Crescimento do número de casos, aumento da taxa de ocupação em UTIs e falta de medicamentos para entubação de pacientes graves. O cenário que assistimos atualmente é apenas o início da fase mais preocupante da Covid-19 em Goiás na avaliação de especialistas e do secretário de Estado da Saúde, Ismael Alexandrino. “Provavelmente nós já começamos a viver os 30 dias mais críticos da pandemia”, disse o gestor estadual durante live do POPULAR na tarde desta terça-feira (23).Ao falar dos 30 dias mais críticos, Alexandrino não se refere apenas ao número de casos. A principal preocupação do titular da Secretaria de Estado da Saúde (SES-GO) tem relação com a assistência hospitalar. O gestor destaca que as projeções apontam o pico da infecção entre os dias 22 e 26 de julho. “Até lá nós vamos crescer bastante o número de casos. Mas muito mais do que crescer o número, o que nos preocupa é crescer o número de internações. Que esse número não seja acima da capacidade operacional do Estado”, diz.Nesta terça-feira, o mapa de leitos disponível no site da SES mostrava uma taxa de ocupação de mais de 86% dos leitos de UTI dedicados ao tratamento da Covid nas unidades estaduais. Dos 104 leitos implantados, apenas 14 estavam liberados para receber pacientes.A maior parte dessa estrutura está no Hospital de Campanha (HCamp) de Goiânia, com 70 leitos terapia intensiva. Quando o centro de atendimento foi lançado, esta era a capacidade máxima anunciada. Os leitos foram ampliados de forma gradativa, de acordo com a demanda. No entanto, nesta terça-feira, o local contava com apenas seis vagas.Diante da crescente demanda, o secretário anunciou uma nova ampliação na unidade. “O que nós tínhamos programado inicialmente para o HCamp (de Goiânia) era de fato 70 leitos de UTI e 140 de enfermaria. No entanto ele tem rede de gases em toda a sua estrutura, então é possível que a gente avance um pouco mais. Eu conversei com o diretor de lá e pedi que a gente avance. Nós vamos ampliar mais 16 leitos de UTI”, adiantou. A previsão é que as novas vagas sejam abertas até o próximo fim de semana.No entanto, o secretário destacou alguns fatores limitantes, no momento, para este aumento de vagas. Entre os pontos citados está a dificuldade de aquisição de ventiladores mecânicos, monitores, e compra de sedativos e relaxantes musculares, equipamentos e insumos que estão em falta no mercado. Ele também citou a preocupação com a contratação de funcionários.Para suprir a necessidade de monitores, a SES analisa a possibilidade de alugar esses equipamentos. “Fizemos uma compra recente de ventiladores, mas ela não chega do exterior antes do fim do mês. Mas na medida que os equipamentos vão chegando a gente vai abrindo.”A SES já abriu quatro hospitais de campanha, e projeta mais dois para os próximos dias, em Itumbiara e São Luís de Montes Belos. Alexandrino destacou que, apesar da saturação nas unidades estaduais, alguns municípios abriram leitos de UTI. É o caso de Anápolis, Aparecida de Goiânia e Rio Verde. “Somando tudo, Estado e municípios, dá um certo alívio. No entanto, isso também é limitado. Chega um momento que pode ficar tudo cheio e a gente não ter mais capacidade”, alerta.FlexibilizaçãoÉ neste cenário de agravamento da crise que a Prefeitura de Goiânia autorizou a retomada do comércio. Para o secretário, no entanto, a flexibilização está ocorrendo no papel, porque a população, de fato, não estava cumprindo as medidas de restrição.“Está flexibilizando no papel, porque na prática isso já estava acontecendo. Basta sair para ver que está todo mundo na rua. O que Goiânia está fazendo é assumindo a realidade. É provável que tenha um impacto, mas não tem um decreto que consiga frear mais a população. Neste momento, falar só em isolamento social, por mais que saibamos que é extremamente válido, é um conceito insuficiente. É menos pior existir um protocolo extremamente rígido e a população seguir isso de forma regulamentada do que a população abrir na clandestinidade e não ter nada que atenue.” Pesquisador da UFG projeta colapso em duas semanasPara o biólogo Thiago Rangel, pesquisador do grupo de modelagem da Covid-19 da Universidade Estadual de Goiás (UFG), o Estado entrará na fase mais crítica na segunda quinzena de julho. “O que a gente está assistindo é uma piora muito rápida, que se não for estancada, esses 30 piores dias vão ser insustentáveis. A gente já havia previsto em abril que o colapso do sistema hospitalar aconteceria no fim de junho. Isso a gente vai ver nas próximas duas semanas nas grandes cidades, como Goiânia, Rio Verde e a Região do Entorno (do Distrito Federal)”, disse.Rangel destaca que em abril o grupo já tinha previsto um grande aumento no número de casos na entrada de julho. De acordo com o pesquisador, o modelo matemático desenvolvido para analisar o avanço da pandemia em Goiás prevê o pico a partir do dia 15 de julho até a primeira quinzena de agosto. Apesar dos esforços das redes estadual e municipais e ampliar o número de leitos, o cenário projetado por ele não é nada animador. “O pico que estava sendo previsto é muito superior à capacidade de assistência do Estado, ainda que ela tenha sido expandida”, diz.O modelo desenvolvido pelo grupo da UFG é ajustado periodicamente, de acordo com a inclusão de novos dados. Segundo Rangel, até o momento não há nenhum fator que indique uma mudança na projeção de abril, que aponta para a possibilidade 6 mil mortos pela Covid em Goiás. “Na segunda quinzena de julho a gente está estimando cerca de 100 óbitos por dia no Estado.”Questionado se um comportamento responsável da população diante da flexibilização das atividades, seguindo as normas de segurança, poderia atenuar a projeção, o pesquisador foi enfático: “Se todo mundo usar máscara, álcool em gel e ficar em casa, aí tudo bem. Mas não adianta usar máscara e álcool e pegar ônibus lotado, com mais de 40 pessoas por cerca de 30 minutos”.A próxima nota técnica com a atualização das projeções do grupo de modelagem deve ser divulgada até o início da próxima semana.