Com as unidades de saúde em Goiânia lotadas, pacientes relatam peregrinar por postos de saúde em busca de atendimento e, em muitos casos, esperar o dia todo para conseguir passar por um médico. O acesso a vagas para internação também é problema.A estudante universitária Karoline Almeida Sousa, de 21 anos, esteve no Cais da Chácara do Governador na tarde desta terça-feira (4). Com sintomas de gripe, ela disse que já tinha passado pelas unidades da Vila Nova e Novo Mundo. “Em todos os lugares, estava cheio. Aí as pessoas falam que ali tá mais tranquilo, ali tá melhor. Mas quando a gente chega, não tem nada disso.” Karoline diz que chegou à última unidade de saúde às 13 horas e por volta das 17 horas, ainda aguardava atendimento. “Passei só pela triagem e disseram que era caso simples, mas não estou me aguentando de dor no corpo. Meu medo é ser essa nova Covid-19 e passar para minha família, que tem idosos morando com a gente.”Odete Rodrigues, de 76 anos, passou por três unidades de saúde até conseguir, na quarta tentativa, uma vaga de internação. Ela passou mal em casa e o filho, Sirley Rodrigues, de 56 anos, chamou o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). “A suspeita era de um acidente vascular cerebral (AVC) e o caso era delicado. Chegamos ao (Cais) Jardim América e nem nos deixaram descer. Disseram que estava lotado e que deveríamos procurar outra unidade.”Depois disso, Sirley conta que a mãe foi levada para a unidade da Vila Nova. Lá ela chegou a fazer uma ficha, mas que por falta de vaga, uma pessoa da direção orientou o motorista da ambulância a procurar outra unidade de saúde. Na terceira tentativa, no Cais de Campinas, o caso foi novamente negado pela falta de vaga. Sirley conta que chegou a ficar nervoso e questionar se a mãe ficaria andando de canto em canto sem conseguir atendimento.Depois, Odete foi recebida e atendida na Upa Maria Perillo, na Região Noroeste. “É uma tristeza passar por isso. Sabemos que isso está acontecendo em todo lugar do Brasil, mas não deixa de ser triste. Isso tá largado. Ainda precisávamos de hospitais de campanha para cuidar deste tanto de gente com gripe e Covid-19, para que essas unidades ainda atendessem AVC, enfarte, entre outros casos.”A Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia (SMS) confirma a dificuldade e orienta pacientes que não tenham quadro grave a procurar unidades básicas de saúde para liberar atendimento das Unidades de Pronto Atendimento (Upas) e Cais para pessoas que tenham situação crítica ou grave.Na tarde desta terça-feira, a recepcionista de escola, Renata Juliano, de 53 anos, aguardava sentada em uma cadeira de rodas do lado de fora da UPA Domingos Viggiano, no Jardim América. Ela passou por uma cirurgia no Hospital Geral de Goiânia (HGG) em agosto do ano passado e acredita que, por não estar com a imunidade recuperada, contraiu pneumonia. “Eu preciso de internação urgente (em unidade de alta complexidade). A médica mesmo me disse que tinha de ser logo, mas não tenho ideia de quando serei encaminhada.”Renata Juliano diz que a funcionária da unidade de saúde informou que ela precisa aguardar encaminhamento, feito pela regulação do município. “Eu estou internada, mas fico aqui de fora (na calçada) porque não posso contrair Covid-19, gripe, nada. Minha situação já é delicada e ficar no meio de tanta gente tossindo e espirrando não pode me fazer bem.” Ela acrescenta que, caso a vaga não fosse liberada nesta terça-feira, precisaria passar a noite na área externa da UPA. “Eu não me sinto segura entrando lá dentro. O quarto é pequeno, tem gente com Covid-19 lá.”Ela ainda diz que tentou o encaminhamento no último dia 31, mas decidiu ir pra casa. “Quando voltei, no dia seguinte, fui pro fim da fila. Apesar de ser difícil esperar aqui, vai ser o jeito. Tenho de ficar para ver se consigo essa internação.”EsperaAssim como Renata, a consultora de financiamento Tifany de Oliveira Leite, de 23 anos, também enfrenta dificuldade para ser atendida na mesma unidade. Ela chegou à UPA no domingo sentindo dores e dificuldade para respirar. “Fui atendida e a médica pediu exames, mas como não era possível fazer por conta da hora, me pediram para voltar na segunda-feira.”Tifany voltou na segunda, entrou na fila novamente, passou o dia todo na unidade, mas conseguiu fazer um exame do pulmão e outro de sangue. Ao tentar apresentar os resultados para algum médico de plantão, foi informada que não seria possível, e que ela precisaria mostrar para a mesma médica que a havia atendido no domingo. Mas esta profissional não estava no plantão. Tifany precisou retornar nesta terça-feira para tentar falar com a médica. Novamente precisou começar o processo do zero, passar pela triagem e aguardar cerca de quatro horas para ser atendida.Ela reclama que ficou cerca de dois minutos no consultório da médica e que só fez o exame de sangue porque sugeriu que pudesse ser dengue, já que o irmão teve diagnóstico recente da doença. “Ela só pediu o exame do pulmão e mais nada. Eu só vim porque a gente não pode tomar qualquer remédio. Agora tem Covid-19, dengue, influenza H3N2, tanta coisa. A gente fica com medo.”Sobre a paciente Odete Rodrigues, a SMS informou que vai apurar o que de fato aconteceu, levando em consideração que foi feita ficha apenas em uma unidade, às 10h32, na UPA Maria Pires Perillo, localizada na Região Noroeste. Local onde recebeu atendimento e foi encaminhada conforme classificação de risco (ficha vermelha). O prontuário dela ainda está em aberto porque o atendimento não havia sido concluído até a noite desta terça-feira.SMS reconhece transtornosA SMS, em nota, informou que reconhece o transtorno enfrentado pela população que tem buscado atendimento de urgência na capital. No documento, a pasta informa que este é um momento desafiador para as equipes da saúde também. A pasta informa que este é um período de transição, com necessidade de reorganização de equipes nas unidades de saúde, inclusive com a “prorrogação dos contratos que seriam encerrados no mês de dezembro”, diz trecho da nota.Ainda no documento, a SMS destaca que as escalas médicas estão completas. “(A SMS) ressalta que não tem medido esforços para solucionar todos os problemas existentes, uma vez que é um momento complexo relacionado às doenças infectocontagiosas.” A pasta também salienta que a expectativa é de que nos próximos dias tudo volte à normalidade. “Enquanto isso, a secretaria solicita que a população busque também atendimento em uma das 76 Unidades Básicas de Saúde que estão disponíveis para esses casos mais leves e que somente os casos mais graves procurem as unidades de urgência.”A SMS informou que foram contratados 244 profissionais, mas alguns ainda estão em cumprimento dos prazos para apresentar documentação para lotação. Além disso, a SMS prorrogou contratos de 771 temporários por tempo determinado.-Imagem (Image_1.2381554)