Há pouco mais de um mês, no dia 21 de dezembro, completaram-se 40 anos da morte do escritor e dramaturgo Nelson Rodrigues (1912-1980). Seus escritos ganharam diversas adaptações para o cinema, teatro e televisão. Referência no universo literário e jornalístico, a marca dramática de seus textos não poderia deixar de ser teatral: peças como Vestido de Noiva, encenada pela primeira vez em 1943, tornaram-se leitura obrigatória até de vestibulandos. Já A Vida Como Ela É..., sua coluna no jornal Última Hora entre 1950 e 1961, reúne uma série de textos que traduz bem a sua intenção de observar e desvendar as pessoas em seu mais puro estado cotidiano.As tramas ora são chamadas de contos, ora de crônicas. Isso porque eram baseadas em notícias reais que saíam nos jornais cariocas, tornando Nelson Rodrigues um visionário cronista. Adultério, crimes, pecados; nos textos, os desejos e a moral dos personagens usam a ficção como espelho do imaginário urbano com linguagem simples e direta, o que causou escândalo na época de seu lançamento. A série já ganhou adaptações para a televisão, radionovela, fotonovela, foi gravada em disco, inspirou filmes e agora ganha versão em audiobook, com lançamento pelo serviço de streaming Storytel.Em 1961, o próprio autor organizou uma coletânea com cem textos publicados em sua coluna, que leva o mesmo nome. Nesse lançamento em áudio, os dez textos que compõem a temporada foram selecionados pela sua própria família. Entre narrativas de amor, casamento, violência, machismo e cotidiano, são eles: A Esbofeteada, A Futura Sogra, A Moreninha, Delicado, Duas Lágrimas, Louríssima, O Grande Amor, O Único Beijo, Paixão de Morte e Sem Caráter.A polêmica e a dualidade entre amor e ódio sempre permearam a figura do escritor e sobre o que ele escrevia. Suas peças teatrais sofriam com a censura por desafiar os bons costumes e a Igreja, mesmo que ele se definisse como um “homem conservador”. No texto que abre a série narrada, a personagem Ismênia conta para suas amigas o episódio em que levou uma “bofetada” de seu namorado Sinval. Em outros textos, como O Pediatra, em que ele mostra um personagem que luta para conquistar a amante, continua expondo a vida “politicamente incorreta” que acontecia por baixo dos panos. À época, Nelson foi acusado de atacar as famílias brasileiras por denunciar comportamentos e preconceitos, principalmente da burguesia da cidade.O formato em áudio recria cenas, vozes e cenários do cotidiano do Rio de Janeiro, fugindo do formato flat, aquela leitura crua e simples de um texto adotado por alguns audiobooks. A intenção é que os ouvintes consigam se ambientar e imergir na vida suburbana do Rio de Janeiro da época, fazendo jus aos relatos precisos de Nelson Rodrigues. A narração fica por conta de Erika Riba, bacharel em artes cênicas, Vilma Melo, atriz e professora de teatro, e Renato Peres, que já realizou trabalhos como Álbum de Família, do mesmo autor.Em O Anjo Pornográfico, biografia de Nelson Rodrigues, Ruy Castro escreve que “A Vida Como Ela É... com um fascinante elenco de jovens desempregados, comerciários e barnabés, tendo como cenários a Zona Norte, onde eles viviam; o Centro, onde trabalhavam; e, esporadicamente, a Zona Sul, aonde só iam para prevaricar”. Para ouvir os dez episódios, é necessário ter assinatura da plataforma Storytel, que tem mensalidade no valor de R$ 27,90.Obras adaptadasA Vida como Ela É...Com adaptação de Euclydes Marinho, a série de televisão baseada nos textos da coluna do dramaturgo foi exibida originalmente no programa Fantástico, da Rede Globo, em 1996. O elenco reunia Tony Ramos, Marcos Palmeira, Malu Mader, Maitê Proença, Cássio Gabus Mendes, entre outros, além de narração de Hugo Carvana e José Wilker. A direção é assinada por Daniel Filho. O Beijo no AsfaltoEm 1964, a primeira versão cinematográfica baseada na peça homônima de Nelson Rodrigues foi lançada com direção de Flávio Tambellini. Em 1980, a segunda, dirigida por Bruno Barreto com roteiro de Doc Comparato, traz no elenco nomes como Tarcísio Meira, Ney Latorraca, Lídia Brondi e Christiane Torloni. Em 2018, a terceira versão vem com direção de Murilo Benício e elenco com Lázaro Ramos, Débora Falabella e Fernanda Montenegro. Em 2019, a produtora de Viola Davis anunciou a compra dos direitos e a pretensão de adaptação também para os cinemas. Bonitinha, mas Ordinária ou Otto Lara RezendeCom direção de Braz Chediak, o filme de 1981 baseado na peça homônima foi a segunda adaptação para o cinema da obra, sendo a primeira de 1963 e a terceira de 2008. No elenco, Lucélia Santos, José Wilker e Vera Fischer. O autor chegou a ver o primeiro corte do longa-metragem, mas faleceu antes de seu lançamento. Engraçadinha: Seus Amores e Seus PecadosResponsável por revelar a atriz Alessandra Negrini, a minissérie exibida pela Rede Globo em 1995 é baseada no romance Asfalto Selvagem: Engraçadinha, Seus Pecados e Seus Amores. Com direção de Denise Saraceni e João Henrique Jardim, a adaptação trouxe também Cláudia Raia como protagonista na segunda fase. Toda Nudez Será CastigadaA história de Herculano e Geni foi adaptada do teatro para as telonas em 1972, com direção de Arnaldo Jabor. Sucesso de público na época, é considerada uma das principais obras cinematográficas baseadas em textos do dramaturgo. Jabor, que conheceu Nelson Rodrigues pessoalmente, adaptou também o romance O Casamento para o cinema.-Imagem (Image_1.2195376)