Goiânia, junho de 1942. Pouco a pouco os moradores da mais nova capital de Goiás se reúnem entre as Avenidas Tocantins com Anhanguera, no Batismo Cultural da cidade. Na calçada, Pedro Ludovico Teixeira descerra a placa para a inauguração da mais luxuosa casa de espetáculos do Estado. Era dada a largada do Teatro Goiânia.Entre os espaços culturais mais emblemáticos do Brasil Central e símbolo do art déco da capital, o edifício completou seus 80 anos no domingo (12). Ora como teatro, ora como cinema e casas de shows, fechado ou com programação contínua, o teatro é símbolo do nascimento de Goiania. Na atual gestão da Secretaria de Estado da Cultura (Secult Goiás), quem coordena o local desde 2019 é o diretor Josemar Callefi, que há 25 anos trabalha com produção cultural no Estado. “Queríamos fazer uma programação de comemoração aos 80 anos, mas as pautas estavam fechadas com uma agenda intensa”, adianta.Desde a retomada das ações culturais nos equipamentos públicos após o período de isolamento social que o Teatro Goiânia assumiu mais uma vez a posição de principal palco de Goiás. Só nos últimos meses, por exemplo, recebeu companhias e artistas nacionais, como a coreógrafa Deborah Colker e o músico Toquinho, ao lado de projetos locais aprovados em mecanismos de incentivo, como a Lei Aldir Blanc e o Fundo de Arte e Cultura (FAC), a exemplo da a Quasar Cia. de Dança e a Cia. de Arte Poesia que Gira.“Aplicamos um trabalho de captação de várias atividades, com projetos de parceiros antigos e novos, além de moldar a nova realidade, com um trabalho de limpeza ante a pandemia. O tratamento é igual tanto para ações nacionais quanto para regionais”, explica Caleffi. Nesta quarta-feira (15), o acrobata Gabriel Coelho apresenta o solo Causos de Voos e Riscos, com lotação máxima para 90 lugares. “Respeitamos os protocolos exigidos ante a pandemia”, reitera.No dia a dia do Teatro Goiânia trabalham 11 funcionários terceirizados e oito servidores do Estado, entre eles o técnico de palco Idione Borges de Carvalho, o mais antigo trabalhador do edifício. Há 42 anos entre os corredores do espaço, o goiano conta que acompanhou quatro décadas de transformações no local, entre revitalizações e reformas, paralisações e gestões diferentes.“Faço de tudo, maquinaria, fechamento de palco, trabalho com luz. Corro para todos os lados”, aponta Idione. Entre histórias de assombração, lembranças afetivas e causos de mistérios, como o lendário túnel do teatro, o técnico de palco passa mais tempo no edifício do que em sua própria casa. “De vez em quando a gente vê algumas coisas, escuta barulhos, mas tentamos nem dar importância. É que vivemos por esses corredores. No espetáculo da Deborah Colker, cheguei às 8 horas e fui embora às 20h30. Se não tiver amor pelo Teatro Goiânia, a gente nem faz”, diz.Sobre a situação do espaço, Idione Carvalho diz que lamenta pela atual conjuntura que o Teatro Goiânia se encontra. Segundo o técnico, é preciso que se contrate mais funcionários para tomarem conta do local. “Há cinco anos que não se compra uma lâmpada. Do jeito que está não funciona nem daqui um ano. As cortinas estavam rasgadas e eu tirei dinheiro do meu bolso para pagar. Tem algumas cadeiras que não prestam”, expõe.RevitalizaçãoA última grande reforma que o teatro passou foi em 2011, depois de ficar três anos de portas fechadas. Nesse período também foi entregue a Vila Cultural Cora Coralina, uma espécie de anexo ao teatro. Em nota ao POPULAR, a Secult Goiás afirma que uma licitação deverá entrar em breve para a reforma de vários equipamentos do Estado. São R$ 33 milhões destinados à restauração de cinco unidades de cultura e nove igrejas. Só a revitalização do Teatro Goiânia custará R$ 3 milhões.“É nossa preocupação dar uma reforma eficiente ao teatro. Nos próximos meses, queremos também comemorar as oito décadas do teatro”, explica o diretor Caleffi. Enquanto o processo de revitalização não sai, o Teatro Goiânia, em sua magnitude arquitetônica, ainda decora o Centro da cidade. “Com toda certeza, é uma das casas de cultura mais importantes do Centro-Oeste”, expressa.Navio de concretoQuando foi inaugurado, o então Cine-Teatro Goiânia promoveu rebuliço na então jovem Goiânia. Na semana de estreia, foi exibido o filme Divino Tormento, dirigido pelo americano W. S. Van Dyke e estrelado por Jeanette MacDonald e Nelson Eddy. Mais tarde, a Companhia Eva Todor inaugurou o palco com o espetáculo Colégio Interno, de Ladislaw Todor.Projetado pelo arquiteto Jorge Félix, o mesmo que criou o Coreto da Praça Cívica e a Igreja Imaculado Coração de Maria, o Teatro Goiânia foi pensado como em cima da planta construtiva de um transatlântico. O desenho do edifício é espacial em sua dimensão sob o forte azul do céu de Goiânia, com elementos que lembram escotilhas, proa, popa, convés e linha de flutuação. "O arquiteto Jorge Félix foi genial na concepção do edifício ícone de Goiânia. O prédio nos remete a concepção de um transatlântico, porque o próprio art déco é direcionado ao streamline, adotado em meios de transporte, como navios", explica o turismólogo Gutto Lemes, idealizador e coordenador do Goiânia Art Déco Festival. Em 2017, a atriz Bibi Ferreira, então com seus 95 anos, afirmou em entrevista ao POPULAR que as lembranças que guarda do Teatro Goiânia eram enormes. "Me recordo do carinho do público. Com Piaf, no final do espetáculo, o público se levantou e veio para a beira do palco”, disse.Leia também: - Festival do Boneco tem apresentações em diferentes pontos de Goiânia- Show 4 irmãos celebra os 50 anos do Clube da Esquina, em Goiânia