Para Waldomiro Bariani Ortencio, ser goiano é merendar pão, biscoito de queijo e catar os farelinhos sobrantes. É falar uai, curuiz, trem, sungar. É saber que o Araguaia é sua praia, “o rio mais lindo do mundo”. É não ser egoísta, e em nome do progresso, repartir suas terras com Brasília e Tocantins. É não ter pressa, mas montar no primeiro cavalo que passar arreado. “É acolher de coração aberto os irmãos de outros Estados, como fez comigo”, escreveu o folclorista em crônica publicada em maio de 2010. 
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<div class="p-readmore-box"><a href="https://conteudo.opopular.com.br/e-book-cronicas-do-bariani">- Clique aqui para baixar o e-book 'Bariani 100 Anos - Crônicas'</a> 
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Muitas são as histórias de um sertão profundo e misterioso de Goiás que o escritor sonhou em seus mais de 50 livros escritos ao longo da carreira. Bariani completou 100 anos no dia 24 de julho, e, em homenagem a um dos maiores nomes da cultura de Goiás, O POPULAR presenteia seus leitores com este livro digital que traz uma coletânea de crônicas publicadas no jornal ao longo dos anos. O presente faz parte das comemorações dos 85 anos do POPULAR.

Paulista de Igarapava, Bariani chegou em Goiânia aos 15 anos. Considerada na época um verdadeiro eldorado do progresso no meio do sertão do Brasil Central, a cidade é um dos principais alvos do escritor, mas ele vai além. Em suas crônicas, faz uma imersão ao Cerrado, apresenta o cotidiano de goianas e goianos, destaca costumes, paisagens e hábitos que apenas um autêntico “goiano do pé rachado” saberia reconhecer.

“Quanto mais se vive, mais se aprende e... morre-se sabendo quase nada. A vida é curta pra ser pequena”, escreveu Bariani em uma de suas crônicas. Os textos do autor reafirmam o seu caráter folclorista: o sertão, o calor e o sol forte ajudam na condução das histórias que discutem o valor do planalto central brasileiro no processo de ocupação do País.

O escritor, que viveu o esplendor da criação da então nova capital de Goiás em suas primeiras décadas, rompeu fronteiras musicais com a criação do Bazar Paulistinha, que produzia e comercializa trabalhos de artistas goianos para outros Estados. Foi também goleiro do Atlético Clube Goianiense, desafio dado pelo então prefeito de Goiânia Venerando de Freitas Borges. Emprestou sua portentosa residência modernista para eventos culturais e lançamentos literários.

“Existem dois tipos de bobos: os que empresta livros e os que devolve”, brincou o autor em entrevista ao POPULAR em 2018. Bariani hoje não escreve mais. A rotina é ocupada em ficar na sala de sua casa, no primeiro andar, observando o corre-corre da calçada e da vista de sua casa, a Praça Cívica. O Instituto, que leva seu nome, ainda tem livros a serem editados e publicados. “Ser goiano é ser de paz, dar um boi para não entrar na briga, mas uma boiada para não sair. Ser goiano é bom demais da conta”, reitera.

Venha com a gente se deliciar com os textos que falam sobre o que é ser goiano. Você vai rir e se emocionar. O e-book Bariani 100 Anos - Crônicas pode ser baixado gratuitamente<a href="https://conteudo.opopular.com.br/e-book-cronicas-do-bariani"> aqui no site do POPULAR</a>. Esta é uma homenagem que tinha de acontecer, como diz a palavra em árabe que o escritor gostava de usar ao fim de cada prosa: Maktub!

POPULAR traz livro digital gratuito com crônicas de Bariani Ortencio

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Prosa

O corre-corre do trânsito e os prédios que foram erguidos em seu entorno podem até desfocar a paisagem da portentosa casa vizinha da Praça Cívica. O imóvel de 1962 não é a primeira construção residencial do estilo surgida na capital, mas é uma das poucas que ainda se mantém de pé. Antiga morada do escritor Bariani Ortencio, morto em dezembro de 2023, o local que guarda um rico acervo literário segue com futuro incerto.

