Após repercussão do caso envolvendo o desligamento do professor de sociologia, Osvaldo Machado, de 41 anos, pelo Colégio Visão em Goiânia, alunos afirmaram ao O POPULAR que na manhã desta quinta-feira (30) foi realizada uma reunião com a diretora da instituição, um representante do grupo Escola Paulista de Direito e Unidombosco (SEB) e três representantes de sala, ou seja, alunos eleitos para falarem em nome de suas respectivas turmas. No entanto, a decisão da demissão segue a mesma, segundo os estudantes.“Os três representantes tentaram de todas as formas defender o Osvaldo e pedir a volta dele, inclusive mostrando algumas outras mentiras que o influencer (que deu início à polêmica) já espalhou por aí, mas eles (a direção) não voltaram atrás”, contou uma aluna. Ela acrescenta que a direção ressaltou que vão indenizar o professor, já que a demissão não foi por justa causa.O colégio amanheceu nesta quinta com parte a fachada pichada. Uma das frases dizia “Censura não!” e foi apagada pelos funcionários da escola momentos depois.Além disso, novos cartazes foram pregados na estrutura da instituição. “Justiça por Osvaldo”, “Vai nos calar também?” e “Vergonha por estudar aqui” foram alguns dos dizeres nas manifestações. Os jovens haviam se reunido para escreverem uma carta aberta ao grupo SEB, que administra a escola, antes da decisão mantida pelo colégio na manhã desta quinta, com o intuito de pressionar a gestão a recontratar o professor. “Diante disso, eu, cliente de Grupo SEB, deixo clara minha total insatisfação com a decisão de demissão do professor, e peço a reavaliação da decisão”, diz trecho da carta.No mesmo documento, ressaltam a boa conduta do professor em sala de aula. “É importante destacar que Osvaldo é um dos melhores professores de sua área, fundamental para o sucesso de nós, alunos”, diz o texto. “Em todas as aulas, Osvaldo sempre promoveu o respeito, a disciplina e o debate, respeitando e acolhendo todos os posicionamentos”, acrescenta.Leia também:- Colégio particular de Goiânia demite professor após influenciador alegar doutrinação no ensino- Alunos de escola de Goiânia protestam contra demissão de professor criticado por influenciador- Juiz condena Gustavo Gayer a gravar vídeo com retratação por informações falsasOsvaldo recebeu apoio de alunos, ex-alunos, pais e responsáveis. “Todo mundo gostava dele, ele nunca influenciou de política, de partido, de eleição. Ele só deu aula de sociologia”, disse uma das alunas ao POPULAR. Na rede social Twitter, outra escreveu: “Ele era o extremo oposto de doutrinador, nunca impôs nada”. Posicionamentos de pais e responsáveis reforçaram o repúdio. “Decepcionada com a escola a quem dei crédito na formação sociocognitiva dos meus filhos”, escreveu uma mãe.Outra argumenta que a instituição de ensino está sendo “submissa a um cara em busca de votos e likes”. Ela comenta que é a favor do professor, e que a escola deveria “repensar sobre isso, pois não criei meu filho pra viver na censura, o indivíduo deve ser criado livre e pensante”.Ao POPULAR, na quarta-feira, Osvaldo disse que demissão resultou na perda do plano de saúde e da renda mensal. O professor, que estava planejando uma gravidez com sua esposa, salientou que preza pela ponderação e que só deseja chegar ao mês de agosto empregado. “Eu jamais diria em sala de aula que um cidadão deve amar bandidos e odiar policiais, eu só levo as tirinhas dele (André Dahmer) para que os alunos possam ter informação sobre a sociedade em que estamos vivendo“, afirmou.O profissional disse se sentir acolhido e ter mais forças de acreditar que tudo que os alunos estão escrevendo é o reflexo real do professor que ele era em sala de aula.Entenda o casoA demissão do professor Osvaldo Machado ocorreu após a repercussão de um vídeo do influenciador de direita Gustavo Gayer, em que este afirma que o professor doutrina os alunos a odiarem a polícia. Após a postagem, houve uma pressão nos comentários para desligar o professor. A insatisfação do influenciador foi uma tira do cartunista André Dahmer que representa um personagem lendo um jornal e dizendo: “Mais um assalto em São Paulo, ainda bem que temos a polícia para combater a violência em prol da barbárie”. O enunciado questiona: “Qual elemento do Estado está sendo retratado na tira abaixo?”