Janderson é uma das esperanças para reverter fase ruim do Atlético-GO na Série A nacional a partir do jogo com o Ceará, neste sábado (20), às 21 horas, no Estádio Antonio Accioly. No clube há um ano e três meses, o atacante foi cedido por empréstimo pelo Corinthians ano passado e, novamente, no final de fevereiro de 2021.O jogador trouxe para Goiânia a ousadia, o físico franzino e os laços de família, como no nome de novela, cultivados desde a infância em Missão de Aricobé, um distrito com cerca de 6 mil habitantes no município de Angical (BA).Janderson tem 22 anos. Nasceu e foi registrado em Barreiras (BA). Ele é órfão da mãe, Edneia, desde os três anos. Pouco desfrutou da relação mãe e filho, mas conserva vínculos afetivos com familiares maternos. Por isso, faz questão de ter sempre alguém ao lado dele, desde os tempos de moradia em São Paulo, das categorias de base até o elenco principal do Corinthians.Após o nascimento, em 1999, viveu um tempo na fazenda, ao lado dos pais. Logo aprendeu a gostar “de animais, de fazer cavalgadas, da vida na roça”, como conta. Mas a criação se deu na Missão de Aricobé, assim que ele não pôde viver mais ao lado da mãe, Edineia. Segundo o atacante, a mãe teve câncer no intestino e morreu jovem. O pai, Juvaldino, trabalha em fazendas da região e Janderson passou a ser criado pela avó materna, Maria Xavier.O primeiro treinador e incentivador no futebol é o tio, Júnior Guimarães, casado com Edna, tia do jogador e irmã de Edneia, a mãe de Janderson. Na capital goiana, para ter carinho e não ficar só, tem a companhia de outro casal de tios, Osvaldo Filho e Deiziele, a Deize, outra irmã da mãe de Janderson. É tratado como “xodó” neste braço familiar. A perda da mãe fez com que os mais velhos ficassem mais próximos do pequeno Janderson, hoje com 1,61m.Cada qual à sua maneira, todos estão ao lado do atacante, que não deixou de ser o “jogador família” após rodar pelo País desde o início da adolescência. Janderson já morou em Brasília, São Paulo, passou pelo Fragata-RS, clube gaúcho que foi presidido por Emerson, ex-volante do Grêmio e da seleção brasileira. Parte da base foi no Tombense-MG, assim como no Joinville-SC, até a chegada ao Corinthians.Em Goiânia, o casal de tios (Osvaldo e Deize) trata Janderson como filho. “Além da convivência, damos o suporte no dia a dia. Vamos acompanhá-lo enquanto pudermos estar juntos”, disse Osvaldo, técnico em análises clínicas que trabalhou para o Exército durante oito anos. “A nossa convivência é a melhor possível. Ele (Jandeson) é muito gente boa, é aberto a ouvir. O suporte que nós damos é, além de estar próximo dele, resolver tudo que for preciso fora de campo. Estamos gostando da nossa vida, aqui”, revelou Osvaldo.O jogador tem a avó materna, Maria Xavier, como mãe. Ela foi convencida a morar com o neto em São Paulo, mas decidiu voltar para Missão do Aricobé por causa da pandemia do coronavírus, no ano passado. Recentemente, ela veio a Goiânia para visitar Janderson e fazer um check up. “Ele (Janderson) não mede esforços para cuidar da avó. Faz de tudo por ela”, citou o tio.O atacante se derrete pela avó. Segundo ele, a perda da mãe fez com que ganhasse outra “mãe”, que assumiu a criação e a educação do neto. “Sempre fui criado por ela. Todo mundo quer ter mãe, mas infelizmente perdi a minha bem cedo. Minha avó fez e faz de tudo por mim. Tirou do dinheiro dela para me ajudar. É a minha mãe. A cada conquista, quero presenteá-la, ajudá-la também”, explicou Janderson.Quando ele chegou ao Corinthians, em 2019, deu um jeito de levar Maria Xavier para morar com ele, em São Paulo. “Ela (avó) não queria ir para São Paulo. Fiz um pouco de drama, pois precisava dela ao meu lado. Entrei na mente dela e acabou dando certo”, disse o atleta. Maria Xavier estranhou um pouco o estilo de vida na maior metrópole do País, o frio, mas ficou ao lado do neto até optar pelo retorno à Missão de Aricobé, onde se sente mais segura.Outro tio, Júnior Guimarães, revela que Janderson fala diariamente com a família no interior baiano. “A avó não dorme enquanto não fala com ele. Ainda mais quando ele vai viajar, é uma aflição. Tem de chegar e ligar para ela (Maria Xavier). Como se vê, é um menino muito carismático e de bom coração”, define Júnior.