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Assinada pelo arquiteto Eurico Calixto de Godoi, o mesmo do prédio da antiga Assembleia Legislativa e do Parque Mutirama, a casa resiste ao tempo e sofreu poucas modificações em seu projeto original. A residência está da mesma forma como Bariani deixou: os livros sob a mesa da biblioteca, o museu musical dos tempos do Bazar Paulistinha e o fogão à lenha que se destaca perto do jardim.

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(Wildes Barbosa / O Popular)

“A vontade é que a casa se torne um espaço aberto à população, como um centro cultural e de pesquisa. Queremos preservar o legado artístico que a residência manteve durante todas as décadas”, aponta a jornalista Nancy Ortencio, filha de Bariani. Ao lado dos irmãos e irmãs, a goiana explica que os herdeiros do imóvel já receberam algumas propostas de compradores, como escritórios de advocacia, mas ainda aguardam ideias de parceiros e instituições que desejem manter o local como um ponto de cultura.

Ao longo de décadas, a antiga morada de Bariani foi o lugar de encontro para escritores e escritoras, músicos e artistas plásticos, políticos e jornalistas. É no imóvel que está abrigado o Instituto Bariani Ortêncio. O escritor manteve as portas abertas para alunos da rede de ensino e pesquisadores da cultura e arquitetura.

Nas paredes, murais de fotos mostram as diversas personalidades que passaram pelo imóvel, como Lindomar Castilho e Iris Rezende. A rica biblioteca guarda um acervo que só existe ali, com mais de 3 mil títulos apenas sobre Goiás. A estimativa é de um total de 10 mil livros raríssimos. “São tantos livros, objetos, discos, que não temos nem para onde levar a quantidade de coisas. A própria casa é um legado vivo que meu pai sempre manteve preservado. O que queremos é que a residência siga com o propósito de estar aberta a todos os goianos”, destaca Nancy.

Perto dali, na Av. 84, a casa modernista projetada pelo arquiteto David Libeskind - o mesmo do Conjunto Nacional, em São Paulo - abrigou durante muitos anos a sede do Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional de Goiás. Depois que o órgão deixou o endereço, a residência ficou parada até se tornar a Cerrado Galeria, com adaptações arquitetônicas feitas pelo arquiteto Leo Romano.

“A Cerrado devolveu para a cidade um patrimônio revigorado. É um exemplo da iniciativa privada fazendo seu papel de resgate. Que sirva de exemplo para outros elementos arquitetônicos de Goiânia”, reiterou o profissional durante a abertura do espaço, no ano passado. Para os herdeiros de Bariani, o exemplo da casa modernista de Libeskind caiu feito luva no que pode ser pensado para a antiga morada do escritor.

<h2>Vizinhança </h2>

Com endereço privilegiado, a residência está no meio de uma área cultural que diz muito sobre memória e patrimônio. Em frente dali, a Praça Cívica guarda, por exemplo, o Museu Zoroastro Artiaga, fechado para reforma, e o Museu da Imagem e do Som. Está próximo também da Casa Pedro Ludovico e ao lado da Casa Rosada do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG).

“Estamos fazendo uma campanha para que a casa que um dia habitou o folclorista Bariani Ortencio seja adquirida por uma pessoa que tem o desejo de preservá-la e dar um uso cultural. Não podemos deixar em mãos de alguns que, eventualmente, possam descaracterizá-la”, comenta o promotor de Justiça Jales Mendonça, presidente do IHGG. “A residência está inserida dentro de uma localidade que pode se tornar um polo cultural importantíssimo para Goiânia”, completa.

Ao lado da Casa Rosada, o Sesc Goiás adquiriu um imóvel para a construção futura de uma unidade vocacionada à cultura. O projeto, ainda embrionário, está em desenvolvimento e a expectativa é que seja executado em 2026. Atualmente, o local funciona de forma temporária como uma unidade do Sesc MED, com foco na saúde do trabalhador do comércio. “Estamos em negociação com imóveis vizinhos para ver se ampliamos o terreno”, adianta o diretor Leopoldo Veiga Jardim.

