Como disse minha amiga Denise Godoy, que vai comigo na viagem, “de tanto o povo me mandar pra Cuba a cada vez que eu mostrava simpatia pela esquerda, acabei resolvendo obedecer”. E é verdade que mandavam mesmo. “Achou um absurdo o Bolsonaro não comprar as vacinas contra a Covid a tempo? Vai pra Cuba!” “Você é a favor de desenvolvimento com justiça social? Vai pra Cuba!” “É contra as rachadinhas? Vai pra Cuba!!!”Então eu vou, já que sou cordata e bem mandada. Vamos ficar em Havana Velha, nalgum hotel limpo e simples. Nada de resort, iguais a todos do mundo. Quero olhar o jeito do povo, quero conversar (se der), quero ver os espetáculos, a salsa, os resquícios do Buena Vista Social Club. Quero pegar praia naquele mar que uns dizem ser Caribe, outros dizem ser Golfo do México, tomar mojito, ir onde o Hemingway ia, pra tentar ver o que ele via, tantos anos atrás.Meus netos provavelmente um dia vão dizer: “Minha avó era engraçada; ao invés de ir pra Miami onde toda velha comportada vai para fazer compras, ela resolve, do nada, ir conhecer Cuba naquela pobreza toda”.E eu direi, se ainda estiver viva: Fui mesmo e não me arrependo. Vi um outro jeito de viver, vi um país diferente. Se foram bem-sucedidos? Não sei, talvez sim, talvez não. Mas é a história, é o que quero entender bem de perto.Minha amiga Denise - bem mais que eu, na verdade - pesquisou bastante todo o lado prático da questão: hotel, passagem, passeios na ilha, horários. E vamos para Lima primeiro, por uns dois dias, depois Havana; Varadero; retorno a Havana, e voo de volta para o Brasil.Viajar me enche de ansiedade. Diz a Maria minha filha que meu lado caseiro reclama muito de ter de deixar a casa. Fico meio fora do ar. Acontece que é muito tempo, porque em seguida vou direto para Vitória passar dez dias com o meu filho Rafael.Toda vez que volto pra casa juro que não vou mais sair, volto com antipatia de avião, aeroporto, tudo, mas depois, com o passar do tempo, alguma coisa acontece no meu coração e lá vou eu de mala e cuia por esses mares, por essas estradas, por essas nuvens.Na última viagem que fiz, fui a Lisboa e Madri, périplo que tentei descrever o melhor que pude para vocês. Agora Cuba, que surgiu de uma conversa, de um desejo meio antigo. Agora Cuba, que só conheço de ouvir falar e por intermédio da literatura, não muita (li há muitos anos um livro de poemas de Nicolas Guillén, afrocubano, muito bom; de Guillermo Cabrera Infante li o mais conhecido Três Tristes Tigres, maravilhoso; de Reinaldo Arenas também li apenas Antes que Anoiteça e, mais recentemente, conheci alguns escritos de Leonardo Padura, de quem adorei O Homem que Amava os Cachorros). A literatura é rica, a música também. Mas prefiro ir sem nenhuma expectativa, sem nenhuma ideia pré-concebida. Afora a simpatia e a solidariedade que tenho com o povo de lá, viajo desarmada, pronta para o que encontrar.Problema pra mim vai ser a língua. Detesto falar feito uma idiota, gaguejando, sem poder me expressar direito. Espanhol deveria ser aprendido na escola. É outra língua. Parece com a nossa, mas é outra. Eu consigo entender bastante, mas não sei falar. E todo mundo sabe que eles não entendem bem o português.Dessa vez não sei se o inglês poderá me salvar, especialmente se não houver muitos falantes dessa língua bárbara que há mais de século domina o mundo e que calha de ser a única que sei falar, além do goianês.Minha avó era quem dizia: “Boa viagem faz quem em casa fica em paz”. Veremos, avozinha. Algo me diz que vai ser bom.