Alguns filmes são criados para serem clássicos, outros se tornam ao longo do tempo. A segunda opção é o caso de Casablanca, dirigido por Michael Curtiz. Ao completar 80 anos, o longa-metragem, que estreou nas salas de exibição do Brasil no dia 7 de dezembro de 1942, tem lugar garantido na história do cinema com o romance de Rick Blaine e Ilsa Lund, em meio a Segunda Guerra Mundial.O que torna um filme um clássico? Para o professor de cinema da Universidade Federal de Goiás (UFG) Lisandro Nogueira, a resposta para essa questão é um pouco incerta. “Mas, a gente sabe que um filme se torna clássico quando vai passando o tempo e ele continua agradando novas gerações”, explica. E Casablanca não decepcionou nesse aspecto.O longa apareceu na lista dos 40 filmes mais vistos de todos os tempos, criada em 2013, pelo IMDb (uma das maiores base de dados sobre cinema), e na lista de 2020 dos filmes mais populares de cada década segundo a Letterboxd (uma rede social baseada em cinema), além de estar presente na seleção do New York Times dos mil melhores filmes de todos os tempos.Segundo o professor, Casablanca consegue atrair o público ao longo de diferentes gerações por sua narrativa melodramática, que desperta uma nostalgia em tempos de pragmatismo, por meio da ideia de que o amor romântico é possível. “A ideia que está dentro do melodrama é que os amores, na verdade, nunca acabam, apenas ficam suspensos”, comenta.EnredoSituado em meio a Segunda Guerra Mundial, Casablanca conta a história de Rick Blaine (Humphrey Bogart), um norte-americano impedido de voltar aos Estados Unidos por conta do seu passado, que se estabelece na cidade marroquina Casablanca, onde possui um badalado café. Rick’s Café é frequentado tanto por nazistas, quanto por policiais franceses e refugiados da guerra.Apesar da diversidade do público de seu estabelecimento, Rick demonstra uma postura quase apática quanto à situação dos seus clientes, defendendo várias vezes que “não arriscava o pescoço por ninguém”. Mas isso muda quando um grande amor do passado, Ilsa Lund (Ingrid Bergman), adentra a porta do café ao lado do seu marido Victor Laszlo (Paul Henreid), um herói da resistência caçado pelos nazistas.Além da narrativa envolvente, o longa possui uma fotografia preto e branco com influência no expressionismo alemão da década de 1930, que utiliza uma estética de luz e sombra para realçar aspectos mais subjetivos do ser humano, como sentimentos de angústia e medo. A vertente fotográfica foi levada aos Estados Unidos por técnicos que fugiram do regime do Terceiro Reich. A música As Times Goes By, de Herman Hupfeld, escrita em 1931, e o elenco escolhido para o filme também são outras grandes qualidades do filme apontadas pelo professor.Propaganda políticaSegundo Lisandro, a partir da década de 1930, Hollywood foi usada como uma poderosa máquina de propaganda política, de onde saíam filmes que defendiam os ideais norte-americanos durante a guerra, e a obra de Michael Curtiz não foi diferente. “Casablanca foi um filme de combate contra o nazismo”, explica o professor.A primeira exibição do filme foi antecipada para coincidir com o dia em que as tropas dos Aliados – formadas pela França, Inglaterra, URSS e Estados Unidos – tomaram o poder da estratégica cidade marroquina Casablanca das mãos dos nazistas. O longa-metragem foi exibido pela primeira vez em 26 de novembro de 1942, em Nova York, para aproveitar a publicidade vinda da invasão. Menos de um mês depois, o filme chegou aos cinemas brasileiros.Na Europa, porém, o filme demorou a ser exibido devido à guerra. Na Itália, ele estreou em 1946, na França, em 1947, na Áustria, em 1948, e na Alemanha Ocidental, apenas em 1952, em uma versão com cortes. “O filme quando foi lançado não fez sucesso imediatamente”, ressalta o professor, “ele vai fazer sucesso a partir de 1944, quando é reconhecido. E depois quando acaba a guerra, aí sim que ele começa a pegar um voo que vem até hoje”.CuriosidadesUm dos aspectos da propaganda política do filme é a diversidade do elenco, apenas três atores creditados no filme eram nascidos nos Estados Unidos: Humphrey Bogart (Rick), Dooley Wilson (Sam) e Joy Page (Annina). Ingrid Bergman (Isla) era sueca, Paul Henreid (Victor) era austríaco, Claude Rains (Capitão Louis) era inglês, Madeleine LeBeau (Yvonne) era francesa, e Conrad Veidt (Major Heinrich), alemão. Além do próprio diretor, Michael Curtiz, de origem húngara.O roteiro de Casablanca é outra curiosidade da obra cinematográfica. Adaptado da peça Everybody Comes to Rick’s, de Murray Burnett e Joan Alison, o roteiro do filme foi terminado praticamente durante as gravações, sendo alterado várias vezes pelos gêmeos Julius e Philip Epstein e Howard Koch. Apesar disso, o roteiro de Casablanca foi eleito, em 2006, como o melhor de todos os tempos pelo Writers Guild of America, que reúne roteiristas de Hollywood.O longa também foi indicado em oito categorias no prêmio Oscar, em 1944, e levou três estatuetas: Melhor Filme, Melhor Diretor e Melhor Roteiro Adaptado.