Para o presidente do Conselho Estadual de Cultura, Carlos Willian Leite, manter a casa onde Waldomiro Bariani Ortencio morou é, acima de tudo, assegurar que a riqueza cultural de Goiás - única e de valor incalculável - não se perca. “Bariani foi um homem múltiplo, e sua casa permanece como um legado vivo de suas contribuições. O acervo histórico-sentimental preserva milhares de fotos, documentos e objetos e, sem dúvida, o mais rico repositório da literatura goiana”, argumenta.

<h3>Modernismo à goiana&nbsp;</h3>

Apesar do pulso e ideais do movimento art déco fundamentais para os primeiros traçados e edifícios públicos da então nova capital de Goiás, o modernismo marca a chegada de uma nova era de modernidade na cidade. A casa que serviu de morada para o folclorista Bariani Ortencio diz muito sobre o movimento em Goiânia.&nbsp;

"As plantas, modelos estéticos de fachada, material construtivo e até mesmo estrutura das residências modernistas apresentavam conceitos baseados na “nova era” de modernidade vivida naquele momento, uma completa inovação do modo de morar", aponta a pesquisadora Renata Lima Barros, doutora em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Em suas pesquisas, a estudiosa investiga as casas históricas erguidas na região central da cidade.&nbsp;

O projeto da residência de Bariani assume a horizontalidade característica na obra de Eurico Godoi, com implantação longitudinal com volumetria prismática em forma de "L" em dois pavimentos. "As casas modernistas caracterizam-se pelo uso da forma pura, ausência de ornamento, fechamentos em vidro, o uso de pé direito duplo, planta-livre com terraços e pátios, grandes escadas de acesso e a valorização de materiais como o concreto e o ferro", explica a pesquisadora.

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Prestes a completar um ano da morte de Bariani Ortencio, casa do folclorista segue com futuro incerto

Patrimônio Vivo

Waldomiro Bariani Ortencio trabalhou até os dias em que não conseguia mais descer até o escritório instalado no primeiro pavimento de uma portentosa casa localizada na Rua 82, Setor Sul. O último livro deixado em vida foi a reedição de seu clássico Medicina Popular do Centro-Oeste (Editora Kelps), que será lançado na quinta-feira (5), no hall do Teatro Goiânia. A data também celebra a entrega dos prêmios do Concurso Literário de Redação que o escritor e folclorista dá nome, organizado pela Secretaria de Estado da Educação (Seduc).

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A edição especial foi idealizada e coordenada por Beto Selva que está atualmente à frente do Instituto Cultural e Educacional Bariani Ortencio (Icebo) com colaboração do escritor Renato Castelo na revisão textual. O livro apresenta um painel especial feito pela artista plástica Helena Vasconcelos. “A obra mantém viva em quase 500 páginas a pesquisa desenvolvida por Bariani ao longo de 40 anos, destacando as queixas sobre doenças e curas caseiras com receitas que incluem plantas, ervas, benzeções, simpatias e magias”, explica Beto.

Medicina Popular do Centro-Oeste foi publicada pela primeira vez em 1990 e, junto com A Cozinha Goiana (1967) e o Dicionário do Brasil Central (1983), formam a tríade do Comer, Falar e Curar, as obras mais famosas do folclorista. Para adaptar o conteúdo aos novos tempos, Beto precisou reorganizar e adaptar alguns fragmentos do livro para a atual forma de se pensar a medicina. Nas páginas, Bariani apresenta os saberes populares e os poderes das raízes, folhas, caules, frutos e cascas.

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“Além das receitas, há ainda crônicas, muitas publicadas no POPULAR, que trazem o entendimento cultural de como Bariani olhava e ajudava a entender a identidade goiana. O texto do autor tem pitadas de humor e um jeito que apenas ele conseguia pensar e escrever sobre os hábitos culturais de Goiás”, explica Beto, que luta para manter preservado o legado do Icebo.

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Produtor e gestor do Instituto Bariani Ortencio, com livro que ganha nova edição (Diomício Gomes)

<h2>Concurso</h2>

O lançamento do livro também se junta à entrega dos prêmios da 8ª edição do Concurso Literário de Redação, da rede pública de ensino do Estado. Os alunos do ensino médio foram desafiados a pensar as obras de Bariani, a exemplo do clássico Sertão sem Fim (1965), em três categorias: produção literária, produção cênica e artes visuais. Mais d©e 50 mil alunos participaram do concurso e, agora, os 120 estudantes de destaque participam da cerimônia de premiação.

