Ao tentar descer os degraus, não sentia as pernas, precisou se segurar na escada. “Para respirar, doía. Eu sentia muitas, muitas pinçadas. Era na perna direita, era na perna esquerda”. O relato do cantor Wesley Safadão no programa Fantástico (Globo) da semana passada deu um susto em muitas pessoas, principalmente seus fãs, e a parcela da população que já lida com a hérnia de disco. Ele precisou passar por cirurgia para a retirada da hérnia, já que as funções motoras haviam sido atingidas. Os especialistas alertam para o caso, mas tranquilizam em relação a alguns pontos: o primeiro é que nem todos os casos precisam de intervenção cirúrgica. Na grande maioria, o tratamento consiste no uso de medicação e fisioterapia.A hérnia de disco é o desgaste do disco entre as vértebras (parte óssea), que se trata basicamente de uma cartilagem que permite que a coluna tenha mobilidade e amortece o impacto. “Quando esse disco é sobrecarregado por algum motivo, como esforço repetitivo ou sobrecarga mecânica, surgem pequenas rachaduras na parte fibrosa do disco e, com isso, a parte interna, chamada de núcleo pulposo, que é mais mole, pode sair do lugar e entrar pelo canal onde passam as raízes nervosas. Quando essa parte encosta em algum nervo, causa a dor”, explica o neurocirurgião Leonardo Zapata.A situação descrita acima é a mais usual, segundo o especialista. “Mas em alguns casos, quando sai uma quantidade muito grande de núcleo pulposo, pode gerar casos mais graves, que é chamada síndrome da cauda equina - que, além das questões envolvendo dor na perna ou perda de força, o paciente pode apresentar alterações no esfíncter. O quadro que o Wesley Safadão apresentou foi o princípio dessa síndrome e, por isso, foi possível abordar de forma mais imediata”, explica ele. Inicialmente, quando o cantor apresentava apenas dores, era possível tratar com medicação e com corrente de radiofrequência no local da dor, até que ele apresentou os novos sintomas, como as dormências na região da pelve.FatoresAlguns fatores podem influenciar o surgimento da hérnia de disco, como a genética. Os hábitos de vida, no entanto, são fundamentais. “Mesmo que a pessoa não tenha um histórico familiar ou um canal onde passam as raízes nervosas da coluna mais estreito, se ela não tiver uma boa postura, passa muito tempo sentada, não faz atividade física (causando flacidez da musculatura que sustenta a coluna), o disco vai se desgastando cada vez mais”, aponta o neurocirugião.A advogada Fernanda Berger, de 33 anos, que o diga. “Eu passo muito tempo sentada no trabalho e ainda bordo nas horas vagas. Tudo isso exige muito da minha coluna e a minha postura já não é muito boa”, conta. As dores nas costas já eram constantes no seu dia a dia, mas eram suportáveis. Certo dia, passou muitas horas fazendo faxina em casa. “Abaixando o tempo todo para torcer o pano no balde, esse tipo de coisa. À noite, entrei na minha aula de funcional e tivemos exercícios que exigiram mais da lombar. Cheguei em casa com muita dor”, lembra.No dia seguinte, ela mal se movia. “Estava até me dando falta de ar. Meu marido observou que na região da minha lombar estava inchado e fomos para o pronto socorro”, diz.Na primeira avaliação, o médico disse que era uma contratura muscular e passou antiinflamatório e relaxante muscular. A dor melhorou, mas não cessou por completo. Passou por um ortopedista que pediu uma ressonância da coluna. Resultado: hérnia de disco. “Ele me explicou que as pessoas podem ter problemas de coluna, mas não ter hérnia de disco, assim como podem ter a hérnia e conviver sem dor. O que vai nos fazer sentir a dor é sobrecarregar a coluna”, conta.Tratamentos“O tratamento conservador (não cirúrgico, ou seja, medicação e fisioterapia) é indicado e resolutivo na grande maioria dos casos. O intuito da fisioterapia é ajudar o paciente a retomar as suas atividades funcionais do dia a dia”, explica a fisioterapeuta Juliane Leite Orcino.A especialista explica que a hérnia de disco tem um processo natural de resolução, em que a crise de dor do