Reconhecidos pela sua força e resistência os muares sempre carregaram o estigma de animais de índole difícil, o que acabava conduzindo a um tratamento diferenciado e muitas vezes carregado por preconceito, desprezo e até maus tratos, mas há alguns anos esse cenário vem mudando, principalmente com o desenvolvimento genético e os investimentos em cruzamentos com éguas de raças como: mangalarga paulista, mangalarga marchador, campolina e quarto de milha. O que refletiu diretamente no mercado que, de acordo com o médico veterinário João Godói, está cada vez mais consolidado e em expansão. “O mercado de muares veio para ficar e para competir com os demais equinos.”Segundo o médico veterinário os muares sempre foram reconhecidos pela rusticidade, força e longevidade. “Características importantíssimas para o trabalho do dia a dia nas fazenda”, conclui. Mas outras qualidades foram somadas à medida que passou-se a investir no aprimoramento genético desses animais, possibilitando, inclusive, que eles pudessem participar com mais frequência e qualidade em cavalgadas e até serem usados na prática de esportes equestres. “O cruzamento com éguas de raça atribuiu ao muar características que antes não se via nesses animais, como trote macio, docilidade, entre outros”, explica. João também revela que o muar era um animal de doma difícil e por isso o contato com o homem era, na grande maioria das vezes, mediado pela hostilidade. “Não era comum ver crianças se relacionando com o muar na fazenda. Até ferrador para muar era difícil de encontrar”, exemplifica. Isso também mudou. Parte por conta da tecnologia genética, que acabou favorecendo o desenvolvimento de características que facilitam a relação homem/animal, e parte por conta da mudança de mentalidade dos criadores, que passaram a entender melhor como conduzir esses animais.“O maltrato aos muares era recorrente, assim como o abandono e a principal justificativa para isso era que o animal não atendia às ordens e direcionamentos do cavaleiro. Mas o que tem se percebido é que na verdade o muar é um animal de fácil aprendizado, mais sensível até que alguns cavalos, mas que demanda uma doma específica”, revela João. Ele explica que atualmente já existem profissionais que trabalham apenas com a doma desses animais. “Além das diferenças no trato e na condução, os muares também utilizam equipamentos específicos, afinal são animais com mais potência e força e isso requer ferramentas mais aprimoradas”, diz.Outro aspecto que vem mudando com o tempo é o mercado de muares, que atualmente não envolve apenas a compra de animais, mas também de todos os apetrechos e ferramentas específicas para ele. De acordo com João Godói o preço médio do muar para trabalho varia entre 3 e 5 mil reais. “Mas já existem animais de alto valor genético, normalmente usados em prova, que chegam a custar entre 50 e 100 mil reais”, revela. Ele afirma que o mercado de selaria, para esse tipo de animal, também vem crescendo e que um conjunto completo para montaria em muar pode custar, em média, R$ 5 mil. “Os criadores estão investindo em seus animais e por isso acabam cuidando melhor deles”, diz.Para João, o grande diferencial do muar é que ele é um animal forte, rústico, com um manejo alimentar muito simples e muita longevidade, o que viabiliza o uso do mesmo nas atividades diárias da fazenda, e que, se somado às qualidades de raças como mangalarga machador por exemplo, que dá mais conforto à montaria, pode otimizar as tarefas e os custos nos negócios. “Apesar de já existir muitos criadores que vem tratando seus muares em baias, à base de ração concentrada para equinos, esse tipo de animal pode muito bem ser criado a pasto, o manejo alimentar dele é muito simples. Outra vantagem é que eles sofrem poucas lesões, quase não ficam doentes e tem uma vida longa na lida, o que significa menos gastos com tratamentos e mais segurança no trabalho”, enumera. Eficiência no esporte e no trabalhoJoão Sérgio Jacinto é pecuarista, especializado em compra e venda de gado, mas sua grande paixão é montar e o laço em mulas tem sido seu maior hobby nos últimos vinte anos. Desde o início dos anos de 1980 o vaqueiro tem realizado a castração a solta em bovinos. No início eram os cavalos os grandes parceiros para essa tarefa, hoje, em sua propriedade, são as mulas que levam os cavaleiros para o trabalho. E além de parceiras na lida, elas já renderam muitos prêmios para a fazenda de João, que hoje tem um grupo de animais, resultado do cruzamento entre jumento pega e éguas quarto de milha, que participam de eventos por todo o Brasil.O atual plantel do criador é composto por cerca de 45 muares, sendo 30 para trabalho e 15 mulas quarto de milha treinadas para a realização de provas equestres. João tem inclusive um rancho onde montou toda a estrutura para o adestramento, treinamento e cuidado dos muares. “Sou um apaixonado por mulas, e só isso pode explicar minha dedicação. Para mim criar mulas não é um negócio”, explica, ao enfatizar o quanto para ele é especial lidar com esses animais. “Sempre amei cavalos. Sou laçador desde o berço e quando descobri o potencial das mulas para essa tarefa fiquei impressionado”, complementa.Ele explica que decidiu investir no cruzamento entre jumentos pega e éguas quarto de milha com a intenção de formar mulas que fossem ao mesmo tempo fortes, ágeis e resistentes, e assim aptas a atuar no laço a pasto e nas provas de laço. “As mulas quarto de milha enfrentam situações de perigo sem as reações afoitas dos demais equinos. E sua capacidade de trabalho, principalmente na condução do boi no laço, se mostra superior a dos cavalos”, revela o pecuarista.