O Brasil vive um momento de falsa segurança em relação à Covid-19, abolindo medidas de segurança e retomando hábitos comuns antes da pandemia. E isso é perigoso. O alerta é do epidemiologista Wanderson Oliveira, ex-secretário de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde e atual secretário de serviços integrados de saúde Supremo Tribunal Federal (STF). Nesta terça-feira (23), ele foi o convidado do 2º programa Chega pra Cá. Comandado pela jornalista Cileide Alves, o programa vai ao ar pelo Facebook, YouTube e site do POPULAR.No total, o Brasil contabiliza 22 milhões de casos de Covid-19 e mais de 613 mil óbitos. Oliveira tem uma visão cautelosa do momento atual vivido pelo país, apesar da queda de mortes e da hospitalização. Goiânia, por exemplo, registrou, na segunda-feira (22), a menor média móvel de mortes desde maio de 2020.Por isso, Oliveira defende uma comunicação mais clara de forma que a população entenda que retomar alguns hábitos e abrir mão de protocolos devido às circunstâncias atuais não significa que a pandemia chegou ao fim. Com o fim de ano chegando, as aglomerações em centros comerciais, reuniões familiares, de amigos e trabalho, o epidemiologista acredita que os reflexos do comportamento podem vir no início de 2022. “Todo mundo está cansado, naturalmente, querendo ver o lado positivo (dos dados), mas há uma falsa sensação de segurança. Apesar de volume de internação e óbitos significativamente muito menor, temos números parecidos com os do final de abril de 2020. Lá, estávamos arrancando os cabelos de medo e agora estamos achando tudo maravilhoso”, alerta. Oliveira cita a retomada de hábitos pré-pandêmicos como sinais de alerta. “Estamos abolindo máscaras, voltamos com as cirurgias eletivas e por isso estamos aumentando a vulnerabilidade para transmissão e ocupando hospitais. É fim de ano e pessoas vão às compras, vão se reunir, se aglomerar. Mas temos crianças, pessoas sem vacina. Muita gente pode pegar o vírus e quem se vacinou, mesmo sem casos graves, pode transmitir. Janeiro e fevereiro podem ter um cenário diferente”, completa. O epidemiologista lembra que o País ainda registra cerca de 200 mortes por dia. “É pouco em relação aos 2 mil que morriam diariamente, mas é inadmissível, é um número inaceitável comparado com o que sabemos de outras doenças”, acredita. Com a disponibilidade de vacinas, para ele o tolerável seria “zero mortes evitáveis por Covid-19”. “Não posso aceitar uma pessoa sem histórico de gravidade morrer por Covid”, afirma. Durante a entrevista, o epidemiologista defende o início da vacinação das crianças a partir de 5 anos, seja com o imunizante da Pfizer ou com a Coronavac, e alerta, inclusive, que a tecnologia de vírus inativado – usada pelo Butantan - é, historicamente, adequada e bem aceita por crianças. É a mais convencional, mais antiga e utilizada desde 1950 para várias vacinas como raiva e poliomielite. Dessa forma, Oliveira critica a decisão do governo federal de não priorizar para 2022, a produção nacional de vacinas Coronavac. “É um equívoco, Uma decisão política e não técnica”. Afirma ainda que considerando que 36% da população brasileira tem menos de 12 anos e, portanto, não possui vacinação já autorizada, não é o momento de sentir alívio ou pensar que a pandemia está no fim. Para ele, é preciso considerar que crianças se contaminam e transmitem, ainda que tenham menos histórico de morte e internação. No início da pandemia, no começo de 2020, Wanderson Oliveira participava diariamente das entrevista à imprensa realizadas pelo Ministério da Saúde. Ele deixou o cargo em maio de 2020 e a exoneração ocorreu em uma data simbólica, no dia do aniversário da Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz). Primeiro enfermeiro a assumir um cargo no primeiro escalão no Ministério da Saúde, é mestre e doutor em epidemiologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e possui especializações na Universidade John Hopkins e no Centro de Controle e Prevenção de Doenças da Geórgia, ambos nos Estados Unidos, além da Universidade de Brasília e EpiSUS. Positivo devia ser menos de 4%O epidemiologista Wanderson Oliveira afirma que um dos pontos importantes de controle da pandemia é a redução da contaminação e qu,e por isso, os testes positivos para a Covid-19 deveriam representar menos de 4%. “Hoje, Goiás tem 7,6%. Chegou a ter 15%, 20%. O Brasil está em 8,6%”, completa. Rondônia está com 23%. Precisamos reduzir o número de positivos porque, quando estamos abaixo de 5%, significa que o vírus está circulando menos”. Para Oliveira, falta, desde o início da pandemia, uma comunicação clara do governo com a população. Hoje, defende inclusive que estados e municípios assumam campanhas de conscientização e que haja negociação para que a gravidade seja entendida e os protocolos dependam de comportamento e de adesão à vacinação. “Nós não estamos negociando com a população. Se a retirada de máscara, mesmo em ambiente aberto, tivesse sido negociada com a população, tipo: ‘se a gente atingir 75% da população com as duas doses vamos relaxar com o uso da máscara mesmo em ambientes fechados’, seria muito melhor”.