Nacional (Uruguai) e Atlético-GO iniciaram na última terça-feira (2) a disputa por vaga às quartas de final da Sul-Americana com vitória atleticana por 1 a 0 em Montevidéu. Nesta terça-feira (9), no Estádio Serra Dourada, ambos definem a classificação em jogo que será histórico para os dois clubes.A história entre Atlético-GO e Nacional não começou nesta temporada com a disputa por vaga às semifinais da Copa Sul-Americana. As duas equipes escreveram capítulo importante do futebol goiano na gênese do Serra Dourada, onde agora se enfrentam oficialmente pela primeira vez. Os dois quadrifinalistas do torneio continental têm uma ligação passada que remonta a meados da década de 1970, quando o futebol goiano vivia a agitação por causa da inauguração do palco em que será decidida a vaga.Num quadrangular denominado Torneio Osmar Cabral, os dois clubes jogaram há 47 anos, num domingo, dia 23 de março de 1975. O Atlético-GO venceu por 1 a 0 - gol do atacante Reinaldo, aos 7 minutos do segundo tempo. Não se trata de um jogo qualquer. Foi a primeira vez que o Dragão, até então habituado aos estádios Olímpico e Antônio Accioly, pisou na nova arena. O Nacional é pioneiro em outro aspecto. Se tornou o primeiro clube internacional a jogar (duas vezes, pois enfrentou o Goiânia) no Serra Dourada, até então cheirando à tinta fresca e concebido como grande novidade no futebol brasileiro.Para compreender isso, é preciso entender a dinâmica e os fatos que se sucederam naquele período. A construção do estádio foi concluída na gestão do então governador, Leonino Caiado, que cumpria os últimos dias de mandato. Era preciso aproveitar a novidade e criar agenda de eventos, pois o Estadual e o Brasileirão só começariam um pouco mais tarde.O primeiro jogo, o da inauguração, teve vitória (2 a 1) da seleção goiana sobre Portugal no dia 9 de março de 1975. O Atlético-GO tinha no selecionado goiano o meia Piorra (titular) e o jovem zagueiro Wilson Sorriso, de apenas 19 anos, na reserva da dupla Macalé e Alexandre Neto.Leia também- Dragão voltou a vencer após quase dois meses- Presidente diz que Atlético-GO não merece cair de divisãoNa sequência, houve o Torneio Internacional Leonino Caiado. Participaram a seleção goiana, a Argentina (do técnico Luis Cesar Menotti, do zagueiro Galván e do meia Ardiles, futuros campeões do Mundial de 1978), a academia palmeirense e o popular Flamengo (primeiro campeão da era Serra Dourada com Zico, Doval, Júnior com triunfo de 1 a 0 no Palmeiras).Nesta disputa, a antiga Federação Goiana de Desportos acertou a excursão da seleção goiana à Argentina, mas o acordo não teria sido cumprido. Vila Nova e Goiás decidiram disputar dois clássicos entre si, valendo troféu.Aí, entraram as diretorias de Atlético-GO e Goiânia. Foi organizado o Torneio Osmar Cabral, o Ceub-DF (do ex-goleiro Paulo Vitor) foi convidado e foi acertada cota de 170 mil cruzeiros (antiga moeda brasileira, com Cr$) para o Nacional participar também. Esperava-se lucro e bons públicos, pois os uruguaios eram uma atração, mas não foi esse o resultado final. O presidente do Atlético-GO, Oberdan Santos, apontou prejuízo de Cr$130 mil após os primeiros jogos.Na rodada dupla de abertura, duas semanas depois da entrega do Serra Dourada, o Dragão ganhou de 1 a 0 do Nacional e o Ceub-DF bateu o Goiânia por 3 a 2 . “Foi um jogo muito aguardado. Era um time (Nacional) famoso. Uma honra para mim e o Atlético-GO enfrentá-los”, definiu o meia Piorra, titular da seleção goiana naqueles jogos iniciais e liberado para reforçar o Dragão no torneio quadrangular. Uma das recordações dele foi o bom futebol apresentado pelo meia Darío Pereyra, ainda no início da carreira.A equipe atleticana e a universidade privada do Distrito Federal decidiram o título - empate de 0 a 0 e vitória (11 a 10) do Ceub nos pênaltis. Na decisão do 3º lugar, triunfo do Nacional sobre o Goiânia por 2 a 1 - gols de Herbert Revetria e Luís Alonso, descontando o atacante Sinomar para o Galo. Isso no dia 26 de março de 1975.Treino no escuro e reclamaçãoAlém de ter a obrigação de jogar duas vezes no fim de semana (sábado, 22/3/1975, em Montevidéu, e no domingo, 23, no Serra Dourada) para receber a cota acertada - os amistosos eram uma das poucas opções de receitas dos clubes junto à renda dos jogos e às negociações dos jogadores à época -, o Nacional reclamou dos organizadores do torneio. Depois de perder para o Dragão na estreia e antes de decidir o 3º lugar com o Goiânia, o clube uruguaio pretendia fazer um treino leve no Olímpico. Era noite e não havia responsável para ligar o sistema de iluminação no estádio.Reportagem