Atualmente, pelo menos 13 obras existentes em Goiânia só foram feitas a partir de Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) firmados pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO). O uso do instrumento, que garante um acordo e evita que se tenha uma ação judicial entre as partes, tem se tornado cada vez mais comum, mas transformar em obra física é uma novidade quando as mesmas não fazem parte do problema em si. Desde o fim de agosto, a população da região Sudeste de Goiânia pode usufruir das duas etapas do Parque Linear Leonardo Rodrigues Peixoto, que margeia parte do leito do Córrego Barreiro.Até então, o espaço era uma área pública municipal com um matagal e sem infraestrutura urbana, mesmo que já fosse destinada a ser um espaço de conservação e também de convivência dos moradores. A obra só saiu do papel, no entanto, depois de um acordo feito entre o MP-GO, a construtora FGR, responsável pelos condomínios horizontais que estão próximos à área, e com a anuência da Prefeitura de Goiânia. O caso é um exemplo de uma obra toda proposta a partir do TAC.Assim mesmo são obras realizadas sob a tutela dos acordos extrajudiciais. A construção do Parque Linear Leonardo Rodrigues Peixoto parte de outro princípio, com a criação de um local público que não existia, ou seja, uma obra completa resultado de um acordo. O promotor Juliano de Barros Araújo, titular da 15ª Promotoria de Goiânia do MP-GO, e responsável pela negociação, conta que havia a necessidade de uma compensação ambiental em razão de irregularidades quando da implantação de um condomínio.Segundo Araújo, a ideia inicial não era exatamente fazer o parque urbano. “Mas tem a ideia de fazer a compensação perto do local onde ocorreu o dano. No caso, já estavam fazendo obras no parque da região do Parque Atheneu, já havia problemas com as proximidades do Córrego Barreiro e resolvemos fazer a reversão dessa compensação. Dava para ver, antes era tudo mato e agora tem o parque para a população do entorno.” O promotor conta que o TAC firmado garantia a possibilidade de um espaço aberto para que fosse usufruído pelos moradores dos bairros adjacentes e não só dos condomínios fechados.Leia também:- Universidade procura voluntários para pesquisa sobre deficientes visuais- Paço define futuro da Feira Hippie em Goiânia“Não tinha um projeto da Prefeitura para um parque urbano para lá, mas era uma área pública destinada a parque, foi uma conjunção de fatores. Não é nosso interesse interromper a política pública”, afirma o promotor. Ele conta que os acordos extrajudiciais buscam alternativas junto ao setor empresarial para tentar solucionar os problemas. “Às vezes a gente quer fazer acordo com a pessoa e ela tem resistência de dar o dinheiro ao poder público, prefere ele mesmo fazer a obra. Pensam que direcionam o dinheiro a fundos e acabam contingenciando ao final do ano do exercício e não viram os projetos”, relata.As obras também são feitas a partir de acordos com o próprio poder público, como é o caso da rede de esgoto dos lotes localizados nas margens do Córrego Capim Puba e da também do Córrego da Onça, realizados pelo promotor Marcelo de Mello, da 81ª Promotoria. Ele conta que um inquérito verificou que os moradores próximos ao Capim Puba tinham uma rede de esgoto que caia direto no córrego, sem qualquer tratamento e foi feito, então, um TAC com a Saneago para realização da obra, o que foi finalizado.Já com relação ao Córrego da Onça, Mello conta que foi necessária uma ação judicial e um acordo em uma história inusitada. A princípio, moradores próximos do curso d’água denunciaram a construção de um condomínio na área de proteção permanente (APP), o que é irregular e houve uma ação judicial contra a construtora para a retirada da obra. No inquérito para apurar a situação, no entanto, os técnicos do MP-GO verificaram que os denunciantes não tinham rede de esgoto tratado e os dejetos eram despejados in natura no córrego. Com isso, foi preciso um acordo, também com a Saneago, para a realização da obra.Mello explica que os acordos só são realizados após uma investigação e apuração do dano e individualização do responsável. “A gente poderia ajuizar uma ação ou usar o instrumento do acordo extrajudicial, se o responsável quiser, e fizer o TAC. A vantagem é que ele reconhece o dano, tem o pedido como solução.” Araújo ressalta ainda que, após a realização do acordo, é feita a comunicação com a parte beneficiária, que pode ser a Prefeitura