A cada dia, pelo menos oito acidentes com veículos automotores ocorrem nas rodovias federais em Goiás. Desde janeiro de 2021 e até o final de abril deste ano foram 4.148 ocorrências, que resultaram em 382 vidas perdidas, 1.218 pessoas feridas gravemente e 3.492 com ferimentos leves. Chama a atenção o fato de a maior parte dos casos ocorrerem com condições, em tese, favoráveis a uma viagem tranquila, como em dias claros, em trechos de estradas retas e com apenas um veículo envolvido. Para a Polícia Rodoviária Federal em Goiás (PRF), a situação mostra que a principal causa dos acidentes é a imprudência dos motoristas.Os dados fazem parte do Anuário da PRF e apontam que as BRs 153 e 060 apresentam a maior quantidade de acidentes, com 1.123 e 930 respectivamente. Para o porta-voz da PRF-GO, inspetor Newton Morais, esse resultado se dá por se tratarem de rodovias com alto fluxo de veículos. “A 153 começa lá no Rio Grande do Sul, cruza todo o Brasil em mais de 3.700 quilômetros. É uma rodovia que passa todo tipo de transporte, incluindo o trânsito urbano na região de Goiânia e Aparecida de Goiânia. É hoje a principal avenida destas duas cidades.”Porém, um trecho aparentemente tranquilo de 20 quilômetros entre o distrito de Domiciano Ribeiro, pertencente ao município de Ipameri, e a cidade de Cristalina, na BR-050, é o que mais concentra acidentes ao longo do período analisado. Em 16 meses, foram 55 ocorrências no mesmo local e com quatro vítimas fatais. Desses casos de sinistros, em um local que possui dois viadutos e duas curvas apenas, em 9 a causa apontada pelo relatório da PRF é que o condutor estava dormindo e em 4 os motoristas haviam ingerido álcool. Quanto ao tipo de acidentes, foram 18 saídas de pista, todas elas com o envolvimento de apenas um veículo, além de mais 9 colisões traseiras no trecho da BR-050.A rodovia é administrada pela concessionária Eco050, que informa ter contabilizado, até abril de 2022, 36 acidentes no trecho entre Cristalina e Domiciano Ribeiro. “Assim como no restante do trecho concessionado, a falha humana desponta como a principal causa dessas ocorrências”, considera a empresa, em nota. Ela afirma ainda que “realiza diversas ações, de forma contínua, no intuito de prevenir acidentes e mortes na rodovia, como é o caso do Programa de Redução de Acidentes”. O programa é um comitê multidisciplinar que analisa os registros de acidentes mais graves para definir estratégias com objetivo de reduzir a reincidência das ocorrências.A Eco050 informa que também fornece apoio estratégico, por meio de sistema de videomonitoramento, ao trabalho fiscalizatório e preventivo da PRF, que identifica condutores com algum comportamento de risco. Ação semelhante começa a ser feita pela Ecovias do Araguaia, que administra a BR-153 de Anápolis (GO) a Aliança do Tocantins (TO), em que o trecho em Goiás é o que mais teve vítimas fatais em 2021 e até abril deste ano, com 49 pessoas falecidas em decorrência dos acidentes na rodovia. A operação da empresa, no entanto, começou no dia 8 de abril deste ano.CausasSegundo a concessionária, ela tem atuado no monitoramento e atendimento das ocorrências registradas ao longo da rodovia e está implementando o seu Programa de Redução de Acidentes. “A Ecovias do Araguaia ressalta que, com a assinatura do Contrato de Concessão, firmado com o governo federal em outubro de 2021, tem realizado serviços iniciais ao longo dos 851 quilômetros administrados pela concessionária, entre os estados de Goiás e do Tocantins, com intervenções de conservação que contemplam roçadas, limpezas de pista e sistema de drenagem, tapa-buracos e recuperação de pavimento”, informa em nota.As atividades têm prazo de finalização até outubro de 2023 e buscam melhorar a segurança, o conforto e a trafegabilidade nas vias, “suprindo também pontos críticos encontrados principalmente no trecho da BR-153, logo após o início dos trabalhos da concessionária na região”. O inspetor Newton Morais acrescenta que, até então, o trecho norte da BR-153 em Goiás possui pavimentação antiga e inadequada, além de problemas com a sinalização e um movimento intenso de veículos com cargas pesadas, como caminhões e ônibus.Segundo ele, a PRF tem conseguido reduzir o número de ocorrências no estado a cada ano, com trabalho mais efetivo em pontos específicos e datas, como os feriados prolongados. “A questão maior é o condutor. Temos 24 anos de CTB (Código de Trânsito Brasileiro) e ainda o que mais vemos são pessoas conduzindo ou levando gente sem o uso do cinto de segurança e dirigindo sem o cuidado necessário.” Morais explica que é impossível ter um policial para cada veículo ou quilômetro das rodovias federais e que, por isso, o principal trabalho tem sido de educação dos motoristas, o