Livros, textos, manuais, depoimentos. Tudo isso pode ajudar, mas nunca prepara totalmente para o momento após o parto, quando cada realidade enfrentada é diferente para cada mulher. Entre os inúmeros desafios que passam por puerpério, como amamentação, organização da rotina e rede de apoio, as mamães ainda precisam lidar com um corpo diferente de antes da gestação, com limitações e alterações. “Quando engravidamos, sabemos que nosso corpo vai sofrer uma grande mudança. Mas, mesmo com essa consciência, isso é muito impactante no pós-parto”, comenta Raisa Godoi, personal trainer especialista em mães.Ela, que é mãe das pequenas Júlia e Lívia, voltou a sua atenção profissional para as mulheres que passaram por uma gestação após a própria experiência com as atividades físicas nesse período. “O exercício físico e seus benefícios são duas metades de uma roda, e é preciso entrar nessa roda para colher tudo o que eles podem trazer em relação a saúde e a estética. E é a melhor coisa que você vai fazer por você mesma, para mudar sua relação com seu corpo e com a sua mente”, comenta.Raisa diz que a principal queixa das mulheres nesse período é em relação a barriga. “O corpo da mulher no pós-parto assume, em geral, três características: diástase, que é a separação que os músculos abdominais sofrem durante a gestação e que podem não voltar naturalmente; má postura, já que os cuidados com o bebê exigem uma postura cifótica (ombros e costas inclinados para frente) e o excesso de gordura adquirido na gestação”, aponta.Ela explica que a diástase é, ainda, responsável pelo estufamento da barriga mesmo após a perda de gordura abdominal. “E não é só isso: também pode causar dor nas costas e incontinência urinária”, alerta. A principal recomendação é que se busque exercícios que ajudem nesses três problemas principais com o acompanhamento de um profissional de educação física para a orientação em relação à intensidade e escolha dos movimentos durante os exercícios. “É preciso respeitar seu corpo e é bom avaliar quanto tempo tem o parto para que a prescrição seja segura”, comenta.Tempo para o retornoA ginecologista e obstetra Mariana Stival explica que a volta às atividades físicas após o parto normal e a cesárea possuem recomendações diferentes. “O pós-parto normal é um pouco mais tranquilo. Costumo liberar para atividades físicas leves, como uma caminhada, em 15 dias. Já no pós-cesárea, após 40 dias”, diz. Mesmo com a recomendação geral, é necessária uma avaliação individual do que cada mulher está sentindo. “Cada médico liberará de acordo com a avaliação. No caso de uma cesárea, por ser um procedimento cirúrgico, pode ser que a paciente tenha uma limitação em relação a dor, por exemplo”, afirma.Nos dois tipos de parto, a ginecologista obstétrica destaca uma atenção especial para o assoalho pélvico, que pode ter acompanhamento de um fisioterapeuta pélvico. “Independente da via, pelo peso da gestação na região, a mulher pode desenvolver problemas como quedas de bexiga e incontinência urinária. Fortalecer a musculatura do assoalho pélvico é extremamente importante para a saúde física futura”, aponta. Em todo caso, a recomendação é que esse retorno às atividades seja supervisionado e gradual.A especialista diz que não há um exercício único, que seja mais indicado para um pós-parto. “Costumo dizer que a melhor atividade física é aquela em que a pessoa vai conseguir manter uma constância. Não adianta eu indicar um pilates se a pessoa não gosta”, comenta. “A rotina muda muito e às vezes essa mulher se volta muito para o bebê. Ao tirar uma hora para cuidar dela, tem que ser com uma atividade física que seja prazerosa”, pontua. “Não se apegue muito a tantas regras. É importante fazer seus exercícios, se sentir bela, manter o autocuidado. Mas se não conseguir, não se culpe, não se julgue e não se compare. Outro dia você consegue e pronto”, declara Daniela Hora Alves, mãe da pequena Alice. “Dica de ouro: não tente ser perfeita, aceite ajuda e busque tranquilidade para o seu dia”, finaliza.Autoestima A personal trainer Raisa Godoi conta que a cobrança em relação a seu corpo foi grande nas duas gestações. "Foi muito difícil para mim. Além da minha própria vaidade e autoestima, que estava abalada, eu ainda me sentia cobrada por ser uma personal trainer e não ter conseguido voltar ao meu corpo. Tinha vergonha de usar as roupas de antes da gestação, até porque elas não me serviam como antes", diz. "Durante a gestação a barriga vai crescendo, as pessoas nos elogiam, o cabelo fica com mais vida devido às influências hormonais, o seios ficam maiores e mais durinhos e até o bumbum e pernas ficam mais torneadas. Mas quando o bebê sai, a barriga continua ali", comenta.Ela destaca que é possível voltar ao corpo (ao menos aproximado) do que era antes sem procedimentos invasivos. "É preciso usar técnicas específicas para cada uma das características que o corpo assume após a gestação", explica. "Você pode, inclusive, ter sua melhor versão depois de ser mãe. É importante ressaltar que isso é possível mesmo que seu parto tenha 3 meses, cinco anos ou dez anos". Ela reitera que é de extrema importância ter a liberação do obstetra para voltar aos exercícios físicos, tanto para partos normais, quanto no caso das cesarianas."Como mãe de duas meninas e também como especialista, estou falando de exercícios