Os alunos que passaram na primeira seleção receberão certificados, medalhas, kit de livros e terão suas produções publicadas em e-Book. Já os nove estudantes finalistas e seus respectivos professores receberão um tablet e kit livros. As unidades escolares dos alunos finalistas receberão troféus. “Bariani sempre deixou bem claro em vida que tinha uma preocupação com o futuro das crianças e adolescentes. Não por menos, visitava escolas, abria a casa e a biblioteca para os alunos. O prêmio serve como forma de que as próximas gerações entendam e saibam a importância dele para Goiás”, reitera Beto Selva.

O folclorista morreu aos 100 anos em sua casa no Setor Sul em dezembro do ano passado. Além de ter sido cronista durante anos do POPULAR, Bariani escreveu mais de 50 títulos, foi produtor musical, goleiro do Atlético Clube Goianiense e defensor da natureza e do Bosque dos Buritis, por quem tinha um apreço fiel.

Clássico de Bariani Ortencio ganha nova edição

Legado

A imagem do folclorista Bariani Ortencio sentado na janela de sua portentosa casa em frente à Praça Cívica já não é mais vista por quem passa pela Rua 82. Desde o último dezembro, quando o escritor morreu, a residência modernista e sede do instituto que leva o seu nome passa por transformações para se adequar a uma nova realidade, agora sem o seu principal morador e comandante.

Bariani não é o único a deixar um imóvel com acervo riquíssimo. Quando morreram, diversas personalidades das artes e da política goiana dispuseram de residências que, de alguma forma, revelam parte da história de Goiás. É o caso, por exemplo, da Casa Cora Coralina, museu mais visitado do Estado e importante ponto de cultura da primeira capital. Já a antiga casa localizada na Rua 24, que pertencia ao escritor José Mendonça Teles, carece de recursos para uma possível transformação em museu.

Cada casa é um caso, mas em uma coisa há o consenso: é preciso promover a preservação de bens históricos, vide o último episódio de demolição da residência localizada no Setor Sul construída pelo arquiteto Luís Osório Leão. “Quantas memórias e histórias de outros tempos de Goiânia a casa de Bariani não revela?”, indaga o atual presidente do instituto, Beto Selva.

Com projeto assinado pelo arquiteto goiano Eurico Calixto de Godoi, a casa de Bariani foi erguida em 1962, em uma época que o modernismo explodia em ebulição. Ao longo das décadas, Bariani fez poucas alterações no imóvel e transformou o térreo em escritório, biblioteca e museu. Uma coleção com mais de 10 mil títulos raríssimos ainda está lá. Fotos, materiais audiovisuais, objetos e acervos históricos também ocupam a residência.

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“Queremos agora, nessa nova fase, criar formas de fazer com que o instituto permaneça aqui, na casa. Houve uma conversa entre os filhos de Bariani, que não querem vender a residência pra qualquer comprador que destrua a casa, queremos manter a preservação”,&nbsp;explica Beto. Quando vivo, era o próprio folclorista o financiador do instituto. Agora, o atual presidente e os outros colegas da associação, o artista Renato Castelo de Carvalho e a neta do folclorista, Luana Selva Ortencio, buscam formas de apoio na nova empreitada.

Parcerias públicas e privadas, incentivos por meio de editais públicos, eventos e publicações são algumas das ideias que os produtores almejam para os próximos meses. “Não quero que a memória do meu avô se perca com o tempo. A ideia é transformar a residência em um importante ponto de cultura e educação. Existem tantas possibilidades”, diz Luana.

Projetos 

Enquanto traça metas, cronogramas e diálogos com outros setores para um possível financiamento, Beto Selva prepara junto com os colegas do instituto a nova edição do Medicina Popular do Centro-Oeste, uma das pesquisas mais importantes deixadas por Bariani Ortencio. A ideia é fazer um lançamento em março no jardim da casa para levar vida e olhares para a residência.

