190 nomes foi publicada. Segundo a UEG, ainda está sendo elaborado um cronograma de desligamento dos outros servidores.EfeitosEsses contratos rescindidos já estão sendo sentidos pela comunidade acadêmica. No câmpus de Uruaçu, por exemplo, o funcionamento da biblioteca está comprometido e ela passou a ser fechada no período vespertino, por falta de servidor. Já na Escola Superior de Educação Física e Fisioterapia do Estado de Goiás (Eseffego), em Goiânia, um servidor da área administrativa teve de ser deslocado para ficar na portaria.Ainda de acordo com a UEG, também está sendo elaborado o planejamento para a realização de novos concursos para docentes e técnicos, convocação do cadastro de reserva do último concurso e realização de novos processos seletivos simplificados. Além disso, os serviços da limpeza devem ser terceirizados. A instituição, no entanto, não respondeu ao questionamento da reportagem sobre a quantidade de novos contratados efetivos.Em entrevista ao POPULAR em abril deste ano, o reitor interino da UEG, Ivano Devilla, disse que achava improvável que temporários conseguissem se tornar efetivos via Judiciário. “Eu não tenho distinção entre professor efetivo e temporário. Professor é professor. Cumpre todos os papéis na Educação. Mas todo mundo sabia que o temporário tinha um certo período de trabalho na instituição”, disse. Semestre antecipado A rescisão de cerca de 1.490 contratos de funcionários temporários da Universidade Estadual de Goiás (UEG) vai afetar as aulas do segundo semestre deste ano. Uma circular interna enviada aos câmpus no final do mês passado orienta a antecipação do término do ano letivo para 30 de novembro. A motivação, diz o documento, é “o desligamento de servidores com contrato temporário expirado por força das determinações judiciais e administrativas em que a UEG está submetida a cumprir.”Para isso, foram enumeradas orientações aos servidores: dar aulas aos sábados; suspender eventos de atividade extracurricular; suspender as semanas dos cursos; suspender eventuais períodos de recessos; utilizar de atividades extra-classe. Ainda segundo a circular, os recessos administrativos dos dias 16 de novembro, dos dias 24, 25 e 26 de outubro, também estão suspensos. “A gente carregou a UEG até aqui”Os mais de 1.600 servidores de contrato temporário da Universidade Estadual de Goiás (UEG) vivem o temor de ser demitidos e os que já foram na primeira leva, neste mês, passam a ter de lidar com a realidade do desemprego. Temporários que já estavam havia anos na instituição de ensino superior alimentavam a ilusão de que seus contratos continuariam a ser renovados automaticamente e, de certa maneira, já se sentiam como efetivos. “A gente carregou a UEG até aqui”, lamenta uma servidora temporária há 18 anos da Escola Superior de Educação Física e Fisioterapia do Estado de Goiás (Eseffego), uma das unidades da universidade na capital. Ela conta saudosa de como colaborou, com outros colegas, no desenvolvimento da instituição, quando se organizaram para conseguir livros novos e equipamentos de ar-condicionado. “Estamos presos, não sabemos para que lado vai”, diz a servidora, que também lamenta a falta de informação sobre a data exata em que cada contrata será rescindido, aumentando a sensação de incerteza. A técnica-administrativa Fernanda (nome fictício), de 40 anos, que prefere não se identificar, foi um dos temporários demitidos neste mês de um câmpus da UEG em Goiânia. Ela recorda que no dia 1º de agosto trabalhou o dia inteiro e no final da tarde recebeu uma ligação informando que ela não precisava retornar a sua função no dia seguinte. Apesar da decisão judicial de março, a notícia surpreendeu a trabalhadora, que trabalhava havia 14 anos como temporária. “Foi um choque, para quem estava há tanto tempo trabalhando. Fiquei sabendo pela boca do povo, não achei que ia ser tão rápido”, relata Fernanda. Ela conta que desde que recebeu a notícia da rescisão do contrato passou a procurar por emprego, mas que ainda não encontrou. “Não está fácil”, diz. Com o salário de temporária pagava as contas de casa e o empréstimo do programa do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies), que usou para cursar a faculdade de Enfermagem. FuturoA situação de Fernanda é parecida com a da bibliotecária Zilene Maia, de 74 anos, que trabalhou por mais de dez anos na biblioteca da Eseffego, em Goiânia, e foi demitida neste mês. Como o contrato é temporário, ela não recebe direitos trabalhistas. “A gente sai com uma mão atrás e outra na frente”, lamenta. Ela se lembra que quando entrou na UEG passou por um processo seletivo simplificado e que a previsão era de um contrato de poucos anos, mas que com o passar do tempo ele ia sendo renovado automaticamente. Agora, precisa adequar sua vida a uma nova realidade, uma das maiores preocupações é o plano de saúde. “Ainda não fiz planos. A gente fica um pouco de cabeça para baixo, falta de teto. Até porque a gente fica sem plano de saúde. Desarma a gente. Vamos ver o que vai acontecer.” Nova eleição e diminuição ainda em discussãoA eleição de reitor e o fechamento de cursos da Universidade Estadual de Goiás (UEG) ainda não estão totalmente definidos. A instituição aguarda um posicionamento jurídico para dar início ao processo eleitoral e uma comissão elabora um relatório de redesenho institucional. Uma primeira comissão havia feito um relatório que indicava o fechamento de 57 cursos e 15 câmpus, que representam um terço da instituição. Entre os critérios para descontinuidade estava o desempenho acadêmico e uma quantidade excessiva do mesmo tipo de curso. No entanto, o Conselho Superior Universitário (CsU) não aprovou o relatório. A principal crítica era que essa primeira comissão era formada apenas por gestores. Uma nova comissão foi organizada, que deve definir critérios para a descontinuidade de cursos e apresentar um novo relatório no CsU. Já sobre a eleição de reitor, foi publicado um parecer da Procuradoria Setorial de Desenvolvimento que deve ser analisado pela Procuradoria Geral do Estado (PGE). Só depois deste trâmite burocrático é que a universidade vai dar início ao processo eleitoral. Atualmente a UEG é comandada por um reitor interino: Ivano Devilla. O anterior, Haroldo Reimer, pediu afastamento após a divulgação de denúncias de irregularidades em sua gestão.-Imagem (1.1866760)