O atraso nas notificações de mortes por coronavírus em Goiás pode provocar leituras incorretas do momento atual da pandemia e mantém ainda incerto qual foi o dia com mais óbitos por Covid-19 no Estado até agora. Técnicos usam a média dos atrasos para fazer projeção de como a situação estaria hoje.Uma das maneiras utilizada por especialistas e pelos veículos de comunicação para dar um prognóstico do presente é a média móvel, que é a soma dos óbitos divulgados nos últimos 7 dias divida por 7. A comparação da média móvel atual com a de 14 dias atrás produz avaliações sobre o cenário em cada localidade. É considerado em baixa, se houver diminuição abaixo de 15%; em estabilidade, se a queda ou aumento não passar de 15%; e em aumento, se o crescimento neste período for acima de 15%.A ideia da média móvel é criar um parâmetro mais próximo da realidade da quantidade de óbitos diários em cada localidade. No entanto, o atraso nas notificações pode distorcer o cálculo e avaliar como estável um período que na verdade era de aumento e vice-versa. Isso acontece porque a média móvel é calculada com os números de mortos divulgados em cada dia e não pela data real em que as pessoas morreram.Levantamento do POPULAR comparou as médias móveis de julho e agosto divulgadas nas suas respectivas datas e como elas seriam considerando a real quantidade de óbitos em cada dia desses dois meses, que só foram notificadas nas semanas seguintes até 26 de setembro.Em 44% dos 62 dias de julho e agosto, a avaliação da média móvel feita na época dos fatos é diferente da que seria feita com os números consolidados. Em seis dias Goiás aparecia como “em estabilidade”, sendo que o cálculo real seria “em alta”, e em 21 dias o Estado aparecia como “em alta” sendo que o cálculo real seria “em estabilidade”.“O que nos importa é quando a pessoa morreu. Agora que teve aumento de 40% (na média móvel) de Goiás é por causa de muitos óbitos antigos que entraram no sistema”, explicou a superintendente de Vigilância em Saúde do Estado, Flúvia Amorim, na semana passada, quando Goiás voltou a ter o cenário de óbitos por Covid-19 considerado “em alta”.De qualquer maneira, a estabilidade não quer dizer uma diminuição da quantidade de mortes diárias. Desde agosto, Goiás vem apresentando um valor alto na média de óbitos diários por coronavírus, de cerca de 50 casos a cada 24 horas. Gestores da Secretaria de Saúde de Goiás (SES-GO) avaliam que os índices da pandemia no Estado estão em um platô alto.Novos cálculosO professor José Alexandre Felizola Diniz Filho, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da Universidade Federal de Goiás (UFG), avalia que as médias móveis acabam sendo afetadas pelo tempo das notificações e que o melhor é fazer as análises pelas datas dos eventos, seja óbitos ou primeiros sintomas dos casos confirmados de Covid-19, e tentar corrigir os atrasos. “Por um lado, temos os atrasos todos, que já conhecemos bem. Por outro lado, e ao mesmo tempo, tem casos antigos sendo notificados agora. Imagina uma situação hipotética no qual há uma grande investigação de casos antigos que coloca muitos “novos” casos, e que poucos casos novos estariam acontecendo. Nesse cenário, a média móvel estaria estável ou até aumentando, mas de fato a epidemia estaria caindo”, avalia o pesquisador.Felizola e outros pesquisadores da UFG criaram um cálculo a partir dos atrasos já constatados em semanas anteriores. Com essa função, eles conseguem fazer o que chamam de previsão para o presente, “nowcasting”.A quantidade de óbitos no Estado por exemplo já passou de 5 mil há alguns dias, embora os casos notificados até agora tenham sido de 4,8 mil. Utilizando essa função, eles estimaram o Re de Goiás para a primeira quinzena de setembro, que é o número médio de transmissões de cada infectado. Quando o número está abaixo de 1, significa que a as quantidades de transmissões estão diminuindo, acima de 1 quer dizer que ainda está aumentando. O Re de Goiás, segundo os pesquisadores está em 1,04, que corrobora para a avaliação de uma estabilidade no crescimento da pandemia. Isso significa que, hipoteticamente, se há mil casos ativos de Covid-19 em Goiás hoje, na próxima semana haverá 1.040. Outro indicador que não está claro é o chamado pico de óbitos, que seria o dia com a maior quantidade de mortes em 24 horas em Goiás. Até o dia 31 de agosto, este pico era 25 de julho com 55 óbitos. No entanto, com os novos casos notificados até 30 de setembro, o dia com mais mortes passou a ser 18 de agosto, com 63 óbitos. As mortes por Covid-19 notificadas nas próximas semanas podem mudar esse pico para antes ou depois de 18 de agosto, já que vários dias chegaram a ter uma quantidade de mortes próxima ao topo de 63 casos. Flúvia Amorim, chefe da Vigilância Epidemiológica do Estado, garante que houve uma melhora nos registros das notificações feita pelos municípios e hospitais, mas que ainda há demora. “Ainda chega óbito da semana 34, 33. Estamos na 39 (entre 20 e 26 de setembro). Teve uma melhora, mas não resolveu”, explicou.A superintendente relata que há alguns municípios no Brasil que estão fazendo uma busca em outros sistemas, como o sistema de sepultamentos, para captar possíveis óbitos de Covid-19 que não entraram no sistema. “Caso isso aconteça, pode ter uma mudança drástica.”