físicos que podem ser feitos em sua casa, sem precisar de nenhum material, por exemplo. Também podem ocupar poucos minutos do seu dia. Porque não adiantaria eu defender os exercícios que não cabem em uma rotina que é extremamente apertada", diz. Uma boa estratégia, segundo Raisa, é manter os exercícios durante a gestação. "Se você mantiver os treinos de força, que são os treinos que aumentem e mantém a massa muscular, seu metabolismo vai se manter acelerado durante toda a gestação, acumulando menos gordura, e após, queimando mais gordura", destaca.Alimentação como aliadaSeja qual for o cenário, a alimentação está entre os principais aliados das atividades físicas para a manutenção da saúde e bem-estar. No caso do pós-parto, o corpo da mulher precisa, mais do que nunca, de uma atenção especial em relação ao fornecimento de nutrientes e energia, como explica a nutricionista materno infantil, Luiza de Amorim. "A alimentação saudável após o parto é tão importante quanto na gestação. Nesse período, o corpo da mulher apresenta enorme atividade energética e recebe a função de produzir e fornecer alimento para o bebê. Ou seja, é um momento de muita relevância sob o ponto de vista nutricional", aponta.A especialista destaca a ingestão dos macronutrientes, como carboidratos, proteínas e gorduras. "Eles devem ser priorizados. Mas, é claro, sem esquecer dos micronutrientes, como vitaminas e minerais, que são essenciais para a recuperação da homeostase do corpo materno e garantir a produção adequada de leite", diz. Um dos momentos mais desafiadores é o puerpério, período imediato após o parto em que as mulheres enfrentam uma alta vulnerabilidade. "É um período que exige a adaptação a uma nova rotina em que, muitas vezes, o autocuidado é colocado em segundo plano diante da responsabilidade de cuidar de uma nova vida", comenta. A nutricionista destaca dois pontos fundamentais que podem auxiliar nesse primeiro momento: rede de apoio e organização. "Na reta final da gestação, a mamãe já pode preparar e congelar refeições para os primeiros dias, quando será mais difícil preparar algo. Dessa forma, sempre haverá uma refeição à mão, evitando longos períodos em jejum ou o consumo de alimentos industrializados e fast foods", diz. Ela afirma que, havendo liberação médica e o acompanhamento de um educador físico, a rotina de exercícios deve estar presente desde o início da gestação. "É importante que a mamãe encontre uma atividade que seja prazerosa sem objetivar exclusivamente o gasto calórico", reitera.A hidratação não pode ser deixada de lado. "Queixas de sede durante a amamentação são muito comuns e a ingestão pode até dobrar nesse período. Considerando que o leite materno é composto por 87% de água, e que esta é essencial para garantir a produção em volume adequado, um consumo de até 3 litros ao dia pode ser recomendado", explica, fazendo um adendo: "Lembrando que sucos, chás e outras bebidas não substituem o consumo de água pura".A suplementação de vitaminas e minerais pode ser indicada, sendo necessária a avaliação de um profissional antes. "O uso é indicado se a mulher não atinge as necessidades estabelecidas apenas com a alimentação ou apresenta deficiência de algum nutriente, principalmente a vitamina A, B12, cálcio, ferro, magnésio. Sabe-se também que a vitamina D e o Ômega 3 podem ajudar na prevenção da depressão pós-parto e que a reposição de biotina auxilia na queda de cabelo, comum nesse período", aponta. Já o uso de suplementos fitoterápicos durante o pós-parto deve ser avaliado de forma criteriosa, já que muitos podem p ser contra-indicados no período de amamentação, como ginko biloba, ginseng, kombucha e valeriana, por exemplo.Principais cuidadosVoltar a rotina de exercícios físicos pode ser benéfico para as mamães, mas exige alguns cuidados e acompanhamento de profissionais. A profissional de educação física Daniela Rico destaca 5 pontos fundamentais para se atentar antes de iniciar as práticas após o parto:1. Assoalho pélvico O conjunto de músculos e ligamentos que fazem a sustentação dos órgãos pélvicos, como bexiga, útero, reto e intestino, e todo conteúdo que fica na pelve, parte baixa do abdômen, é chamado de assoalho pélvico. "Durante nove meses, essa sofreu uma sobrecarga e, depois do parto, ainda está fraco e sem condições de receber sobrecarga. Por isso, é importante não realizar exercícios que gerem impacto e sobrecarga e promover um fortalecimento para esta musculatura", aponta.2. Amamentação A profissional recomenda não realizar atividades que tenham muito gasto hídrico e calórico para não influenciar na demanda e qualidade do leite. "Lembrando que não é regra. Tudo vai depender de como esta mãe irá se hidratar e se alimentar depois que começar a treinar", diz.3. Postura A postura merece um cuidado especial, com exercícios que trabalhem a musculatura da área torácica e cervical. "Atividades de alongamento, fortalecimento e relaxamento irão dar ênfase a musculatura que será utilizada para cuidar do bebê", comenta.4. Mamas "Se estiverem pesadas e sensíveis, cuidado ao realizar exercícios que possam ter apoio e impacto", orienta.5. Diástase Em caso de diástase abdominal, a especialista recomenda evitar movimentos como: flexão e rotação de tronco, posições que possam aumentar o peso dos órgãos em cima da musculatura e hiperextensões lombares.