Devo viajar para a Inglaterra na semana que vem. Qualquer viagem já me deixa transtornada, semi-enlouquecida, que dirá para tão longe e depois de mais de 40 anos de ausência. É bom viajar, mas comigo mexe muito. Não é medo, é uma espécie de culpa. Desde pequena sou assim. Quando era menina e a gente morava no Conjunto Lar Brasileiro do Setor Sul, às vezes, por eu ser a mais velha, era escolhida para viajar com minha tia, ou minha madrinha. Minhas irmãs, que eram mais novas, não iam junto, ficavam em casa. Eu me lembro que adorava ir viajar, mas ao mesmo tempo sentia essa culpa e essa dorzinha porque minhas irmãs não iriam.Qualquer viagem e eu já fico meio atrapalhada, meio desorientada mesmo. Agora é Inglaterra, e lá eu morei três anos com meu marido e dois filhos que tinham 1 e 3 anos de idade, quando fomos. Lá, já sei que algumas coisas vão doer, por causa da saudade.Mas o que é a vida senão isso, dor e alegria, alegria e dor? No meu caso, e no que diz respeito a esse passeio, será um périplo muito mais dentro de mim mesma do que qualquer outra coisa.Mas a Inglaterra também com certeza mudou muito ao longo desses anos. Como não mudaria? O mundo inteiro mudou. Haverá muita novidade primeiro-mundista.Bom, já preparei as fotos dos netos para mostrar pelo caminho, a quem interessar possa. Sou dessas avós que não perdem a chance de mostrar foto de neto.Um dia desses falei para uma moça no salão onde aparo o cabelo: vou te mostrar a foto da Cecília (caçula das minhas netas). Aí ela: “Você já me mostrou”. Quer dizer, não é toda hora que se acha alguém disposto a olhar e falar “Que linda!”, que é o que espero toda vez.Voltando à viagem que me aguarda, estamos indo minha nora, meu filho e eu. Ele já desenvolve uma pesquisa lá, é a terceira vez que vai (é físico, como o pai), num centro de pesquisas, perto de Oxford, que, por sua vez, é perto de Londres.Vamos a Sheffield, onde vivi, e minha comadre, que mora perto de Glasgow, vai me encontrar lá, em Sheffield, onde nos conhecemos e ficamos amigas. Ela é americana casada com um inglês descendente de escoceses, e foram nossos meninos - da mesma idade - que começaram a brincar no parque de frente ao hotel onde me hospedei nos primeiros dias. Daí começamos a conversar, depois nos visitávamos, e quando ela teve o segundo filho me chamou pra batizar, o Noah.Enfim, lembranças e mais lembranças no pacote. E saudade. Tenho ameaçado para mim mesma desistir, a cada cinco minutos, como sempre. Mas já sei que no fim acabo indo mesmo, e termina dando tudo certo, God help us.Quando fomos da primeira vez, era a década de 70 do século passado. Pensem quantas coisas aconteceram desde então, especialmente no mundo da tecnologia. E nas vidas das pessoas também. Alguns conhecidos daquele tempo, como os professores da universidade, não posso afirmar com certeza, mas já devem ter morrido todos. Já eram bem mais velhos do que nós, naquele tempo.A Margareth Thatcher é quem tinha sido eleita primeira-ministra, e aqui no Brasil os milicos ainda davam as cartas. Mas quando voltamos, daí a algum tempo começaram as Diretas Já. O resto todo mundo sabe.O pior pra mim está sendo levar mala pesada de roupa de lã pra passar poucos dias. Fora os remédios pra pressão alta, colesterol idem, glicemia alta idem ibidem, tranquilizante, canabidiol, um casaco pra chuva, outro de frio, bota, meia. Em dúvida aqui se levo minha cafeteirinha italiana porque sem café não tem nada que preste nessa vida. E vamos ficar num apartamento do Airbnb.Bom, isso é o que temos para hoje.Penso escrever sobre London, London na próxima crônica, assim como um dia escrevi sobre Cuba.Saravá.