que ocorre em parceria com escolas e empresas próximas às BRs. Falha na sinalização e defeitos na pista elevam os riscosEngenheiro de Trânsito e professor do Instituto Federal de Goiás, Marcos Rothen explica que para se fazer uma análise mais acurada das causas dos acidentes nas rodovias federais em Goiás seria necessário uma equipe multidisciplinar. Mesmo que a Polícia Rodoviária Federal (PRF) aponte como principal causa as ações dos condutores, Rothen avalia que as ocorrências também podem ser geradas por outros motivos. “Sem questionar a intenção do trabalho da PRF, possivelmente eles não analisam os acidentes que são causadas pelas falhas de projeto/construção”, afirma. Ele cita como exemplo disso o Anel Viário entre Goiânia e Aparecida de Goiânia, onde as rotatórias possuem inclinação incorreta, o que leva a vários tombamentos. “Há os causados por falha de sinalização, eventualmente nas BRs há algumas falhas que confundem os motoristas e também podem causar acidentes”, acrescenta. Outra situação lembrada por ele é em relação aos defeitos pontuais nas pistas. Nestes casos, o engenheiro considera que uma abertura de um buraco no asfalto ou até o mesmo o derramamento de algo escorregadio na pista podem redundar em acidentes. “Já vi situações em que vários veículos se acidentam em sequência por problemas de, por exemplo, óleo na pista.” Já em relação às causas apontadas pelo Anuário da PRF, que cita a falta de reação ou reação tardia dos condutores como as principais causas dos acidentes, Rothen afirma que estas ocorrências se referem às colisões traseiras. “Nesse caso os motoristas vão muito próximos e uma freada brusca de um causa o acidente”, diz ele ao alegar que esses casos são comuns nos trechos urbanos mais movimentados, como da BR-153 em Goiânia, e que são situações evitáveis.Outro ponto é sobre acidentes em que apenas um veículo é envolvido, gerando saídas de pista. Rothen considera que essas situações ocorrem “por alguma fechada, o que em rodovias é raro, ou pela distração do motorista”. “Depois de algum tempo dirigindo o ser humano entra no automático e muitas vezes se desliga ou se distrai e perde a noção da velocidade e do controle do carro.” Entre as causas da desatenção está o uso do celular. “Em estudos que tive conhecimento, normalmente o motorista que se envolve num acidente por distração não reconhece que contribuiu para isso. Além do celular, pode ocorrer de pegar algo que caiu ou no porta-luvas e, como nas estradas estamos em maior velocidade, uma pequena distração pode fazer com que o motorista perca o controle.”Trecho sul da BR-153 é o que soma mais mortes até o final de abrilO trecho sul da BR-153 em Goiás, de Itumbiara a Anápolis, sob a concessão da Triunfo Concebra, é onde os acidentes nos primeiros quatro meses deste ano geraram mais mortes. Ao todo, foram 23 vítimas, gerando uma média de 6 mortes por mês. Destas, 16 foram registradas na BR-153 e 7 na BR-060, sendo esta última no trecho correspondente ao que as duas rodovias estão juntas, entre Goiânia e Anápolis. O número corresponde a 29,1% do total de 79 vítimas que faleceram nas rodovias federais do estado em 2022, de acordo com o Anuário da Polícia Rodoviária Federal (PRF).Segundo a Triunfo Concebra, desde o início da concessão é feito o controle e o acompanhamento dos índices de acidentes em todo o trecho administrado. “Destacamos a redução de aproximadamente 55% na quantidade de vítimas fatais comparadas ao histórico anterior à concessão, na qual relacionamos as atividades de melhoria executadas pela concessionária ao longo dos anos, incluindo a conservação, sinalização e a própria realização de socorro médico e mecânico, reduzindo a exposição dos usuários na rodovia em casos de pane”, informa a concessionária.A empresa lembra que a BR-153 é a principal rodovia federal em Goiás, passando inclusive por Goiânia e região metropolitana, “com alto volume de tráfego, o que também está diretamente relacionado à quantidade de acidentes registrados”. A empresa reforça que a análise do Anuário da PRF deve levar em conta não apenas os números absolutos, mas também o tamanho de trecho e veículos passantes por dia.Ainda sobre os dados deste ano, depois do trecho entre Itumbiara e Anápolis, a rodovia federal com mais acidentes graves é a BR-020, no Entorno do Distrito Federal, com 9 vítimas que morreram. No entanto, neste caso, a estatística é evidenciada após a colisão entre um carro e um ônibus que vitimou 6 pessoas, sendo 5 de uma mesma família.Leia também: - Conheça a estrada mais perigosa de Goiás- Novos casos de mortes no trânsito de Goiânia fazem famílias reviverem a tristeza- Homens somam 81% das mortes em acidentes nas estradas goianas-Imagem (Image_1.2467580)-Imagem (1.2467631)