Os administradores do pit dog Rooma Sanduicheria, no Setor Urias Magalhães, em Goiânia, afirmam que foram surpreendidos com a demolição do estabelecimento na manhã desta quarta-feira (5). O local recebeu ordem de desocupação no ano passado para dar lugar a uma praça que será administrada pelo Atlético Clube Goianiense. Desde então, porém, as atividades foram mantidas enquanto um processo de transferência para outro local corria na Prefeitura.A lanchonete foi inaugurada há cerca de 20 anos e ficava próximo ao Ginásio de Esportes Gerci Dias. Conforme afirma a Prefeitura, a remoção foi necessária para cumprir o Termo de Cooperação firmado com o Atlético por meio do Programa Adote Uma Praça, em 2020. A área fica em frente ao centro de treinamentos do clube. Segundo a gestão municipal, além do estabelecimento não estar previsto no projeto apresentado pelo Atlético, o mesmo não tinha autorização de funcionamento desde 2009.O empresário Paulo Henrique Silva, de 30 anos, um dos gerentes do pit dog, rebate a alegação da Prefeitura. Segundo Silva, o local sempre pagou as taxas de funcionamento, mas não recebia o documento formal de autorização. Em boleto descrito como “Taxa de Licença de Ocupação de Logradouros Públicos - Pit Dog”, os proprietários pagaram R$ 661,39 para a Prefeitura em fevereiro do ano passado, dois meses antes de receberem a ordem para deixarem o local.A Secretaria Municipal do Desenvolvimento e Economia Criativa (Sedec), pasta responsável por autorizar o funcionamento de estabelecimentos como pit dogs e bancas de jornais e revistas, afirma que a taxa é gerada automaticamente. Já a autorização de funcionamento, segundo a Sedec, precisa ser provocada anualmente, e que não há registro de solicitação do documento há 12 anos.O local tinha 15 funcionários trabalhando de forma direta e fazia serviço de entregas por aplicativos, o que, segundo Silva, empregava vários motociclistas de forma indireta. A demolição retirou toda a estrutura que, segundo estimativa dos proprietários, custava R$ 70 mil. Eles ainda não sabem o que será possível aproveitar.PromessasApesar da irregularidade citada como fator que amparou a demolição, a Prefeitura deu a possibilidade de que os proprietários entrassem com o pedido de transferência para outra área. Na notificação o entregue ao local pela Secretaria Municipal de Planejamento Urbano e Habitação (Seplanh), a pasta diz que os proprietários deveriam remover a estrutura “ou promover a abertura de processo de transferência”. Diante da orientação, os proprietários deram entrada, no mesmo mês, ao processo de mudança de local, ato que é confirmado pela Sedec.O presidente do sindicato dos Proprietários de Pit-Dog de Goiânia (Sindpit-dog), Ademildo Godoy, afirma que acompanhou o processo desde a notificação feita em abril. Para o representante da categoria, “faltou sabedoria, bom senso e coerência por parte da Prefeitura”. Godoy diz que a gestão municipal pediu para os proprietários indicarem um novo local, mas que as duas primeiras opções foram negadas. A terceira recebeu sinal positivo, mas ainda estava em andamento.“O que a Prefeitura disse era que ia liberar água, energia elétrica e o alvará de funcionamento. Não saiu nenhuma das autorizações. Na última reunião, em 15 de dezembro, eles falaram que iam autorizar. Eu pedi um documento por escrito e me pediram confiança, dizendo que a afirmação tinha sido feita na frente de muita gente”, lembra o presidente do Sindpit-dog.A Sedec afirma que a remoção não é condicionada à finalização do processo de transferência, já que não havia autorização de funcionamento válida para o local. “O pit dog está funcionando irregularmente e os responsáveis foram notificados em abril e em novembro pela Prefeitura de Goiânia sobre a necessidade de remoção e o início das obras no local”, afirma a Sedec em nota.ProgramaLançado na gestão anterior, o Programa Adote Uma Praça busca firmar parcerias junto a iniciativa privada para auxiliar na manutenção de áreas públicas. Para a área do pit dog, o Atlético se comprometeu a investir R$ 2 milhões para transformar o local em praça. Pelo termo, a obra deve ser concluída neste ano, questão destacada pelo presidente do clube, Adson Batista, como razão da retirada.Especialista aponta possíveis errosPara o especialista em Direito Civil e Constitucional, Clodoaldo Moreira, que é membro da Comissão de Estudos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a ação da Prefeitura pode ter extrapolado seu poder. O advogado diz que, analisando as versões da administração e dos proprietários, faltou razoabilidade, termo jurídico que se refere a bom senso, na condução da medida. “A Prefeitura deveria, neste caso, de fato dialogar. Deveria conceber a dignidade da pessoa humana, das pessoas que dependem daquela atividade. E diante desta atitude de demolir, alegando que houve descumprimento, penso eu que a própria administração pública extrapolou na sua condução”, avalia. Para Moreira, o mais razoável seria aguardar pela conclusão do processo de transferência. “Quando em abril a Prefeitura sugeriu uma permuta, abrindo a possibilidade desta família procurar outro local, ela não poderia simplesmente fechar esse canal e mandar demolir”, diz o especialista, que acrescenta: “O que a cidadania e as pessoas esperam é que todos aqueles que exercem atividade pública procurem ser razoáveis. Tirar um para colocar o outro. Da mesma forma que coloca o outro é preciso conceder ao outro as outras opções”. De acordo com o presidente do Sindpit-dog, a entidade irá entrar com ação buscando restituir os prejuízos sofridos pelos proprietários. “São liberações precárias, mas nós temos lei falando que somos patrimônio de Goiânia”, diz Godoy ao se referir a lei sancionada em junho do ano passado. Na cerimônia de sanção, o prefeito Rogério Cruz (Republicanos) elogiou os pit dogs e disse que o reconhecimento aos locais deveria ter sido dado “há muitos anos”. “Nesta decisão os pit dogs foram deixados de lado. Em nenhum momento os proprietários disseram que não iam sair de lá, só queriam outro local para poderem trabalhar. Estavam esperando a autorização e ela não veio por demora da Prefeitura”, reclama Godoy. -Imagem (Image_1.2382131)