“O pensamento é trabalhar cada vez mais e melhor para poder ajudar a minha família”, afirma Janderson, que se diz muito bem ambientado à vida em Goiânia. Por se sentir acolhido pelos moradores da capital e torcedores do Atlético-GO, decidiu fazer ano passado a doação de cestas básicas para dependentes químicos, idosos e pessoas em situação de rua em parceria com uma instituição.Tio, que também foi técnico, instiu na formação do jogadorJúnior Guimarães é professor da escolinha de futebol do Tenerife, fundada há 23 anos, no dia 22 de novembro de 1998, um pouco antes do nascimento de Janderson. Segundo ele, foi a partir de 2006 que o atacante atleticano passou a ser preparado para ser jogador.“Com apenas 7 anos, Janderson se integrou ao nosso projeto. Era menino de muita velocidade e facilidade para conduzir a bola. Percebemos que aquele garoto tinha algo diferenciado dos demais. Foi ali, então, que decidi priorizar os treinamentos com ele. E montamos um planejamento de treinos exclusivos para ele”, lembra o treinador e tio. Não foi uma planilha de treinos simples. Janderson se desdobrava na preparação diária. Era o primeiro passo para ser um atleta, mesmo sem ter um clube. “Acordava às 5 horas da manhã para correr 6 quilômetros. Em seguida, íamos para o campo treinar com bola, condução de bola em velocidade, chute com a esquerda e a direita, e o principal dele, o um contra um”, detalhou Júnior Guimarães. Os treinos serviram para prepará-lo para as peneiras e testes nos clubes que o garoto teria de encarar. Em 2011, aos 13 anos, Janderson se destacou num torneio da categoria, a Copa Sul-Americana, em Brasília. Segundo Júnior, o sobrinho foi considerado o melhor jogador da categoria dele, além de ganhar uma semana de testes no Santos. O salto na carreira veio aos 17 anos. Em 2015, voltou a se destacar. Dessa vez, num torneio em Bom Jesus da Lapa (BA). Foi convidado para atuar no Fragata-RS, clube então presidido pelo ex-jogador Emerson. Janderson não se tornou artilheiro no Atlético-GO, mas fez alguns gols importantes, como na semifinal do Goianão 2020, em que o Dragão bateu por 2 a 1 a Aparecidense. Também é autor da antológica sequência de cinco dribles, sobre jogadores do Santos na Vila Belmiro, até deixar a bola para o belo chute do sul-coreano Chico no gol do triunfo. Outro gol marcante é o da vitória sobre o Atlético-MG, por 2 a 1, que quebrou invencibilidade do Galo, favorito ao título do Brasileirão, ao tocar na saída do goleiro. Até hoje, Júnior é uma espécie de analista de desempenho do sobrinho. Acompanha os jogos ou, quando não há transmissão, procura os lances no YouTube. “Sempre tivemos esta sintonia de corrigir os pontos. Quando íamos para as copas, era mais fácil, porque eu estava na arquibancada e, através dos assobios, ele já identificava”, lembrou. “Quando ele vinha nas férias, ia buscá-lo e ele falava para irmos treinar os pontos que precisava aprimorar”, acrescentou Júnior Guimarães.Janderson confirma os relatos do tio e técnico. “Ele (Junior Guimarães) é muito importante. Comecei na escolinha dele. Ele me acordava todo dia, bem cedo, às vezes às 5 horas da manhã para treinar, pois tinha a visão de que eu precisava treinar forte para ser jogador”, relembrou Janderson, que diz que até hoje o tio e o “primeiro professor” de futebol acompanha todos os jogos dele, faz observações técnicas e táticas e pede para que não deixe de ser um jogador ousado com a bola nos pés. As dicas são levadas em consideração pelo sobrinho, que é uma referência para os demais garotos. Segundo ele, cerca de 30 meninos, na faixa etária de 14, 15 anos, são treinados por Júnior Guimarães. Um deles é o irmão pelo lado paterno, Guilherme, que chegou a morar em Goiânia com Janderson na tentativa de iniciar a carreira. Mas o projeto passou pelo retorno às origens, em Missão de Aricobé, onde vai se preparar um pouco mais com Júnior Guimarães até que possa buscar um clube. Júnior Guimarães citou que Janderson auxilia “um movimento para crianças” e, a cada dia 13 de outubro, faz uma doação de um porcentual do salário. Além disso, os dois planejam ampliar o projeto da escolinha do Tenerife, em Missão de Aricobé. “Não adianta começar e não terminar o projeto. Temos o pensamento de montar o centro de treinamento (CT) para dar melhores condições às crianças”, explica Júnior.