Quando Kimitake Hiraoka nasceu em Yotsuya-Ku, distrito de Tóquio, em 14 de janeiro de 1925, pouca gente poderia prever o abalo que aquela criança traria para a vida cultural e política de seu país. Na verdade, o próprio Japão não tinha como suspeitar de que seria palco de tantos acontecimentos dramáticos que afetariam em cheio não só aquele bebê, mas gerações inteiras. Era como se um destino, ritualístico e trágico, já estivesse traçado para toda a nação, mas especialmente para o menino que se tornaria um homem de princípios imutáveis, de ódios profundos, rancores incontornáveis e de um talento raro para a literatura. Para esconder sua vocação do pai, ele mudaria seu nome para Yukio Mishima e com essa identidade assinaria uma produção cheia de nuances e obsessões. Em romances, peças de teatro, ensaios e em performances públicas nas artes, na fotografia e no cinema, Mishima foi um homem que jogou-se em seu imaginário de uma maneira intensa, calculada e polêmica. No Brasil, boa parte dessa produção está em catálogo e o interesse por ela só aumenta, mesmo com a marca de sua morte trágica e controversa. No segundo semestre de 2024, iniciando as celebrações do centenário de seu nascimento, o selo Companhia das Letras lançou uma nova tradução de Morte em Pleno Verão, obra na qual o escritor aborda alguns elementos centrais de sua literatura complexa e contraditória em muitos aspectos, mas também bastante coerente em outros. Mesmo nos seus defeitos e em suas qualidades, é complicado enquadrar esse homem atormentado.