ou Estado. No caso de obras, é realizado o acompanhamento, com a prestação de contas e a parte técnica do MP-GO garante a execução conforme o projeto e com a qualidade desejada. “Faz o acordo pela obra, deixamos uma folga no orçamento justamente para não ter problemas”, conta.Descumprimento é cobrado na JustiçaHá também exemplos de obras em Goiânia que foram resultados de acordos não cumpridos por empresas privadas ou órgãos públicos, em que foi necessário ir à Justiça para garantir a reparação do dano. Entre eles está a construção de quatro galpões para cooperativas de catadores de reciclagem. Os recursos foram recebidos em Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) realizados pelo promotor Juliano de Barros Araújo, da 15ª Promotoria, com uma rede de supermercados, como compensação ambiental, em 2003. O acordo teve de ser executado junto ao Poder Judiciário para o recebimento dos valores na ordem de R$ 4 milhões e em 2017 foi assinado termo de compromisso com a Prefeitura, que doou o terreno e o projeto, a Universidade Federal de Goiás (UFG), com apoio técnico, e a Central das Cooperativas de Trabalho dos Catadores de Materiais Recicláveis Unidos Somos Mais Fortes (Uniforte).O promotor Marcelo de Mello, da 81ª Promotoria de Justiça do MP-GO, explica que mesmo nos casos em que os TACs não são totalmente cumpridos a busca pelos acordos é vantajosa. “Fazer o ajuizamento da ação não evita o descumprimento e nem os atrasos de obras, mas o acordo garante que se tem o responsável, o entendimento que existe o problema e a responsabilidade pela solução”, diz. Ou seja, com a assinatura do termo, o MP-GO já tem o reconhecimento do ano sem a necessidade de uma decisão judicial para isso, o que adianta a busca por uma solução. Mello fez acordo com a Saneago em 2008, que foi aditado em 2012 e cobrado formalmente em 2015 antes de entrar na Justiça para buscar seu cumprimento. No caso, a intenção era resolver o problema de despejo de esgoto in natura nos cursos d’água que passam pela capital, em que foram identificados 18 pontos de poluição em Goiânia. Segundo o promotor, 55% do acordo foi cumprido e o restante está sendo cobrado em uma ação judicial.A Saneago confirma ação movida no ano de 2016, antes das providências e soluções de parte considerável dos pontos judicializados e informa que “segue no cumprimento do TAC e no exercício de seu direito de defesa”. A companhia garante que desde 2019, ampliou a rede coletora de esgoto de Goiânia em 480 km. “No total (considerando as obras concluídas e em execução) são cerca de 85 mil pessoas beneficiadas.”TACs geram reforma de estádio e zoológicoEntre dezembro de 2019 e abril deste ano, nenhuma partida de futebol foi realizada no Estádio Serra Dourada, o maior do Estado de Goiás. A retomada só foi possível após assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) negociado entre Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) e a Secretaria de Estado de Esportes e Lazer (SEEL), que promoveu a reforma do sistema de segurança contra incêndio no local e também dos 36 banheiros para os torcedores de arquibancada e cadeiras, o que começou a ocorrer em maio, ao custo de R$ 2,7 milhões. O acordo para a liberação do estádio foi assinado no dia 1º de abril.O caso teve a participação do Grupo de Atuação de Grandes Eventos de Futebol (Gfut), Diego Osório, o procurador geral de justiça, do MP-GO, Aylton Flávio Vechi. Na época, o espaço esportivo recebeu a instalação de um sistema de combate a incêndio e aumento e melhorias nos extintores e mangueiras, e ainda a instalação de um novo sistema de monitoramento. O Serra Dourada também passou por revitalização do gramado e uma nova pintura nas arquibancadas e cadeiras para receber o jogo Vila Nova e Grêmio pela Série B do Campeonato Brasileiro. O TAC ainda prevê a reforma dos banheiros, já mencionada, e a melhoria no sistema de iluminação do espaço.Outro caso semelhante a este foi da reforma do Zoológico de Goiânia, entre 2009 e 2012. Na época, a revitalização foi exigida após uma série de mortes de animais que habitavam o local e o inquérito demonstrou a necessidade de melhorias nos recintos. O TAC assinado na época foi para a adequação de toda a estrutura do Zoológico, que passou a ser chamado de ZooGyn quando da sua reabertura, em 2012, que só foi permitida após a avaliação do MP-GO. Na época, foi exigida a construção de uma ala de quarentena, espaço para repouso de animais estressados; biotério, local