As mulheres sempre tiveram mais dificuldade que os homens para chegar a cargos de liderança em empresas públicas e privadas, mas em momentos de crise isso fica ainda mais evidente, pois o mercado tende a ficar mais segregador. Em 2019, elas ocupavam 33% dos cargos gerenciais, participação que chegou a 38% em 2012, segundo o estudo Estatísticas de Gênero - Indicadores Sociais das Mulheres no Brasil, divulgado ontem pelo IBGE. O estudo também mostrou que, apesar de terem uma escolaridade maior, elas tiveram em média um rendimento de R$ 560 a menos.As mulheres também têm mais dificuldade para conseguir um emprego que os homens. Em 2019, a taxa de desocupação entre as mulheres era de 12,9%, 4,1 pontos porcentuais maior que a masculina, que estava em 8,8%.O superintendente do IBGE em Goiás, Edson Roberto Vieira, lembra que as mulheres vinham conquistando melhorias no mercado de trabalho. Mas, em momentos de maior desemprego, quando cresce a competitividade, elas perdem mais que os homens. “Neste períodos, a taxa de desemprego aumenta mais para elas, além de afetar mais os negros que os brancos.”Em 2019, a taxa de desocupação entre as mulheres negras era de 15%. Para a coordenadora nacional do Movimento Negro Unificado, Iêda Leal, o distanciamento entre mulheres brancas e negras é permanente, mas nestes momentos de crise, estas mazelas ficam mais evidentes, pois aumenta a segregação. Segundo ela, é ainda mais difícil para uma negra ocupar um cargo de liderança, pois o racismo é estruturante, ou seja, a estrutura está corrompida. “Isso deve servir de alerta para a necessidade dos governos investirem em políticas públicas que corrijam estas distorções históricas e reduzam a distância de acesso ao mundo do trabalho.”Para a mentora de Gestão de Carreiras e diretora da Apoio Consultoria de Negócios, Dilze Percílio, o fato de o mundo corporativo ser ainda muito masculino colabora para que as mulheres tenham menos cargos de liderança. “A tendência de quem está em postos de direção é contratar mais quem seja igual a ele para se sentir confortável”, avalia. Com mais homens em cargos gerenciais, a média salarial deles fica maior.Como muitas empresas não têm política de cargos e salários, os homens também acabam sendo mais agressivos na hora de negociar seus rendimentos e há uma ideia de que eles precisam ganhar mais por sustentarem a casa, o que nem sempre é real. “A participação da mulher no mercado também é a mais sacrificada quando alguém precisa ficar em casa para cuidar dos filhos, de um idoso ou de um doente”, lembra. Além disso, na hora de contratar, muita gente ainda considera o fato de a mulher engravidar e ter que dedicar mais tempo aos filhos.A publicitária Paula Medrado, diretora de Relacionamento da Crool Centro Odontológico, casada e mãe de dois filhos pequenos, conseguiu driblar estas barreiras e hoje ajuda a gerenciar uma equipe de 210 funcionários. Na empresa, são 12 mulheres e 2 homens ocupando cargos gerenciais. Sobre as mulheres, pesam mais exigências e expectativas, diz. “Tudo na mulher é potencializado. Ela engravida, cuida dos filhos e da casa, dá atenção ao marido e quer ser bem sucedida. Por tudo isso, precisa se esforçar bem mais para ocupar um cargo gerencial”, argumenta. Mas, ainda assim, ela acredita que as mulheres têm maior capacidade para extrair o melhor de sua equipe.Só 14,5% foram eleitas vereadoras em 2020, apesar da lei de cotasCom a Lei 12.034, de 2009, as cotas eleitorais que reservam um porcentual de candidaturas em eleições proporcionais para as mulheres tornaram-se obrigatórias: no mínimo 30% e no máximo 70% para cada sexo, por partido ou coligação. Em 2018, 32,2% das candidaturas para deputado federal foram de mulheres, contra 31,8%, em 2014. Porém, o número cai bastante no total de eleitos: em 2020, só 14,5% dos 2.338 vereadores eleitos em Goiás eram mulheres. Segundo estudos eleitorais, uma das causas é a falta de apoio material às candidaturas femininas, inclusive no âmbito dos partidos políticos, além do maior sucesso dos candidatos que já eram parlamentares. Para o cientista político Itami Campos, esta também é uma questão estrutural do machismo. Ele lembra que as lideranças partidárias são controladas, basicamente, por homens, que dominam estas estruturas.“Com a exigência de um número mínimo de mulheres, eles usam até laranjas e elas acabam sem muitas chances”, comenta.E isso é mais visível no Brasil. Basta lembrar que a primeira ministra da Alemanha, Angela Merkel, já está há 15 anos no poder. Itami observa que entre os períodos de ditadura e abertura política na década de 80 nenhuma mulher foi eleita deputada em Goiás, um atraso na perspectiva de acesso delas ao Legislativo por causa do machismo e do autoritarismo.