A multiplicação de colégios militares em Goiás é uma tendência que parece não ter fim. Além das 36 unidades em funcionamento no Estado, existem outras 35 com leis de criação já aprovadas, aguardando a implantação e 33 novos pedidos já foram formalizados no gabinete do governador Marconi Perillo (PSDB). Hoje, o número corresponde a 3,1% de todas as escolas da rede estadual de educação e, com a efetivação das que já foram aprovadas, o porcentual será de 6,2%, com possibilidade de aumento diante da recorrência de novas solicitações.O governo do Estado informou à reportagem, via assessoria de comunicação, que essa tem sido, hoje, a principal demanda apresentada por prefeitos, vereadores e deputados que representam cidades do interior. Originalmente, o projeto de escola militar surgiu a partir da necessidade de atender filhos e dependentes de policiais (veja quadro abaixo). Com o tempo, a adaptação de colégios estaduais para o perfil militar e os bons resultados atingidos em exames que avaliam o desempenho dos estudantes, deu-se início à proliferação.Comandante de Ensino da Polícia Militar, o coronel Anésio Barbosa destaca que o principal entrave para a implantação das novas unidades é a dificuldade de atrair policiais da reserva para ocupar os cargos de gestão dos colégios. “A sistemática adotada para a convocação de policiais da reserva remunerada através das funções comissionadas de administração educacional militar não tem atraído um número suficiente de interessados para retorno ao serviço ativo”, conta. Entre as unidades que já poderiam ter sido implantadas, existem casos que esperam desde 2013, quando as leis de criação foram aprovadas.Os exemplos mais avançados, segundo Anésio, e que devem ser estruturados até o final deste ano são as unidades de Morrinhos e Goianira. O trâmite para a criação de um colégio militar tem se iniciado de forma diversa, com pedidos sendo levados adiante em diferentes locais. Além dos casos com leis prontas e dos pedidos formalizados no gabinete da governadoria, existem ainda três projetos na Assembleia Legislativa, referentes à implantação de mais dois colégios em Goiânia, onde já existem oito unidades militares, e um em Luziânia, no Entorno do Distrito Federal.A criação de novos ou a adaptação de colégios já existentes para o perfil militar tem se fundamentado, conforme Anésio, numa demanda da sociedade. A presidente do Conselho Estadual de Educação, Ester Carvalho, acrescenta ainda um outro fator, que é o compromisso de gestores municipais feito com as comunidades de levar às cidades um colégio da Polícia Militar. Ou seja, em alguns casos, virou promessa de campanha. Não à toa, todos os 33 pedidos formalizados na governadoria foram feitos por políticos, sendo que 20 foram feitos ou por prefeitos ou por vereadores do município.Na gênese do projeto, conforme arquivo enviado à reportagem pelo coronel Anésio, consta que o segredo de sucesso dos colégios militares é a participação efetiva de todos os envolvidos no projeto, incluindo pais, professores, alunos e gestores da unidade. Rigidez, obrigações e disciplina à parte, características de um colégio militar, a discussão é polêmica e tem gerado debate no meio educacional. “Além do aspecto político, há uma convicção social de que o ensino nas escolas militares oferece educação de qualidade. Considero que outro fator preponderante é o de que as famílias querem transferir às escolas a responsabilidade de educar e impor limites”, aponta Ester.A coordenadora do Centro de Apoio Operacional (CAO) da Educação do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), promotora Liana Antunes Tormin, avalia que, apesar dos bons resultados e do trabalho desenvolvido, os colégios militares configuram modalidade de exceção e que não devem, portanto, ser regra na educação básica ou serem vistos como única alternativa para a melhoria da qualidade do ensino. “O ideal é que o poder público ofereça uma educação de qualidade se utilizando de quadro de servidores, metodologia e projeto político pedagógico consentâneos com as diretrizes nacionais da educação”, pondera. A implantação de um colégio militar, informa o coronel Anésio, é feita a partir da junção da equipe de policiais e de servidores da Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esporte (Seduce).A presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego) e especialista em Educação Brasileira, Bia de Lima, critica o foco e o esforço concentrados em colégios militares. “Escola militar virou moda. O povo acha bonitinho usar o uniforme e não se preocupar com as demais escolas. Temos de preocupar com todas. Não podemos ter só uma ou outra escola boa, mas todas. E para isso temos de ter professores e não policiais lá dentro.”Associação Goiana de Municípios defende modelo O presidente da Associação Goiana de Municípios (AGM) e prefeito de Hidrolândia, Paulo Sérgio de Rezende (DEM), diz gostar do modelo de ensino adotado pelos colégios militares e destaca a importância que eles têm tido na formação dos alunos em Goiás. “Estamos, inclusive, aguardando resposta do governo para implantar uma unidade na nossa cidade”, conta.O sucesso das escolas militares, para além da metodologia e dos resultados obtidos, se deve, em muito, segundo ele, à correspondência de anseios da sociedade. Os últimos acontecimentos em escolas em Goiás, marcados por violência e até mortes, como chegou a ocorrer no Colégio Goyases, em Goiânia, e no Colégio Estadual 13 de Maio, em Alexânia, no Entorno do Distrito Federal, contribuem ainda mais para acentuar, na visão dele, o desejo dos pais de colocar os filhos em uma escola que ofereça segurança. “E a escola militar estaria mais próxima disso”, pontua.A predileção, no entanto, não é ainda, segundo ele, o suficiente para gerar uma reflexão sobre a qualidade do ensino oferecido nas demais escolas ou na rede, em geral. “Até porque temos ótimos colégios no Estado. O que está acontecendo é que o modelo da PM, com regras que não são vistas nas outras escolas, tem surtido efeito”, diz.Reclamações chegam ao MPA coordenadora do Centro de Apoio Operacinal (CAO) da Educação do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), promotora Liana Antunes Tormin, conta que é comum chegarem às promotorias competentes demandas de reclamação dos colégios militares.Entre as principais, estão: suposta cobrança de taxas referentes à matrículas e segunda chamada de provas e contribuições compulsórias, apesar de haver sentença judicial em sentido contrário; exigência de uniformes e padrões de vestimenta de custo excessivo para os alunos; supostas punições e transferências compulsórias de alunos e servidores sem observância do direito à defesa; ausência de participação ativa da comunidade escolar no planejamento político pedagógico; falta de transparência na destinação das vagas e reserva de porcentual expressivo para livre preenchimento feito pela Polícia Militar, em prejuízo da comunidade escolar local.“Elas são apuradas individualmente pelas promotorias com atribuições na área e, conforme o resultado da apuração, são tomadas as medidas cabíveis.”-Imagem (1.1391457)-Imagem (1.1391456)