O escândalo sobre o rombo de cerca de R$ 43 bilhões nos balanços das Lojas Americanas, que resultou no pedido de recuperação judicial da empresa e numa grande desconfiança do mercado financeiro em relação à marca, reforça a discussão em torno da importância da saúde das empresas. Uma das principais perguntas feitas nas últimas semanas foi como a situação chegou a este ponto sem que nenhuma providência fosse tomada. Os problemas não surgem da noite para o dia e sempre existem sinais, mesmo que não sejam visíveis a todos.O caso das Americanas foi mais complicado porque as demonstrações financeiras estavam distorcidas, pois a varejista pagava fornecedores por meio de uma triangulação com bancos, mas os pagamentos não foram devidamente dimensionados e realizados. Mas dificuldades financeiras surgem em negócios de todos os portes e não podem ser ignoradas, por isso é preciso estar atento aos sintomas desde o início.Para o especialista em reestruturação de empresas e sócio da Ática Gestão, Arthur Bueno, o primeiro sinal de que um negócio não está saudável é o atraso do pagamento de despesas correntes, como fornecedores e impostos. Um dos motivos é o descasamento do fluxo de caixa, ou seja, quando o cliente paga a empresa num prazo longo e as contas vencem num período menor. “Qualquer atraso nos pagamentos já deve acender uma luza amarela”, destaca.Segundo Arthur, a preocupação aumenta se a empresa começa a pegar empréstimos para honrar os pagamentos, pois o endividamento é outro sinal importante. Foi o que aconteceu com a rede Americanas, que pegava dinheiro no mercado para saldar suas dívidas. A obtenção de empréstimos e outras formas de crédito, como antecipação de recebíveis, demonstra que a situação não está boa e precisa ser contornada em breve. “Antes de buscar este recurso, é preciso avaliar os motivos da necessidade dele. O empréstimo bom é para investimento que gere retorno, não para pagar contas correntes”, alerta.Queda nas vendasA simples necessidade do empréstimo já indica que alguma coisa na operação não está correndo bem. Geralmente, os problemas começam com uma queda nas vendas, que pode ser repentina ou não. Arthur Bueno alerta que isso é sinal de que o cliente pode estar insatisfeito. Neste caso é preciso analisar se a qualidade do produto caiu e se existem outros motivos para os clientes não estarem voltando.Leia também:- Americanas pagou o dobro em dividendos que seus principais concorrentes- Criptomoedas serão reguladasPara o gestor comercial e também especialista em reestruturação de empresas, Rafael Cássio de Aquino, a falta de gestão e controle geralmente resultam numa demora para detectar os problemas na empresa. Isso acontece porque, muitas vezes, o negócio não tem um volume adequado de indicadores, o que leva a tomar decisões erradas, baseadas em sentimentos, e a mais perda no faturamento. “Muitos empresários também entram em negação e ficam procurando motivos do problema apenas em fatores externos, como o governo ou uma crise econômica”, adverte Rafael.Ele lembra que esta falta de indicadores sobre o desempenho do negócio e o hábito de conduzir a empresa da mesma forma há muitos anos dificultam a visualização dos problemas de forma mais prática. Mas é importante ver que a competitividade do mercado cresceu e é preciso estar atento às mudanças. “É preciso olhar para seu concorrente, as inovações e novas ferramentas disponíveis no mercado e as mudanças no comportamento do cliente”, alerta o especialista. Muitas vezes, a forma de conduzir o negócio precisa mudar.O especialista contábil do NWGroup, Fabio Garcez, reforça que o principal indicador de que uma empresa não está bem continua sendo o lucro. Resultados negativos persistentes, principalmente quando não há investimentos ou situações sazonais do setor que justifiquem isso, sinalizam que há problemas para a empresa se manter competitiva e com fôlego para se recuperar desse cenário negativo.“No caso das Americanas, um dos sinais que chama atenção é a queda no valor das ações nos últimos anos levando a empresa a desvalorização e culminando nas divergências que só agora vieram a tona”, destaca Garcez. Para ele, provavelmente executivos da empresa já sabiam que existiam problemas nos resultados apresentados e optaram por medidas protelatórias para demonstração dos resultados negativos.AcompanhamentoRafael Cássio alerta que, muitas vezes, quando o problema é detectado, a empresa já perdeu market share e tem muita dificuldade para retomar sua participação de mercado. Para evitar que as dificuldades culminem num pedido de recuperação financeira ou até em falência, gestores e acionistas precisam acompanhar bem de perto os indicadores, ou seja, as demonstrações financeiras da empresa.Arthur Bueno lembra que o investidor pode acompanhar o balanço patrimonial e a evolução dos ativos e passivos, além de analisar o desempenho operacional, o Ebtida. Se ele está negativo, a empresa não está gerando receita suficiente, e há um aumento do passivo, é sinal de alerta. Ficar de olho no desempenho financeiro e no fluxo de caixa é essencial. “Quem é acionista, também é dono do negócio e precisa ficar atento. As empresas de capital aberto são obrigadas a divulgar estes indicadores”, completa.-Imagem (1.2601042)