do POPULAR relata que os uruguaios fizeram “física no escuro”. Nesse intervalo, foram conhecer Brasília e voltaram para o segundo jogo no Serra Dourada. Vitória de 2 a 1 sobre o Goiânia no dia 26 de março, uma quarta - gols de Revetria e Alonso (Nacional) e Sinomar (Galo).O árbitro Urias Crescente Júnior expulsou Rogério e Alonso. A partida foi marcada ainda por uma chuva forte que testou a drenagem nova do Serra Dourada e desgastou fisicamente os uruguaios.Para fechar a excursão na capital goiana, o Nacional ganhou do Goiânia com a formação: Bertinat; De los Santos (Caillava), Gerolami,Villazán, Piazza; Darío Pereyra, De Lima, Muniz (Carrasco); Montero (Machado), Revetria, Alonso.O Galo, campeão goiano em 1974 e vice duas vezes (1975 e 1976) nos primeiros anos do Serra Dourada, teve Nilson; Benè, Dema, Lula, Tasso; Cagnani, Mauricio (Eulálio), Wilson; Marco Antônio, Heber (Marcelo) e Sinomar. O time alvinegro foi dirigido pelo técnico Tomazinho.Atlético vence uruguaios em partida equilibradaA organização e realização do Torneio Osmar Cabral tiveram percalços. O Nacional confirmou a presença, mas só chegou a Goiânia em cima da hora da estreia, na madrugada do domingo (23 de março), dia do jogo. A equipe atuou no sábado (22) no Estádio Centenário, em Montevidéu, vencendo o Defensor por 2 a 1 - gols de Herbert Revetria, estrela da seleção uruguaia campeã sul-americana juvenil (1975) e do meia Darío Pereyra. Dali, a delegação se dirigiu ao Aeroporto de Carrasco e veio para Goiânia num avião da Força Aérea do Uruguai.Naqueles dias, a editoria de Esportes do POPULAR conseguiu algumas informações sobre o clube uruguaio graças à emissão de telex ao jornal El País. Tempos difíceis de comunicação.A lista de convocados enviada pelo periódico do país vizinho tinha: Omar Gárate e Bertinat (goleiros), Gerolami, Villazán, De los Santos, Piazza, Machado (defensores), Pisano, De Lima, Darío Pereyra, Montero, Luís Alonso, Muniz, Juan Pereyra, Cailava (meias), Juan Ramón Carrasco, Roberto Repetto (ex-Cruzeiro) e Revetria (atacantes) e o comando técnico de Gualberto Diaz.O Bolso, como o Nacional é conhecido, estava em fase de renovação. Manga, goleiro brasileiro e ídolo do clube, havia se transferido para o Inter-RS em 1974. Promessa, Revetria se transferiu mais tarde para o Cruzeiro e se consagrou na final do Mineiro (1977) com quatro gols em dois jogos sobre o Atlético-MG. Meia artilheiro, Darío Pereyra veio para o São Paulo, virou zagueiro e ídolo tricolor.Chegando a Goiânia na madrugada de domingo (23) para se hospedar no Umuarama Hotel e sem tempo para descanso, o Nacional disputou o histórico jogo com o Dragão. “Eu me lembro que marquei o Revetria, bom jogador. Depois que o marquei, fiquei sabendo que era famoso. Jogou depois no Cruzeiro. Não conhecíamos muito os jogadores. Entrava para marcar o adversário. Para mim, o normal era jogar”, explicou Wilson Sorriso, que sempre intercala as frases e casos com largas risadas.No jogo, segundo ele, Herbert Revetria tentou dar-lhe uma cotovelada. A resposta foi uma “entrada mais dura” no uruguaio. “Ele (Revetria) falava ‘boleta, boleta, boleta”. Para Sorriso, então com 19 anos e reserva da seleção goiana, o termo insinuava que ele (zagueiro) estava “dopado”. Fato é que Wilson é considerado um dos melhores zagueiros da história do clube e voltou à seleção goiana em 1978, no amistoso com a seleção brasileira.“Éramos jovens, um time nota sete. Não me lembro dos detalhes do jogo, mas aquele momento (novo Serra Dourada) era novidade para os goianos. Eu já havia jogado no Mineirão (pela base do Atlético-MG). Os uruguaios chegavam junto, mas não eram violentos. Era o estilo deles”, detalha o meia Japão, camisa 10 do Dragão à época com 20 anos.Os “jovens” eram Japão, Wilson Sorriso, o meia Jorge (de 20 anos, irmão do lateral Cassetete), o atacante Reinaldo (um pouco mais velho). O Dragão teve um treinador estreante: Ney Fernandes. “O Seu Ney era tranquilo. Dizia ao time para jogar bem, vencer o jogo e ganhar visibilidade.” Foi na jogada iniciada por Japão que Reinaldo tirou a marcação e fez o único gol do jogo.No jogo marcante entre Atlético-GO e Nacional, o goleiro Gárate se contundiu e precisou ser substituído por Bertinat. O Dragão teve Lumumba; Cassetete, João Marcos, Wilson Sorriso e Gilson; Dadi e Piorra; Reinaldo, Japão, Jorge (Poli) e Maurício.O Nacional atuou com Gárate (Bertinat); De los Santos, Gerolami, Villazán, Machado; Darío Pereyra, De Lima (Caillava), Muniz; Montero (Carrasco), Revetria, Alonso (Roberto Repetto). o árbitro foi Sebastião Junqueira e a renda foi de Cr$ 83.544,00.