para abrigo de animais doentes e em tratamento; ampliação dos recintos onde os animais ficam e construção de maternidades em cada área de convivência.Atualmente, o promotor Juliano de Barros Araújo tem um TAC assinado, em dezembro de 2020, com a Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg) para a adequação e revitalização do Aterro Sanitário. A ideia é alterar a concepção atual do Aterro Sanitário, para uma nova concepção de um Centro de Tratamento e Disposição Final de Resíduos Sólidos (CTDRS), no qual deverão ser implantadas todas as etapas da hierarquização de resíduos. O promotor estabelece que o acordo está em cumprimento, visto que a Comurg já contratou os estudos, que estão em andamento. Uma parte prevê a instalação de mais galpões para cooperativas de catadores de resíduos também. “Sem sombra de dúvidas é mais difícil fazer um acordo com o poder público, mesmo que se tenha os recursos. É muita burocracia, e às vezes não consegue fazer a licitação, troca a gestão, é bem mais difícil”, diz.Revitalização do HDT e de ETEs estão sendo cobradasObjetos de Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), a reforma do Hospital de Doença Tropicais (HDT) e a ampliação das Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs) Dr. Hélio Seixo de Britto e do Parque Atheneu estão sendo acompanhadas. No caso da unidade de saúde, foi necessário o pedido de execução do acordo no Poder Judiciário, por falta de cumprimento, com ação civil pública. De acordo com a Secretaria de Estado de Saúde de Goiás (SES-GO), técnicos da pasta se reuniram com membros do MP neste mês para que o TAC seja incluído na ação em andamento e para estabelecer novas ações para a execução da obra.Até agora, a reforma ainda não foi iniciada. “O novo cronograma está sendo finalizado, mas a previsão do início da obra é para os próximos meses, com o prazo final em até 5 anos”, informa a SES-GO. O acordo foi assinado em abril de 2020 por intermédio da 53ª Promotoria de Justiça de Goiânia com aumento de leitos e ainda construção de locais como lavanderia, necrotério, caldeira, farmácia e até sistemas de ar-condicionado, conforme projeto.Quanto à ETE do Parque Atheneu, o promotor Juliano de Barros Araújo considera que o TAC está em cumprimento, visto que a Saneago “tem apresentado os relatórios dos andamentos das obras e de monitoramento”. A companhia informa que a obra foi paralisada pela empresa contratada para sua execução. “Diante disso, a Saneago tomou todas as providências cabíveis: o contrato foi encerrado e a Saneago instaurou processo administrativo de apuração de responsabilidade para averiguar a conduta da empresa pela inexecução do contrato”.Uma nova licitação chegou a ser feita, mas não houve interessados e há agora um trabalho para a republicação do edital. Já na ETE Hélio Seixo de Britto as obras estão em atividade. “Atualmente, a obra está com 97% de finalização, restando apenas a instalação de equipamentos”, informa a empresa.Transformação de quatro Cais em UPAs ocorreu após negociaçãoEm 2013, após ampla negociação da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) com o Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), foi acordada uma ampla revitalização das unidades de saúde de Goiânia. Para tal, foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que em sua cláusula quinta há a exigência da transformação dos Centros de Atendimentos Integrais à Saúde (Cais) em Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), que possuem maior capacidade de atendimento ao usuário, com maior estrutura e equipamentos mais avançados. Desde então, o município, para o cumprimento do acordo e evitar ações judiciais, elevou à UPA as unidades Novo Horizonte, Jardim América, Chácara do Governador e Jardim Novo Mundo, restando ainda a finalização das obras do Cais Jardim Guanabara. Foi também em cumprimento de um TAC que o prefeito Iris Rezende (MDB) inaugurou em 2019 a Casa da Acolhida II (CAC II), no Setor Leste Universitário, que atende mulheres solteiras e/ou com filhos e famílias. O acordo havia sido feito em 2015, quando o inquérito verificou a necessidade de desafogar a reformar a Caci, no Setor Campinas. Atualmente, segundo a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Humano e Social (Sedhs), a Caci I está no Setor dos Funcionários, realizando acolhimento para o público masculino e LGBTQI+. A pasta informa que realiza estudos para implantação de novas CACs a partir de 2023.-Imagem (1.2542265)