O ex-ditador peruano Alberto Fujimori morreu semanas atrás. Eis um ótimo pretexto para ler Peixe na Água (tradução de Heloisa Jahn, Cia. das Letras), livro memorialístico de Mario Vargas Llosa. Mais conhecido como (excelente) ficcionista, premiado com o Nobel de Literatura, Vargas Llosa foi candidato à presidência do Peru em 1990, tendo Fujimori como adversário. Peço licença para transcrever um longo trecho sobre as táticas eleitoreiras no parágrafo seguinte. “A história dos impostos era uma das diversas manobras para desacreditar-me com que o governo tentava impedir o que àquela altura parecia um triunfo esmagador da Frente Democrática. Uma delas me apresentava como pervertido e pornógrafo: a prova disso seria meu romance Elogio da Madrasta, que foi lido inteiro, à razão de um capítulo por dia, pelo canal 7, do Estado, no horário de audiência máxima. Uma apresentadora, dramatizando a voz, avisava às donas-de-casa e mães de família que retirassem as crianças da sala pois iam ouvir coisas nefandas. Em seguida, um locutor passava a ler o capítulo, com inflexões melodramáticas nos momentos eróticos. Depois realizava-se um debate em que psicólogos, sexólogos e sociólogos apristas me analisavam. Minha vida era um corre-corre tão grande que, evidentemente, eu não podia dar-me ao luxo de assistir àqueles programas, mas uma vez consegui acompanhar um deles e achei tão divertido que fiquei plantado na frente do televisor ouvindo o general aprista Germán Parra desenvolver a seguinte reflexão: ‘Segundo Freud, o doutor Vargas Llosa deveria estar tratando da mente’.”