Elza Soares celebra mais um ano de vida. “Eu não. Não sou muito chegada nessas coisas de aniversário. Gente, não gosto”, avisa a artista, em entrevista ao POPULAR. A idade é que o menos importa, mas mesmo assim tem festa. Uma das maiores vozes do Brasil completa nesta terça-feira (23) na certidão de nascimento 90 anos (não assumidos) de uma carreira marcada por sofrimento, luta e glórias – muitas glórias. Mesmo sem querer, a data não vai passar em branco e ganha uma trilha sonora nova. Elza lança sexta-feira, nas plataformas digitais, uma versão rock de Juízo Final (1973), samba de Nelson Cavaquinho.“É uma canção que gosto, acho bonita e consegui gravar do jeito que quis e sonhei. Ficou gostosa”, adianta. A idade realmente é apenas um detalhe quando se trata de Elza Soares. Voz-símbolo na luta contra o racismo, da violência contra a mulher e das desigualdades sociais, a cantora chega aos 90 anos com muita disposição. Desde 2015, com o disco A Mulher do Fim do Mundo – vencedor do Grammy na categoria de melhor álbum de música popular brasileira -, o ritmo de produção foi intensificado. Em 2018, ela lançou Deus É Mulher e, em 2019, Planeta Fome. A ideia é seguir com o pé no acelerador.A previsão para um novo álbum é ainda em 2020. “Pretendo, se possível for, lançar a cada seis meses”, adianta. Enquanto isso, em julho, Elza disponibiliza mais um aperitivo com a inédita Negão Negra, na qual a cantora divide os vocais com o rapper Flávio Renegado – que assina a composição com Gabriel Moura. Na letra, dura mensagem à onda de racismo que ganhou repercussão pelo mundo nas últimas semanas. “Pra cada um que cai choramos rios e mares/ mas nunca calaram as nossas vozes, milhares”, diz os versos. “Não posso acompanhar tudo isso calada. Eu tenho de gritar sempre”, ressalta.É o que Elza Soares vem fazendo ao longo da carreira. Em Planeta Fome, por exemplo, ela dialoga com os principais problemas do País, em tom apocalíptico. “Nessa terra maravilhosa tudo que se planta dá, até o que não presta”, avalia. No álbum Deus É Mulher, ela fala sobre empoderamento feminino, liberdade sexual e religiões africanas. O novo trabalho seguirá na linha do racismo e do momento atual que o mundo passa no combate ao novo coronavírus, caso de Juízo Final. “Como estamos atravessando esse período drástico, quis gravar essa música, que fala do momento em que o bem vence o mal”, completa.Isolada em seu apartamento, em Copacabana, no Rio de Janeiro, Elza Soares conta que não descuida da saúde nessa quarentena e que aproveita o tempo para cuidar do corpo e para produzir o novo disco e também não desliga a TV nunca. “Eu venho fazendo fisioterapia, estou vendo bons filmes de bangue-bangue, que gosto, e curtindo os meus netos e a minha família”, conta. A última vez que a cantora apresentou-se em Goiânia foi em setembro de 2016, com a turnê do álbum A Mulher do Fim do Mundo, que ela – assim como a crítica especializada - considera o melhor trabalho da carreira.AniversárioCelebrar o aniversário da poderosa artista nunca foi uma missão fácil para os fãs e para os críticos de música que sempre arriscaram palpites. O nascimento da cantora já virou folclore tanto que nem mesmo o biógrafo oficial, o jornalista Zeca Camargo, conseguiu desvendar o mistério no livro Elza, de 2018. Para a reportagem, Elza diz que tem duas datas importantes. Na identidade, é 23 de junho, quando foi emancipada, e o nascimento em 23 de julho. “Mas não celebro nenhuma”, afirma ela, que pediu na entrevista para não ser chamada de senhora. “Me chame de Elza, você ou mulher.”Nas redes sociais, a cantora disse que estão abertas oficialmente as comemorações do aniversário e que dessa vez pretende celebrar, mas sem ficar contando idade. “Não sou muito de falar disso, mas esse é um ano diferente e quero brindar a vida. Quantos anos tenho? Vários! Não parei pra contar. São nove décadas, mas, quer saber, tem dias que nem nasci, outros tenho a idade de Nefertiti. Sou menina ainda. Filha do século 21. Estou in love com esse momento que vivo, com essa oportunidade de cantar minha cor, com amor, cor e coragem, como diz a música Negão Negra”, postou no Instagram.Carreira Nascida na favela da Moça Bonita, em Padre Miguel, no Rio de Janeiro, Elza Soares iniciou a carreira quando ainda se apresentava em shows de calouros apresentado por Ary Barroso (1930-1964). Na época, mesmo sendo rejeitada em vários palcos, emplacou diversos sucessos, como Se Acaso Você Chegasse, Boato, Cadeira Vazia, Só Danço Samba, Mulata Assanhada e Aquarela Brasileira. Aos 32 anos, conheceu o jogador Garrincha, com quem foi casada, motivo pelo qual também sofreu preconceito e violência doméstica. Episódios difíceis sobre os quais, assim como a idade, ela prefere não falar. Na música, o que não falta são vitórias. Em 1999, ela foi reconhecida como a melhor cantora do milênio pela BBC e em 2019 teve a vida cantada no carnaval pela escola Mocidade Independente de Padre Miguel.