A operação policial em Araçu no dia 7 de dezembro que resultou na morte de oito suspeitos de integrar uma quadrilha interessada em roubar um banco no interior de Goiás contou com o envolvimento direto de 35 policiais militares e 74 tiros disparados por estes. Apenas 3 policiais, que faziam a guarda das viaturas, não efetuaram tiros na abordagem, realizada por volta das 23 horas. Os suspeitos foram atingidos 19 vezes, sendo que todos com pelo menos um tiro no peito.A conclusão tanto da Polícia Civil como da PM, em suas investigações, é que os policiais militares agiram em legítima defesa, portanto não cabia indiciá-los por homicídio.A Polícia Civil juntou ao inquérito concluído na semana passada dois relatórios feitos pelo Comando de Policiamento Rodoviário (CPR) e pelo Comando de Operações de Divisas (COD), ambos da Polícia Militar, mostrando que desde agosto a PM vinha monitorando o grupo, com informações de que os oito eram ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC) e pretendiam roubar uma agência bancária em Nova Crixás, a 353 quilômetros de onde estavam escondidos.O relatório final elaborado pela Polícia Civil tem apenas três páginas e se baseou principalmente nos depoimentos dos policiais militares envolvidos e no inquérito feito pela Polícia Militar (IPM). Já a apuração feita pela PM incluiu os laudos cadavéricos e um laudo pericial no local feito 12 horas depois da ocorrência pela Polícia Técnico Científica (PTC). Não foi incluído o laudo nas dez armas que teriam sido encontradas junto aos suspeitos, segundo a PM, por estar ainda inconcluso.O grupo seria de Campinas (SP) e região e estava em Goiás desde o dia 2, sempre monitorados pela PM. Eles passaram por um hotel em Aparecida de Goiânia na BR-153, onde ficaram de um dia para outro, foram para Nova Crixás onde de noite percorreram o entorno do destacamento da Polícia Militar, de uma torre de celular e da agência bancária que seria o alvo do assalto. Em Nova Crixás, eles chegaram a se hospedar em uma chácara às margens do rio Crixá-Mirim, onde pescaram e nadaram.Depois voltaram para Goiânia no dia 5 e foram até Inhumas, onde alugaram por uma semana uma chácara na GO-222, a cerca de quatro quilômetros de Araçu. A chácara pode ser encontrada para locação nas redes sociais e na internet e foi alugada no dia 6 por R$ 2,5 mil pagos em dinheiro. Os suspeitos teriam dito aos proprietários do espaço que eram de Goiânia e ficariam ali até o dia 12 para comemorar os bons resultados da empresa onde trabalhavam e um aniversário. Eles foram vistos confraternizando com churrasco e passeio a cavalo horas antes da abordagem policial.O monitoramento pela PM começou no dia 19 de agosto quando o CPR recebeu uma informação de que uma quadrilha viria de Campinas para roubar uma agência em Nova Crixás na modalidade conhecida como “tomada da cidade”, geralmente praticada à noite, inviabilizando a comunicação dos moradores e com ações que impossibilitem o trabalho da polícia da região.O primeiro do grupo a ser identificado, ainda em agosto, foi Walaf Ilson do Carmo Leite, de 22 anos, que teria vindo a Goiás para se encontrar com um criminoso não identificado em Goiânia no intuito de obter informações que ajudariam no assalto. Walaf chegou a ser abordado por policiais militares na região da 44, na capital, no dia 21 de agosto, e nos relatórios do COD e do CPR é afirmado que se descobriu mais detalhes sobre o plano da quadrilha, sem detalhar como se deu esta apuração.Apesar de nos depoimentos dos policiais ter sido dito que não sabiam no momento da abordagem quantos homens poderiam estar na chácara, desde quando os suspeitos chegaram em Goiás, no dia 2 de dezembro, os relatórios citam sempre oito. Ainda de acordo com os documentos a decisão pela abordagem se deu porque o grupo foi visto colocando objetos dentro de um carro na chácara, o que levou a PM a entender que a ação se daria no dia seguinte.A abordagem contou com a participação de um coronel e um tenente-coronel, além de mais oito oficiais. O restante das equipes era de soldados, sargentos e cabos.Além de Walaf, foram mortos na ação: Yago Palomino Pinheiro, de 19 anos; Luiz Fernando Santos da Silva, de 22; Vitor Roberto da Rocha Pires, de 24; Richard Alfredo Souza Cruz, Jeferson da Silva Diniz, e Thiago Moraes de Oliveira, todos de 28; e Felipe Albano dos Santos, de 35. Parentes de dois deles chegaram a dar entrevista para a imprensa na época reclamando que teriam sido executados e que teriam sido mortos enquanto dormiam, mas nenhum foi ouvido nem no inquérito da PM nem da Polícia Civil.Não é dito se, durante o período que a PM acompanhou a movimentação dos suspeitos, houve alguma comunicação sobre o fato com a Polícia Civil. Assim como não aparece nos relatórios finais dos inquéritos quantos tiros teriam sido disparados pelos suspeitos.Com a chegada do inquérito da Polícia Civil ao Judiciário o próximo passo é o Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) se pronunciar.Donos da chácara acharam que era “briga” O casal de proprietários da chácara alugada pela suposta quadrilha estava no local no momento em que os policiais militares entraram para render o grupo. Os dois estavam em uma das três casas, a sede do imóvel, se preparando para dormir quando ouviram os disparos e acharam que se tratava de uma briga entre os oito homens que estavam hospedados ali há um dia. O casal chegou a ligar para a Polícia Militar de Inhumas pedindo socorro, quando uma das equipes envolvidas na ação alcançou o imóvel onde estavam os dois e informaram sobre a operação.Em depoimento, o casal contou que no momento dos tiros se esconderam no banheiro. Eles se preparavam para dormir e a mulher estava conversando com o filho no telefone quando a operação teve início. Eles também informaram que os tiros duraram cerca de 10 minutos.Além de três armas de cano longo e 7 de cano curto que teriam sido encontradas com os suspeitos, a PM afirma ter localizado uma sacola com explosivos que foi detonada na mesma noite por um batalhão especializado da corporação. Os policiais contam que todos os suspeitos estavam vivos e feridos após o fim dos disparos e, como não havia sinal de celular no local, foram levados para um hospital municipal de Araçu nas viaturas. Os laudos cadavéricos mostram que uma vítima foi atingida com cinco tiros, duas com três tiros, três com dois tiros e duas com um tiro. E todas com pelo menos um no peito.Os peritos responsáveis pela vistoria do local reclamaram da falta de isolamento adequado no local após a ação policial, apontaram que vários cenários foram mexidos, seja para a retirada do suposto armamento em posse dos suspeitos ou para a busca de outros objetos no interior das casas, mas conseguiram identificar pelo menos nove pontos da chácara em que os suspeitos teriam sido baleados. Segundo os peritos, foram encontradas manchas de sangue no interior das casas, inclusive nas paredes, em eletrodomésticos, como a TV e a geladeira, e em colchão, além de perfurações provocadas por tiros no interior dos imóveis, indicando que houve abordagem não apenas do lado externo. Os policiais afirmaram que o suposto confronto teve início quando um dos suspeitos, na área externa da chácara, percebeu a aproximação das equipes e reagiu efetuando disparos. O relatório da PM detalhou como foi a incursão dos policiais.