. O exercício estava presente em uma lista preparatória para os alunos de recuperação, segundo ele, e a resposta era diferente do que Gayer pensa. “A tirinha trata do uso legítimo da força pelo Estado, essa é a resposta. É o contrário do que ele pensa”, disse Osvaldo. O próprio professor foi quem levou o vídeo à direção na segunda-feira com o intuito de informar a direção. Ele acredita ter sido acolhido pela gestão em um primeiro momento. No dia seguinte, após a postagem repercutir, ele foi comunicado de seu desligamento. “A diretora me perguntou o que eu sugeria para situação e eu disse que só queria minha paz e minha vida de volta, e que eles sabiam o profissional que sou”, disse.O POPULAR entrou em contato com o Colégio Visão novamente nesta quinta-feira (30), mas obteve o mesmo posicionamento de quarta (29). “A escola possui um Código de Conduta que veda manifestações políticas, partidárias ou ideológicas em ambiente escolar. A direção do Colégio mantém um canal de diálogo aberto com alunos e familiares, sempre pautando suas ações no Código de Conduta.”A reportagem entrou em contato com o Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino de Goiânia (SEPE) e foi informada que não comentaria. Para o cartunista, influenciador não soube interpretar a tirinhaAutor da tirinha que culminou na demissão do professor Osvaldo Machado, André Dahmer, de 47 anos, vive no Rio de Janeiro e teve diversos trabalhos incluídos em vestibulares, no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), concursos públicos de bombeiros e policiais. “A sugestão de publicar tiras e quadrinhos em provas vestibulares é do próprio plano nacional de educação (PNE), é uma das formas de interpretação de texto e de aproximar o aluno ao senso crítico social”, garante.O artista conta que soube da demissão de Osvaldo por meio de alunos do Colégio Visão, pelas redes sociais, e tentou entrar em contato com a escola, mas não obteve resposta. Foi no Twitter que ele verificou que o que estava acontecendo em Goiânia era, de fato, verdade. “Eu soube com tristeza”, diz. Dahmer não assistiu ao vídeo com críticas a sua tirinha. Segundo ele, é melhor não discutir com extremistas. O cartunista diz que defende políticas públicas que garantam uma polícia de qualidade. “Os policiais trabalham em péssimas condições e em situação de guerra, sou a favor de qualificar mais a polícia, tornar mais humana e ligada à sociedade”, diz.Em relação à decisão da escola, Dahmer acredita que é justo abordar diversos assunto políticos e sociais para que as pessoas mais novas estejam cientes das construções da sociedade. “É obrigação da escola desenvolver consciência crítica, valores, solidariedade”, diz. Ele se solidariza Osvaldo e profissionais de ensino que estão sofrem repressão. “Éum cara que está tentando desenvolver o que algumas escolas não querem mais. É preciso conhecer todos os pilares da sociedade, de Freud à Cristo”.Escola deve ter formação plural, diz especialistaA psicopedagoga Aurélia Carneiro Caetano Mello enfatiza que o papel da educação nas escolas é de informar e instruir durante o processo de desenvolvimento dos alunos e, neste cenário, a política faz parte dos temas que devem ser abordados. “Para a gente saber a função dos poderes é necessário que a escola dê oportunidade para eles entenderem todos os lados.”Aurélia acredita que a juventude não precisa ser influenciada. “Jovem por si só já tem esse ímpeto de manifestar, não precisa ter uma influência para lutar pelo que ele acredita. Eles captam informações e pensam a partir daquilo que eles já acreditam”, afirma. Por esse motivo, quando os jovens, no caso dos alunos do Colégio Visão, se sentem tolhidos, é natural que haja um posicionamento por parte deles.“O que eles estão vivendo é um sentimento de injustiça, é como se o desejo deles de manter o professor não tivesse sido respeitado, simplesmente uma ideia externa foi respeitada em detrimento do que eles acreditam”, frisa a psicopedagoga.-Imagem (Image_1.2482919)