Posso contar nos dedos de uma mão os momentos em que tive muito orgulho de meu país, mas muito orgulho mesmo, mandando às favas todo o resto, e sem maiores considerações. Estou falando de orgulho das atitudes, de atos, e não das maravilhas da natureza, que temos pra dar e vender.Um desses momentos gloriosos, em minhas lembranças, foi a Copa do Mundo de 1970. Em plena ditadura militar, com Garrastazu Medici, aquela doce criatura, no poder, a gente meio que sabendo das torturas e desaparecimentos, mas impotentes para fazer qualquer coisa, e a seleção brasileira vai lá e ganha a Copa! Foi demais!Sempre fui torcedora bissexta, acho que nem bissexta sou mais, porém me lembro bem da final, com gol de Jairzinho e outro de Carlos Alberto. E me lembro principalmente da alegria, da alegria que tomou conta do Brasil inteiro. Foi uma festa, das maiores que já vi, e é claro que os milicos se aproveitaram para parecer que a vitória era prerrogativa deles, mas esta já é outra história.Não que ao longo da vida não tenham acontecido outras coisas boas, claro, sempre haverá coisas boas, muitas vezes ofuscadas pelas más, e então eis que agora, de repente, mais precisamente no dia 11 de setembro - sempre lembrado pela tragédia das torres gêmeas de Nova York -. o Supremo Tribunal Federal brasileiro condenou um ex-presidente, três generais e um almirante golpistas.Pelo que tenho lido e acompanhado, o mundo inteiro está admirado com o Brasil, como os torcedores amantes do futebol ficaram encantados com a seleção brasileira em 1970.Dessa vez foram cinco jogadores em campo, quatro varões e uma “fraquejada”, que nos deram essa demonstração de coragem e altivez. Especialmente ela, a ministra Carmem Lúcia, a única mulher, a representante das brasileiras de todas as partes, que apresentou, com conhecimento, graça e brilhantismo, o voto que condenou os que queriam anular a vontade do povo, que elegeu o Lula presidente em 2022.Aqui do meu canto, assisti o quanto pude ao espetáculo, me poupando da retórica confusa e inconsistente do Fux, que ficará na história como o ministro do rabo preso.Foi de goleada. Quatro bons cidadãos brasileiros, com técnica, com provas e com lucidez decidiram o placar a nosso favor e fizeram o que deveria ter sido feito lá atrás, com relação a outros golpes e outros arbítrios e outras diversas dores que já enfrentamos.Brilhante Ustra, por exemplo, monstro de sadismo e perversidade, deveria ter pago por seus crimes. Não só ele, mas todos que infligiram sofrimento a quem divergia ideologicamente deles (e com os Estados Unidos dando força, como sabíamos, treinando a polícia brasileira na arte da tortura, no seu desvario contra o “comunismo” que eles insistiam em usar como desculpa para massacrar os que se opunham).Dessa vez, os golpistas de sempre tentaram, mas não conseguiram. E serão punidos. Graças a Deus, graças ao voto decisivo da ministra Carmem Lúcia, graças a sua técnica impecável, os defensores da democracia no mundo puderam celebrar.Os problemas não acabaram, diga-se. Não somos um país escandinavo, bem resolvido e feliz. Temos muita coisa pra amargar - noticias escabrosas nos chegam de Brasília.Nem sempre podemos ficar contentes com o rumo das coisas. Mas valeu demais a vitória da democracia, com a condenação desses conspiradores das sombras.Para nunca esquecer.Saravá.