paciente vai se atenuando em algumas semanas. “Já se sabe também que o repouso absoluto não é indicado e é até maléfico. O papel do fisioterapeuta, então, é auxiliar esse paciente a manter suas atividades de vida diária através de técnicas analgésicas e exercícios ativos, evitando que essa dor se torne crônica”, aponta.Ela diz que não existe propriamente uma modalidade esportiva mais indicada para esses pacientes. “Os estudos mostram que para bem-estar não existe modalidade superior. A melhor modalidade é a que o indivíduo gosta e vai realizar com mais constância”, diz.O tratamento com fisioterapia é indicado, ainda, nos casos cirúrgicos. “Conseguimos preparar esse paciente no pré-operatório, trazendo mais conforto e preparando a musculatura para que o retorno pós cirúrgico seja mais rápido. Após a cirurgia, acompanhamos o paciente de perto para trazer mais segurança ao retorno da vida, reforçando o que pode e o que não pode ser feito em cada fase da reabilitação”, diz.Entenda a hérnia de discoO médico ortopedista Fernando Balsimelli, especialista em cirurgia da coluna, responde dúvidas sobre a hérnia de disco.1. Quais os principais fatores? Existe prevenção?A hérnia de disco pode ocorrer secundária a um desgaste natural do disco intervertebral da coluna. Normalmente ocorre em pacientes adultos jovens. Acredita-se que fatores genéticos podem influenciar diretamente no aparecimento das hérnias, portanto, familiares de primeiro grau com hérnia de disco apresentam um fator de risco para desenvolver um desgaste natural acelerado da coluna, bem como o aparecimento de hérnias. Fatores para prevenir ou retardar o aparecimento das hérnias inclui o fortalecimento muscular focado na musculatura paravertebral, abdominal e dos quadris.2. Quais os principais sintomas? A dor lombar ou cervical é a principal queixa do paciente com hérnia de disco lombar ou cervical, chamada também de dor axial. Essa dor pode vir associada a dor por compressão dos nervos que estão na coluna, sendo conhecida como dor ciática (radiculopatia) nos casos em que ela tem origem na lombar e irradia para os membros inferiores, podendo chegar até os pés. Outros sintomas como formigamento, dormência e sensação de alfinetadas podem vir associados. O paciente deve ficar atento a sinais como febre, dor noturna, perda de peso, alterações do hábito intestinal e bexiga (com retenção ou perda urinária). As alterações urinárias acompanhadas de dormência nas pernas e perda de força nos membros inferiores pode chamar atenção para a síndrome da cauda equina, situação que requer tratamento imediato por compressão da hérnia sobre as estruturas nervosas.3. Quem tem hérnia pode fazer atividade física? Pode, principalmente voltada para o fortalecimento da musculatura paravertebral, abdominal e membros inferiores. Essa atividade deve ser supervisionada e preferencialmente sem impacto ou sobrecarga na coluna (salto, agachamentos). Atividades de baixo impacto como hidroginástica, por exemplo, são inicialmente recomendadas. Idealmente, o paciente não deve estar em crise de dor para praticar exercícios.4. Que tratamentos podem ser indicados? A abordagem inicial ao paciente com hérnia de disco sintomática consiste em tratamento medicamentoso com analgésicos, anti-inflamatórios, corticóides e relaxantes musculares, associado ao tratamento físico analgésico com fisioterapia e acupuntura. A terapia física sem impacto pode auxiliar na fase assintomática para evitar a recorrência das dores.5. Quando é preciso recorrer à cirurgia?Os casos cirúrgicos ficam reservados aos pacientes que não respondem ao tratamento conservador (remédios, fisioterapia e acupuntura), ou àqueles que apresentam algum sinal de urgência neurológica como a síndrome da cauda equina, perda de força motora, dor intratável. Lembrando que cada caso deve ser avaliado por um médico especialista para avaliar a melhor tomada de conduta.Leia também:- OMS decreta varíola do macaco como emergência internacional- Harmonização facial exige cuidado com os exageros-Imagem (Image_1.2497025)