Para perpetuar a tradição da escrita e pesquisa de Bariani, a Secretaria de Estado da Cultura (Secult Goiás) está elaborando o concurso Bolsa de Publicações Waldomiro Bariani Ortencio em níveis nacional e regional. “Não queremos que aconteça o que ocorreu com diversas casas do Centro e do Setor Sul. A memória da cidade tem sido apagada”, reitera Beto.

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Eu te vejo, Goiânia!

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Alessandra Teles na casa que pertenceu a seu pai, o escritor José Mendonça Teles (Diomício Gomes)

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Escondida entre árvores da Rua 24, a antiga casa que um dia já foi morada e escritório do autor José Mendonça Teles já não tem a mesma pompa de quando foi erguida, nos anos 1940. Quem toma conta agora é a filha do escritor, a artista visual Alessandra Teles, que tem feito o que pode para manter a residência de pé.

“Só aqui na rua eu assisti a diversas casas sendo demolidas. Eu não quero vender a residência tão importante para a cidade e que possui um acervo gigantesco da literatura goiana”, diz Alessandra, que doou parte do acervo de José Mendonça, com mais de 15 mil títulos, para a Fundação Cultural Frei Simão Dorvi, localizada na cidade de Goiás.&nbsp;

Muita coisa ainda ficou para trás. Há baús centenários, objetos pessoais de José Mendonça Teles, livros, jornais, uma radiola antiquíssima que ainda funciona, máquina de escrever, além de arquivos históricos de Goiás. Alessandra deseja transformar a casa em uma espécie de museu e escola de artes, mas, para isso, precisa de financiamento.

“Eu mesma estou restaurando parte da casa. Em 2020, pessoas em situação de rua entraram na casa e roubaram muita coisa, picharam, destruíram o acervo”, lamenta a artista. Para ela, existe uma falta de interesse pela memória do Centro de Goiânia. “Só quem mora aqui sabe o quanto a paisagem está mudando. De um dia para noite e pronto, mais uma casa derrubada. Eu sou uma resistente”, completa.

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Casarão que foi de Altamiro de Moura Pacheco hoje pertence à AGL (Diomício Gomes / O Popular)

 
Memórias, portas e janelas&nbsp;

Diversas residências espalhadas por Goiás ajudam a identificar a memória cultural dos goianos. O casarão de Altamiro de Moura Pacheco, por exemplo, localizado na Avenida Araguaia, no Centro de Goiânia, pertence atualmente à Academia Goiana Letras (AGL) e passou por um processo de restauro em 2020. Atualmente, o imóvel serve para reuniões e eventos da instituição.

Em estilo misto, o casarão pertenceu à personalidade da época Altamiro de Moura Pacheco, criador da atual Sociedade Goiana de Pecuária e Agricultura e doador de diversas terras para a construção da capital. Rodeado por mistérios, o goiano de Bela Vista de Goiás nunca se casou e tampouco teve herdeiros. Morreu em 1996, aos 100 anos. Três anos antes de sua morte, o médico cedeu o imóvel para a Academia Goiana de Letras (AGL), além de todo o acervo pessoal, como a biblioteca.

Há ainda o Instituto Bernardo Élis, localizado no Jardim América, antiga morada do imortal da Academia Brasileira de Letras. Por lá, é possível encontrar um rico acervo com cerca de 3 mil livros, documentos, anotações, objetos pessoais e fotografias do escritor. A casa fica aberta de segunda a sexta-feira, das 8 às 14 horas. Informações e agendamentos: 3142-8426.

 
 
CASOS EXCEPCIONAIS 
Confira abaixo três exemplos de casas que se tornaram museus de sucesso em Goiás 
 
Museu Casa de Cora 
As memórias da poetisa e doceira vilaboense estão espalhadas pelos cômodos da antiga casa da ponte, o museu mais visitado de Goiás. Sob administração da Associação Amigos de Cora, o museu pode ser visitado de terça-feira a sábado, das 9h às 16h40 e aos domingos até as 13h. Entrada: R$ 10 (pagamento apenas no dinheiro). 
 
