As ações sociais de transferência de renda direta e indireta que ocorrerão nos municípios do Estado para enfrentamento aos reflexos da pandemia do novo coronavírus devem, prioritariamente, considerar os contextos regionais econômicos, especialmente o estoque de empregos formais e a dimensão do mercado informal, além dos contextos regionais demográficos. Esse é um dos apontamentos de relatório produzido por profissionais da área do desenvolvimento regional ligados ao Instituto de Estudos Socioambientais, da Universidade Federal de Goiás (IESA/UFG).O estudo aponta, por exemplo, que o fato de municípios de menor peso demográfico concentrarem proporcionalmente o maior número de idosos, pode não significar que estes locais terão mais demandas de renda. Isso porque, segundo o levantamento, a cobertura da aposentadoria rural ou do Benefício de Prestação Continuada (BPC), além da massa salarial proporcional da administração pública, “podem suprir as necessidades básicas”.Em todo o Estado, conforme o relatório, há 155.595 pessoas que recebem o BPC, sendo 45,5% idosos. A aposentadoria rural, por sua vez, contempla pouco mais de 291 mil goianos. Já a maior participação da administração pública no emprego formal se concentra em municípios com quantitativo reduzido de habitantes, a exemplo de Guarinos, Anhanguera e Teresina de Goiás, com 89,6%, 86,6% e 85,5%, respectivamente.Os dois primeiros possuem população abaixo de 2 mil pessoas, e o terceiro, 3,4 mil, segundo estimativa de 2019 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Conforme o relatório, dos 1.507.648 empregos formais registrados em Goiás, em 2018, 31% foram gerados no setor de serviços, 19,5% no setor de comércio e 22% na administração pública.Do ponto de vista da renda e emprego formal privado, o estudo aponta que o maior impacto com a atual crise, será no comércio e nos serviços, que se concentram nas áreas de maior urbanização do Estado.Os profissionais do IESA pontuam no relatório ser necessária a preservação do emprego formal público, especialmente nos municípios de menor peso demográfico, além de construir meios de financiamento da produção para garantir os empregos formais, especialmente no eixo de urbanização, concentrador da economia de serviços. Defendem ainda que, ao mesmo tempo, também “na região core da urbanização”, seja implementada políticas de transferência de renda focalizadas naqueles indivíduos que dependem de ganhos do mercado informal.AgilidadePara superar “os desafios da crise generalizada que atinge, de diferentes modos, a totalidade da população brasileira”, o estudo defende ser necessária uma ação conjunta e articulada entre União, Estados e municípios, destacando que as políticas de transferência de renda (direta e indireta) são instrumentos eficazes, “se focados nos grupos e espaços mais vulneráveis, e com a agilidade necessária, para amortecer os efeitos da crise”.Ante as ações governamentais nesse sentido já colocadas em prática, a exemplo do auxílio emergencial que prevê três parcelas de R$ 600 para grupo que, entre os requisitos, tenha renda familiar total de até três salários mínimos, o professor de geografia do IESA Tadeu Alencar Arrais avalia que, como medida emergencial, ela chega com atraso e é “insuficiente”.Pesquisador na área de desenvolvimento regional, Arrais é um dos coordenadores do estudo “Pandemia covid-19: O caráter emergencial das transferências de renda direta e indireta para a população vulnerável do Estado de Goiás”. Ele aponta que se o objetivo da ação é restituir parte da renda, tem que ser considerada as diferenças no fluxo de renda da população.Ele exemplifica que, se observar as metrópoles, a composição de renda no mercado formal é maior em setores de serviços e comércio, enquanto há cidades menores com maior participação do serviço público nesse perfil de renda. “Se a composição é diferente, o nível de impacto dessa crise será diferente.” Além disso, cita que são nas grandes cidades que se tem os “os bolsões de informalidade”.A partir dos diferentes aspectos, destaca a necessidade de estratégia de recomposição de renda de acordo com as características de cada território. Como exemplo o pesquisador aponta a Região do Entorno do Distrito Federal (DF), com população jovem, baixo nível de emprego formal, e ao lado de uma região que tem “número excessivo de pessoas infectadas” pelo coronavírus: o DF. Até às 16 horas de sexta-feira (10), dados da Secretaria de Saúde do DF apontavam haver 556 casos confirmados de Covid-19 por lá, com o registro de 14 óbitos.É também a região do Entorno do DF que concentra a maior fatia da população de Goiás na extrema pobreza, o equivalente a 70,21% do total de 233.761 classificados nesse nível de renda, segundo mostra o estudo da IESA/UFG. “Não é possível que em Águas Lindas, uma pessoa receba R$ 600, muitas vezes sem acesso sequer a água e saneamento”, exemplifica.Entre as estratégias apresentadas pelo grupo de pesquisadores está aumentar o valor do Bolsa Família, com valores diversos a depender do perfil do município (veja quadro), mas não inferior a R$ 600 até janeiro de 2021. “O dilema dos pobres é muito tenso. Ou fica em casa e passa fome, ou sai para trabalhar e arrisca?”PrefeiturasPor outro lado, Arrais frisa que a maior proporção dos custos de transporte, mercado informal e pessoas em situação de vulnerabilidade nas ruas está na região metropolitana. O que deveria ser considerado nessa tentativa de recompor renda. Além disso, ele pontua que poderiam ser transferidos recursos para Estados e municípios repassarem para os mais vulneráveis. “Quem conhece melhor quem está extremamente vulnerável? A assistência social da prefeitura”, exemplifica.Segundo ele, esse meio é a saída para que a ajuda chegue à aqueles que sequer têm aparelho celular para baixar um aplicativo, como exigido pelo programa do governo federal para quem não estava registrado no Cadastro Único do governo federal (CadÚnico). “O município é quem conhece, sabe onde estão. Tudo isso poupa tempo. É um momento de urgência.”Segundo Arrais, o relatório com as propostas foi enviado ao governo estadual. O estudo, além de profissionais do IESA, contou com a participação de outras escolas da UFG, de professor do Instituto Federal Goiano (IFGoiano), da Universidade Estadual de Goiás (UEG) e teve a colaboração de pesquisadores da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg), do Departamento de Geociências da Universidade Federal de Juiz de Fora (DEPGEO/UFJF) e do Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp).-Imagem (1.2037680)