Quando a estupidez coletiva me esbofeteia, agressão que se tornou comum de 2018 para cá, tenho ganas de me trancar num quarto escuro e, em posição fetal, chamar a mamãe. Se resisto às últimas instâncias do desespero, é por um raciocínio ingênuo para um sujeito de 52 anos, já grandinho para ter esperança. Lembro, num esforço para não desistir da humanidade: o mesmo bicho que festeja 7 de setembro enrolado numa bandeira dos Estados Unidos, ou acha que corrupção tem lado, também é capaz de coisas estonteantemente belas, como o xadrez. Se houve algum projeto celestial para evoluirmos de uma molécula primordial até esse cérebro complexo, escravo de prazeres, certamente foi para desaguarmos nesse tabuleiro de 64 casas, onde cabem todas as dimensões da vida. Isso que os indianos inventaram no Século 6 é uma metáfora quase literal da existência, porque propõe projetos em conjunto sem jamais alimentar a ilusão da igualdade. O espaço que há diante das peças é o mesmo, mas as possibilidades de movimentação são limitadas na largada – exatamente como em nossas estruturas sociais.