-Imagem (Image_1.1665217)O olhar altivo e o orgulho de usar o uniforme de ajudante de cozinha com a inscrição do seu nome revela a importância do curso para Thomas Cristian, 23 anos. “É literalmente uma esperança”. Homem trans que precisou de dois anos para encarar de frente sua identidade de gênero, ele perdeu as contas de quantas vezes viu as portas se fecharem à sua força de trabalho. “Fui contratado umas quatro vezes, mas nunca fiquei muito tempo. Hoje vendo ovos para me manter”. Adotado e filho único, Thomas saiu de casa para não ter de conviver com o “luto” dos pais que não o aceitam como homem. “Eu caí em depressão e demorei muito para revelar minha condição porque não queria decepcioná-los, mas sempre digo à minha mãe que ela tem de respeitar o ser humano que ela me fez”.A expectativa de Thomas, com o curso Cozinha e Voz, é conseguir um emprego e sair da zona de marginalização. Mas não apenas isso. “Meu sonho é abrir um restaurante e contratar somente pessoas LGBT ( Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgêneros). Quero mostrar para os clientes a minha equipe e dizer que ela é tão boa quanto qualquer outra”. Antes, para Thomas, cozinha não passava de uma terapia. “Com este curso estou aprendendo não somente técnicas para ser um auxiliar de cozinha e como lidar com este ambiente, mas também como me portar. É sensacional!”.Hérida França teve um caminho tortuoso desde a infância quando percebeu que nasceu mulher num corpo masculino. “Estudei pouco porque sofri muito na escola. Fiquei com trauma, até mesmo de professores”. As oportunidades de trabalho, segundo ela, sempre foram reduzidas. “E na maioria das vezes era dispensada já na entrevista”. A exclusão, conta, não é apenas do mercado de trabalho, mas também no meio familiar. “Pai e mãe nos tolera, mas sempre somos excluídos de reuniões e festinhas”. Sem afeto, sem respeito e sem trabalho, o destino de Hérida foi a prostituição, como a maioria de suas congêneres. “Passei por cima dos meus valores e dos meus princípios morais. Foram dez anos de muita luta e sofrimento.”Deste passado que ela ainda chora ao lembrar, trouxe cicatrizes espalhadas pelo corpo das agressões que sofreu. Hoje ela se mantém fazendo artesanato e licor, funções que não garantem uma sobrevivência digna. É por isso que Hérida quase não acreditou quando uma amiga a inscreveu no curso Cozinha e Voz e, selecionada, soube do que a aguardava. “Quando que teríamos uma oportunidade dessas? Fazer um curso e com tudo pago? Até hoje ninguém nos viu com esse olhar. Agora sim, vou ter uma profissão”, comemora.