Pacientes do médico suspeito de causar deformidades através de procedimentos estéticos relataram ao POPULAR que o profissional tinha como prática o constrangimento, com termos pejorativos sobre a aparência, para convencê-los a realizar tratamentos. Até agora, a Polícia Civil de Goiás recebeu quatro denúncias de pessoas que afirmam terem sido lesadas por Wesley Murakami. O médico mantém uma clínica no Setor Oeste, em Goiânia e outra em um shopping no Distrito Federal, mesmo sem ter nenhuma especialidade médica na área estética registrada no Conselho Regional de Medicina. A reportagem tentou contato com médico por telefone e esteve na clínica, na tarde desta sexta-feira (30), mas não foi atendida.As denúncias contra o médico envolvem procedimentos estéticos de preenchimento facial, tratamentos com laser, botox e até aplicação de corticoide. Na maioria dos casos mais graves, existe registro da bioplastia, técnica que consiste na aplicação de substâncias para aumentar o volume da região tratada e a sustentar a pele. Os pacientes relatam que, ao procurar o suspeito, tinham a intenção de realizar procedimentos mais simples, mas eram convencidos a aumentar o tratamento por meio de críticas. O médico, afirmam, usava termos como “cara de buldog”, “velho” e “baranga”.O delegado responsável pelo caso, Carlos Caetano Júnior, do 4º Distrito de Polícia da capital, informa que as denúncias são de 2012, 2017 e duas de 2018. “Com a divulgação do caso, o esperado é que mais pessoas procurem a polícia”, afirmou.Além das denúncias registradas até agora em Goiás, há, pelo menos, mais três casos no Distrito Federal. As vítimas contam que criaram um grupo em um aplicativo de mensagens com dezenas de pessoas que afirmam que passaram por alguma complicação em procedimentos com o médico.O Conselho Regional de Medicina de Goiás (Cremego) afirma que Murakami está inscrito no Conselho desde 2003, mas não tem nenhuma especialidade médica registrada.O presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) de Goiás, Sérgio da Conceição, afirma que é preciso aumentar a vigilância para profissionais como Murakami. Segundo ele, falta celeridade por parte dos Conselhos Regionais e do Conselho Federal de Medicina (CFM) em bloquear esse tipo de ação. “Nós estamos batalhando para proibir a atuação de médicos sem especialidade nesses procedimentos e até não médicos. Infelizmente, até agora, essa ainda é uma prática recorrente. Mas é uma preocupação de toda a SBCP”, afirma o presidente. Sérgio pontua que procedimentos estéticos, principalmente técnicas de preenchimento, não são isentos de complicações. (Dayrel Godinho é estagiário do GJC em convênio com a PUC-GO)Tratamento de acne se tornou bioplastiaO empreendedor Alexandre Cunha Garzon, de 29 anos, procurou a clínica, no Distrito Federal, para tratar de acnes no rosto, quando o médico recomendou a bioplastia, diferente do desejo inicial do paciente. “Ele disse que era o tratamento perfeito para o meu caso”. Alexandre relata, também, que foi orientado a aplicar a botox, porque “estava velho”. “Quando me olhei no espelho, tive um choque. Eu estava parecendo uma aberração, estava com a cara do Frankenstein, gigantesca, estranha, não parecia um ser humano. Fiquei muito preocupado mas ele apenas dizia que era normal e que meu rosto iria ficar lindo, que era só ter paciência”, conta. A vítima chegou a abrir um processo no DF contra o médico. “Não foi necessário sequer comparecer em tribunal, com os dados e a perícia em mãos, o juiz deu a sentença com facilidade. O médico foi julgado culpado e sentenciado a pagar indenizações por danos morais e danos estéticos. Mas a única coisa que eu realmente queria, era o meu rosto. E com isso, a minha vida de volta. Algo impossível, e o juiz sabe disso”.Embora o processo na esfera civil já tenha sido julgado a favor de Alexandre, por indenização de danos morais e estéticos, o médico, segundo a vítima, continua se evadindo de pagar o que foi julgado. “Irei fazer uma denuncia na delegacia de polícia civil também, já aproveitando a perícia do processo civil que me foi dado causa ganha”, afirma. “Peço que o CRM dele seja cancelado, para que ele não faça mais ninguém passar por tudo o que eu passei”, desabafa.Uma das vítimas de Goiânia, que não quis ser identificada, contou que procurou Murakami para fazer uma harmonização facial. Segundo ela, o médico convence os pacientes a fazer outros procedimentos estéticos a cada visita. “Ele vai convencendo a gente cada vez que a gente volta reclamando de uma coisa que não deu certo.”O caso se repete com Maria Fernanda (nome fictício), de 37 anos. Ela afirma que tinha o intuito de fazer um preenchimento facial com o médico em 2017, mas ele a convenceu a “fazer o rosto todo”. “Eu queria ficar linda, só que fiquei um monstro”, lamenta.“Eu nem queria preenchimento”A autônoma Bárbara Matos Andrade, de 29 anos, passou por três consultas com Murakami. “Eu nem queria colocar o preenchimento nos lábios, mas ele me convenceu”, disse. “Ele me colocou de frente ao espelho e disse que eu tinha o rosto de baranga e que me deixaria com o rosto de uma princesa”, relembra. ”Sempre que eu visitava a clínica, ele falava que eu teria que fazer um outro procedimento”.No último dia 21, ela procurou o suposto cirurgião plástico e,nessa consulta, o médico teria aplicado corticoide no rosto da mulher, o que piorou o seu caso. “Tive que ir para o hospital porque tive reações adversas”, lamentou.Mayra Viana Maciel, de 26 anos, amiga de Bárbara, relata que, mesmo sem ter agendado uma consulta, foi coagida pelo médico a fazer um procedimento estético. “Eu estava acompanhando a Bárbara e ele me chamou para dizer que eu poderia ser mais bonita do que eu era”, relembra. “Ele coage as pessoas”, afirmou Mayra. Contudo, estranhando a proposta de Murakami, ela recusou o tratamento.3 Perguntas para Sérgio da ConceiçãoPresidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) de Goiás fala sobre procedimentos estéticos 1 - Quais profissionais podem realizar o procedimento bioplastia em pacientes?Nós, da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), lutamos para conscientizar os pacientes a só realizarem esses procedimentos de preenchimento, que nós chamamos de minimamente invasivos, com médicos especialistas, que neste caso são dermatologistas e cirurgiões plásticos. Infelizmente existe uma prática, não só em Goiás como em outros Estados, de não médicos ou médicos não especialistas que fazem o procedimento. A SBCP já fez várias denúncias ao Ministério Público sobre casos semelhantes a este. 2 - A bioplastia é um procedimento confiável?Se realizado por um profissional especialista, em um consultório com as condições mínimas de segurança e higiene e com os produtos certos, as chances de complicações diminuem. Por ser um procedimento rápido, as pessoas acreditam que seja simples. Mas não é. É indicado que o profissional use uma substância absorvível, como o ácido hialurônico, por exemplo, e de confiabilidade.3- Como a sociedade pode se proteger?A primeira coisa é se certificar que o profissional é médico e, depois, se ele tem mesmo título de especialista. É possível ver isso nos Conselhos de Medicina regionais apenas com o nome completo do médico. Pelo site do CRM também é possível buscar a trajetória do profissional. A SBCP faz um clamor à sociedade, para que não se deixem enganar por preços ou propagandas e jamais façam qualquer procedimento com profissionais que não sejam médicos e nem com médicos sem especialidade. Também é aconselhável pesquisar sobre a substância do procedimento.-Imagem (1.1674736)