Fazendinha JK 
Morada dos últimos anos de vida do ex-presidente Juscelino Kubitschek, a Fazendinha JK guarda a memória dos tempos em ele ainda dava festas em sua sala de discoteca, passeava pelos jardins projetados por Burle Max ou se escondia no mirante próximo à capela desenhada por Oscar Niemeyer. Está localizada na zona rural de Luziânia. É preciso agendar visitas por meio do contato 61998459030. Entrada: R$ 120 e R$ 140 (com café da tarde). 
 
Museu Pedro Ludovico 
Um dos museus mais charmosos de Goiânia, o local foi a morada de Pedro Ludovico e dona Gercina Borges e traça um passeio pela casa erguida nos anos 1930 tipicamente art déco. Sob gestão da Secretaria de Estado da Cultura (Secult Goiás), o espaço é gratuito. Visitação: de terça-feira à domingo, das 9h às 17h. Informações e agendamento: 32014678.&nbsp;

Patrimônio: casas de artistas goianos passam por transformações

Casas goianas

Pelas múltiplas atividades e pela constância e alcance de muitas delas, Bariani Ortencio se tornou uma grande pessoa pública. Com isso, acredito, quase tudo já se falou sobre ele. Foram centenas de entrevistas, estudos, programas especiais, documentários, palestras, mais de 50 livros publicados e participação em mais de 500 programas de TV.

Essa intensidade do Bariani, atraiu um grande público para os ambientes dos seus fazeres, revelando muito de sua vida. Com a multiplicidade de ofícios acabou dominando ferramentas que incluíram a agulha do alfaiate e a caneta do escritor. Recebeu diplomas de cidadania até em pequenos municípios e o título de Doutor Honoris Causa na Universidade Federal de Goiás.

Em nossa convivência de mais de meio século, fortalecemos uma amizade que nos outorgou o título de melhor amigo, sem receio de desconforto às nossas muitas outras amizades. No início foi uma relação xucra, com alguns estranhamentos acesos em opiniões divergentes.

Mas fomos nos ajustando em temperaturas mais brandas e domando a efervescência do sangue italiano e a rigidez do queixo goiano. Mas eram ebulições que baixavam logo. Até porque as afinidades foram maiores e permaneceram.

De 1983 para cá, até a sua impossibilidade de continuar, nossos encontros foram mais frequentes por conta das gravações do programa Frutos da Terra que acontecia semanalmente. E, entre as centenas de participações do Bariani, sou tentado a revelar uma com o ineditismo de bastidor: para gravar a receita de um coquetel conhecido por pica-pau, era preciso que os câmeras acompanhassem toda a sequência dos movimentos.

Na jarra transparente foram colocados suco de um limão china, um copo americano de cachaça e três colheres de mel. Depois de agitar bem os ingredientes para que se misturassem, Bariani servia a mim e a ele próprio. E como nada ali era falseado, ao terminar a receita, ele e eu brindávamos, tocando uma taça na outra, no conhecido gesto do tim-tim.

Fizemos isso por repedidas vezes e o câmera não conseguia acertar o enquadramento fechado como exigia a sequência. E a cada erro, tínhamos de repetir o brinde para manter o realismo da cena. Com tantos goles seguidos, chegamos a um estado de embriaguez tão notável que nem eu nem o Bariani conseguia articular mais uma palavra compreensível nem levantar os braços para erguer as taças.

Transferimos a gravação para um outro dia e saímos cambaleantes, apoiando um no outro feito dois bêbados que acabaram de se tornar amigos num balcão qualquer. Quando recobramos a razão, rimos muito de nós mesmos. Era o que podíamos fazer depois do indisfarçável embaraço.

Há cerca de uns cinco anos, quem sabe, mais, fiz questão de ressaltar a maturidade que conquistamos nessa longa convivência, expressando em uma letra, musicada por Ricardi Freire, as trepidâncias e a suavidade das estradas que percorremos:

Quando alguém me pergunta/ quem é meu melhor amigo/ respondo é aquele/ com quem na vida mais brigo./ Com ele eu posso brigar /sem correr nenhum perigo,/ concordando ou discordando/ ele está sempre comigo...”

Hamilton Carneiro, publicitário e cientista político, exerce o marketing político-eleitoral. É membro do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás