Burocracia, juros altos e a exigênncia de garantias têm dificultado o acesso do setor empresarial goiano aos recursos do Fundo Constitucional do Centro-Oeste (FCO). Goiás é líder na captação de verbas do fundo, criado para reduzir as desigualdades regionais e impulsionar o desenvolvimento econômico e social, mediante financiamento ao setor produtivo, com prioridade para mini e pequenos produtores rurais, microempreendedores individuais e micro e pequenas empresas. Mas a maior parte dos empréstimos é captada por projetos do setor rural e grandes empresas.Em 2021, dos R$ 10,3 bilhões destinados pelo FCO ao Centro-Oeste, R$ 3,5 bilhões vieram para Goiás. Deste total, R$ 2,7 bilhões ou 77% foram captados pelo setor rural e apenas R$ 748,8 milhões financiaram projetos empresariais, que abrangem comércio, indústria, serviços, turismo e infraestrutura. O maior fator de desestímulo são os juros elevados. O problema começou após uma mudança no governo Michel Temer, que alterou a fórmula de cálculo das taxas, que eram pós fixadas e subiam ao longo do contrato. Recente resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) do Banco Central possibilitou a escolha entre taxas pré ou pós-fixada no FCO Empresarial, que podem ficar travadas durante a operação. Mas como o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) médio dos últimos 12 meses relativos ao acordo é levado em consideração como base para o cálculo das taxas, a alta inflação deixa os juros elevados: até 17% ao ano para grandes empresas. O secretário da Retomada, César Moura, que preside o Conselho de Desenvolvimento do Estado (CDE/FCO), confirma que a dificuldade persiste porque a taxa hoje é vinculada ao índice de inflação pelo IPCA, que está muito elevado. “A vantagem das grandes empresas, que têm apuração do lucro real, é o desconto dos juros no Imposto de Renda, que pode ser jogado como despesa”, ressalta. Hoje a situação é mais preocupante para os pequenos, que pagam taxas de até 14% ao ano, resultado de uma fórmula complexa. Ele explica que o estado tem atuado junto a sua bancada para pressionar o CMN a fazer uma nova mudança na fórmula de cálculo dos juros. “Mas o Centro-Oeste está isolado desta vez porque o fator de localização contido na fórmula eleva mais os juros aqui”, explica. A grande maioria das operações é feita pelo Banco do Brasil, também considerado muito rigoroso na análise de crédito.Para César Moura, outro fator que limita o acesso dos empresários são as garantias exigidas, na média, de 1.3 do valor do empréstimo, mas que podem chegar a duas vezes o valor da operação. Além disso, a avaliação fica abaixo do valor de mercado. “No FCO Rural, isso fica mais fácil porque a garantia geralmente é a propriedade, que tem valor bem mais alto que o valor da operação. No Empresarial, o risco é maior e a burocracia também”, destacou o secretário. Também é preciso apresentar projeto de viabilidade econômica para grandes operações, que pode ser feito por uma empresa particular ou pelo próprio banco, mediante uma taxa. Projetos com contrapartida social das empresas costumam ter prioridade na análise. DescontentamentoPara o presidente da Associação Comercial, Industrial e de Serviços do Estado (Acieg), Rubens Fileti, o maior motivo de descontentamento é o juro para o FCO Empresarial. “Conseguimos equalizar as taxas do FCO Rural e Empresarial, mas esqueceram do coeficiente e o juro chega aos 17% para médias e grandes empresas, o que é inviável”, ressalta. Na reunião do CDE realizada em 17 de maio, todas as cartas consulta empresariais em análise foram retiradas em protesto contra os altos juros. Ontem, elas voltaram a ser apreciadas em nova reunião.Rubens Fileti também critica a grande centralização dos recursos pelo Banco do Brasil, muito rigoroso nas análises de crédito. “Um problema relatado pelos empresários é que, quando a pessoa já teve alguma restrição antiga junto ao banco, mesmo que ela já tenha sido resolvida, o financiamento do FCO não é liberado. Mesmo que você já tenha pago tudo, fica restrito pra sempre”, conta. Segundo ele, já existem até advogados especialistas nesta contestação.Outro problema é a demora na liberação das cartas consulta entregues à instituição. “Na última reunião, tinha uma carta que estava parada desde 2017”, informa. Em Goiás, o Banco Sicredi também atua junto ao FCO e, segundo Rubens, tem sido mais rápido nas análises e liberação dos empréstimos. Mas a cooperativa de crédito responde por parcela pequena das operações. “É preciso que mais bancos entrem nesta disputa, pois as empresas que aguardam estão deixando de investir e gerar empregos e renda”, alerta o presidente da Acieg.Bancada goiana se mobiliza pela mudança no cálculo dos jurosA mudança na metodologia de cálculo dos juros do FCO Empresarial depende de resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) do Banco Central, assim como ocorreu recentemente na medida que permitiu que a taxa de juros pudesse ser pré-fixada ou pós-fixada. Representantes da bancada goiana garantem que estão mobilizados para conseguir uma nova mudança nos indexadores que estão elevando os juros. O senador Vanderlan Cardoso (PSD), que coordenou as discussões para a conclusão do último acordo feito com o Banco Central, acredita que a possibilidade de opção pelo pré-fixado foi um grande avanço, pois as parcelas chegavam a dobrar no pós-fixado. Mas taxas para as empresas ainda não chegaram a ter a paridade almejada com FCO Rural por conta dos muitos indexadores colocados na composição dos juros e que ninguém consegue decifrar. A fórmula considera fatores como inflação, coeficiente de desequilíbrio regional e fator de localização. “Contratamos uma consultoria especializada para destrinchar tudo isso para levarmos o que precisa ser mudado ao Banco Central”, informa o senador. Segundo ele, a bancada deve ter um novo encontro com os presidentes da do CMN e da própria autarquia. “Da forma como está, ficou diferente do que foi acordado, pois os juros continuam altos demais. Vamos discutir o que foi desvirtuado do acordo feito inicialmente”, avisa. Vanderlan informa que representantes das bancadas das regiões Norte e Nordeste também devem participar, pois estes estados também estão sendo prejudicados. O deputado federal José Mário Schreiner (MDB) também concorda que, da forma como ficou, a mudança proporcionada pela última resolução não resolveu o problema dos juros altos e não compatíveis com a atividade produtiva. Por isso, a bancada goiana deve continuar pressionando para que isso seja equalizado. “O FCO existe para corrigir desigualdades regionais e esta metodologia atual de cálculos dos juros não contribui para isso”, avalia o deputado. O objetivo da bancada goiana, segundo ele, é que o sistema volte a ter taxas reduzidas. “É preciso uma articulação política para pressionar o CMN pela necessidade de simplificar esta fórmula complexa”, alerta.-Imagem (1.2463524)